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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 04-03-2018 - 09:24 -   Notícia original Link para notícia
O ex-vilão da inflação

Alta de preços de serviços desacelera. Escolas, academias e salões de beleza seguram reajustes



PÉ NO FREIO



A INFLAÇÃO DE SERVIÇOS DESACELEROU AO LONGO DE 2017 E DEVE TERMINAR 2018 NO MESMO PATAMAR DO ÍNDICE GERAL





"A recuperação da nossa economia está se dando de forma lenta, e isso ajuda a segurar os preços" Elson Teles Economista





Rosângela Maria dos Santos, de 52 anos, abriu um espaço de estética e beleza no Centro do Rio há nove meses. Mesmo com 25 anos de experiência no ramo, foi chamada de "louca" pelos amigos ao decidir deixar de ser empregada para empreender com o país ainda vivendo as consequências de uma de suas piores crises econômicas. Desde então, a clientela já cresceu 60%. A façanha se deve a uma decisão: ela cobra preços abaixo da média do mercado para serviços como limpeza de pele, pedicure, manicure e depilação.









Quem poupa tem. O casal Denys Estanho e Marcela Isolani com o filho, Davi: descontos na creche e na academia ajudarão a viabilizar as férias da família





A receita está valendo para praticamente todo tipo de empresa prestadora de serviço. Vilão da inflação nos últimos anos, o setor pisou no freio dos reajustes ao longo de 2017. Este ano, deverá contribuir para a manutenção da inflação baixa. Há previsões até de o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficar abaixo do piso da meta do Banco Central (3%), como aconteceu em 2017, o que abre espaço para novas reduções da taxa básica de juros.





Economistas apontam que a inflação desse grupo vai fechar o ano no menor patamar em quase duas décadas, na casa dos 3%. A notícia é um alívio principalmente para o bolso da classe média, que gasta cerca de dois terços do orçamento com esse tipo de consumo, de acordo com o Instituto Data Popular.





Contribui para a desaceleração dos preços dos serviços ao longo de 2018, mesmo com a retomada gradual da economia, a tendência de manutenção do desemprego na casa dos dois dígitos - de acordo com os últimos dados do IBGE, está em 12,2%. Isso reduz a demanda e obriga os donos dos estabelecimentos a segurarem os preços para caber no orçamento mais apertado das famílias.





Por outro lado, a maior oferta de trabalhadores ociosos - ainda há 12,7 milhões em busca de uma vaga - ajuda os comerciantes a reduzirem custos com a força de trabalho num setor intensivo em mão de obra. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que orienta os reajustes dos salários dos trabalhadores, foi de 2,07% no ano passado - a menor variação desde o Plano Real, que é de 1994.





Outro fator favorável é a queda dos aluguéis dos estabelecimentos. O índice que corrige a maioria desses contratos, o IGP-M, terminou 2017 com deflação de 0,52%, a primeira desde 2009.





Salões de beleza, academias, cinemas e escolas particulares já usam promoções como parte da estratégia para manter ou recuperar clientes há pelo menos dois anos, quando a recessão se aprofundou. E boa parte prevê um 2018 sem aumentos.





- Os salões perderam muitos clientes porque as pessoas reclamam sempre dos preços. Anuncio muita promoção, eu mesma limpo o salão, faço o cafezinho para as clientes e subloco cabine (para manicure). O lucro é baixo, mas é a forma que encontrei para crescer - conta Rosângela, que, na sexta-feira, anunciava num site de ofertas uma sessão de pé e mão com 33% de desconto, a R$ 19,90. - Não vejo espaço para fazer reajustes este ano.





FAMÍLIAS APROVEITAM PARA ECONOMIZAR





Nesse mesmo site, uma rede de cinemas com salas no Rio ofertava ingressos a partir de R$ 7,99, um terço do preço cheio, e uma tradicional churrascaria dava 32% de desconto no rodízio de carnes, que saía a R$ 59,90 por pessoa.





Os consumidores já perceberam que é um bom momento para economizar. O comerciante Denys Estanho e a advogada Marcela Isolani ganharam desconto de 20% na mensalidade da creche do filho Davi, de 2 anos, sem fazer esforço algum. A promoção foi oferecida a todas as famílias do condomínio onde moram, próximo à escola. Para frequentar academia, eles se juntaram a uma amiga, e a matrícula tripla trouxe outro abatimento. O salão de beleza que o casal frequenta, no shopping onde têm uma loja, também está com preços menores para quem trabalha no centro de compras.





- As empresas andam mais abertas a escutar propostas. Toda essa economia que estou fazendo agora vou investir numa viagem em família no fim do ano - planeja Denys.





No ano passado, o IPCA, medido pelo IBGE, já captou esse efeito. A inflação de serviços encerrou 2017 em 4,51%, bem abaixo dos 6,5% registrados em 2016, mas ainda muito acima dos 2,95% da inflação média geral.





Em 2018, segundo previsão do Banco Itaú, a inflação de serviços deve ficar em 3,5%, a mesma variação projetada para a média geral do IPCA, o indicador oficial de inflação perseguido pelo BC. Desde 2005 o índice de serviços - que responde por cerca de um terço do IPCA - superou a taxa geral em quase todos os anos. Se o cenário se concretizar, os preços dos serviços não terão aumento real em 2018. É como se não tivessem pesado mais no orçamento.





- A inflação baixa vai reduzir o percentual dos reajustes salariais, e isso alivia os custos (do setor de serviços). Ademais, a recuperação da nossa economia está se dando de forma lenta, e isso ajuda a segurar os preços - analisa Elson Teles, economista do Itaú.





Maria Andréia Parente, economista do Ipea, também projeta inflação de serviços mais próxima do índice geral este ano:





- É muita gente desempregada topando qualquer salário para trabalhar. Isso é ainda mais forte nesse setor, historicamente bastante informal.





André Braz, economista do IBRE/FGV, é menos otimista em relação à desaceleração mais forte dos preços de serviços. Ele alerta que comer fora de casa deve continuar pesando no bolso, já que a previsão é de alta dos preços de alimentos depois de um 2017 atípico de deflação no segmento. As mensalidades de planos de saúde, que acumulam alta de mais de 45% nos últimos três anos, também não devem ceder.





Por outro lado, os reajustes menores de educação, já captados pelos índices de inflação de fevereiro confirmam a tendência de desaceleração do setor. Os números da prévia da inflação geral de fevereiro mostram que as mensalidades escolares tiveram, este ano, o menor aumento médio desde 2012: 4%.





Em dezembro, quando foi renovar a matrícula da filha Alice, de 3 anos, a funcionária pública Roberta Azevedo, de 34 anos, se assustou com uma mensalidade acima do que pagava. Resolveu negociar:





- O colégio aceitou minha proposta, de ter mais cinco dias para pagar com 15% de desconto, e ainda ofereceu mais 5% de abatimento. A clínica estética onde faço tratamento também passou a oferecer preços melhores toda sexta-feira. Aproveito tudo.





A inflação dos cursos de idiomas caiu à metade em três anos. Em fevereiro, as mensalidades subiram 4,94%, bem menos do que os 10,9% do mesmo mês de 2015.





- Perdemos alunos no início da crise, então mantivemos os preços estáveis, fizemos promoções e duplicamos a carga horária de aulas investindo numa plataforma de ensino a distância. Tivemos de reaprender a ganhar eficiência - conta Eduardo Murin, diretor comercial da rede de cursos de inglês CNA que atingiu seu recorde de 500 mil alunos no fim do ano passado.





(*) Estagiária, sob supervisão de Daiane Costa Com crise, famílias deixam creche e voltam a contratar domésticas, na página 30



Com crise, famílias deixam creche e voltam a contratar domésticas



ALTERNATIVA INFORMAL



ENTRE 2016 E 2017, O NÚMERO DE EMPREGADOS DOMÉSTICOS VOLTOU A CRESCER NA INFORMALIDADE







Aumento de profissionais à procura de emprego reduz salários



Uma creche de Botafogo, na Zona Sul do Rio, exemplifica as dificuldades vividas pelas escolas particulares nos anos de recuo da atividade econômica: o número de alunos hoje é 30% inferior ao do período pré-crise. A perda de alunos, principalmente por estabelecimentos de educação infantil, está diretamente ligada a outro fenômeno da recessão: o aumento do número de trabalhadores domésticos à procura de emprego. Como consequência, os salários caíram e esse grupo se tornou alternativa mais barata à creche. De acordo com o dado mais recente do IBGE, do último trimestre do ano passado, o rendimento médio real do trabalhador doméstico estava em R$ 852, o mesmo valor do período pré-crise.



- Caiu o número de empregadores, enquanto o de mulheres se oferecendo para o trabalho cresceu muito. Muitas sem experiência alguma. São exoperadoras de caixa, ex-repositoras, ex-trocadoras de ônibus. Antes, eu não empregava nenhuma por menos de um salário de R$ 1.500. Hoje, se uma família oferece R$ 1 mil, eu encaminho - conta Marco Aurélio Carvalho Di Calafiori, dono de uma agência de empregos especializada nessa mão de obra no Rio há mais de 30 anos.



Ele conta que nunca teve tantas mulheres em seu banco de profissionais: mil inscritas.



MAIORIA NA INFORMALIDADE



Enquanto o salário mínimo do empregado doméstico no Rio é de R$ 1.136,53, a mensalidade de uma creche na Zona Sul pode chegar a R$ 3 mil. Para reverter o quadro de perda de alunos, a creche de Botafogo reajustou as mensalidades em apenas 4%, frente aos 11% de 2017.



Segundo o IBGE, no fim do ano passado havia 6,4 milhões de pessoas empregadas como domésticas, babás ou diaristas - 4,5 milhões na informalidade. Em relação ao fim de 2013, quando esse contingente atingiu seu mínimo histórico (5,97 milhões), a alta é de 7% ou mais 430 mil pessoas. Nesse mesmo período, o total de pessoas ocupadas em todas as funções ficou praticamente estável ( 0,2%).



A moradora de Japeri Maria Clara Silva, de 51 anos, está desde janeiro buscando trabalho como doméstica. Experiência não falta, mas ela nunca teve a carteira assinada nessa função e, atualmente, isso é um empecilho. Não exerce desde 2013, quando perdeu o emprego porque a família para a qual trabalhava se mudou para outro estado. À época, com o mercado de trabalho aquecido, preferiu empregos com carteira. Foi recepcionista, operadora de caixa e, mais recentemente, auxiliar de serviços gerais em um hospital. Saiu do emprego no ano passado, porque não conseguia mais conciliar com o curso técnico de Enfermagem que havia iniciado em 2011. Levou seis anos para fazer a capacitação que tinha duração de dois.



- Está muito difícil conseguir emprego. Pelo que minhas colegas comentaram, agora domésticas têm de fazer tudo: lavar, passar, cozinhar e até cuidar das crianças, e os salários não crescem - disse Maria Clara, enquanto aguardava uma agência abrir na manhã na última sexta-feira.


Palavras Chave Encontradas: Criança
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