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O Globo Online (RJ) ( Especial ) - RJ - Brasil - 15-03-2019 - 10:58 -   Notícia original Link para notícia
Quando o banco sabe mais da sua vida do que você

Aposentados são avisados da liberação do benefício por instituições financeiras, que oferecem crédito insistentemente; prática é ilegal


"Há pessoas que se aposentam por invalidez, e informações sobre seu estado de saúde podem ser usadas por empresas de outros _ segmentos" Vitor Hugo do Amaral Ferreira, diretor do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor
"É comum que essas ligações aconteçam antes de o segurado ser informado da concessão da aposentadoria _ pelo INSS" Patrícia Cardoso, coordenadora da Defensoria Pública do Rio


Desde que se aposentou, há pouco mais de dois meses, o analista de sistemas Teófilo Benedicto Ottoni, de 58 anos, é perturbado quase que diariamente, em diferentes horários, por ligações com oferta de crédito consignado. Ele deu entrada no pedido de benefício em novembro e passou a acompanhar o andamento do processo no site do INSS. As ligações começaram no dia em que o sistema informou que havia conseguido a aposentadoria.


ADRIANA LORETEPerturbação constante. Teófilo Ottoni, de 58 anos, já recebeu mais de cem ligações: "Alguns pedem para eu depositar, antecipadamente, 5% do valor do empréstimo para pagar a taxa de cartório. Só pode ser golpe"


Queixas como a de Ottoni são recorrentes e mostram como, muitas vezes, uma informação pessoal circula sem o conhecimento prévio do usuário. Especialistas em defesa do consumidor alertam que ofertas feitas em nome de instituições financeiras em que o segurado não tem cadastro são consideradas quebra de sigilo bancário.


- Alguns pedem para eu depositar, antecipadamente, 5% do valor do empréstimo para pagar a taxa de cartório. Só pode ser golpe. Já recebi mais de cem ligações. Alguém forneceu meus dados, porque eles sabem até o valor do meu benefício. Sou aposentado por invalidez, tomo 18 remédios por dia - reclama Ottoni.


DUAS MIL QUEIXAS


Só no ano passado o INSS recebeu perto de duas mil queixas sobre suposto repasse de informações sigilosas a instituições financeiras. Os estados do Rio de Janeiro e São Paulo concentram 40% das reclamações.


Mas, para especialistas, o númerodecasosémuitomaior.


Por falta de informação sobre a ilegalidade dessa abordagem, muitas pessoas não registram queixa, explica Patrícia Cardoso, coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), da Defensoria Pública do Rio.


-É comum que essas ligações aconteçam antes de o segurado ser informado da concessão da aposentadoria pelo INSS. E alguns aposentados acabam achando até simpático o aviso. As pessoas não enxergam a ilegalidade na prática. Por isso, a solução para esse problema tem que ser sistêmica, com a atuação do Banco Central (BC), como órgão regulador, INSS e entidades de defesa do consumidor. Hoje, boa parte dos superendividados que atendemos são aposentados e pensionistas-ressalta Patrícia.


ORIENTAÇÃO É DENUNCIAR


O INSS não soube explicar como bancos e correspondentes bancários têm acesso a esses dados. Em nota, apenas reiterou que as informações são sigilosas, que seus servidores não estão autorizados a fornecê-las a instituições financeiras e que têm políticas para garantir a segurança desses dados. Para tentar amenizar o incômodo aos segurados, o instituto publicou uma instrução normativa, que entra em vigor dia 31 deste mês, na qual


determina que ofertas de consignado só podem ser feitas a aposentados e pensionistas seis meses após a concessão do benefício.


A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), também garantiu que seus federados têm políticas rígidas para garantir o sigilo das informações dos clientes, mas não explicou como acessam as informações do INSS.


Vitor Hugo do Amaral Ferreira, diretor do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), considera "gravíssima" essa violação de dados e acrescenta:


- Há pessoas que se aposentam por invalidez, e informações sobre seu estado de saúde podem ser usadas por empresas de outros segmentos para ofertarem produtos e serviços.


Os especialistas orientam os consumidores a denunciar essas práticas ao INSS, ao banco citado na ligação, ao Banco Central, que regula a atividade bancária, ao Ministério Público e aos Procons.


Procurado pelo GLOBO, o Banco Central não quis comentar sobre a suposta quebra de sigilo. A autoridade monetária afirma que não detém "informações sobre o processo de concessão de aposentadorias que possibilitem responder a essa questão".


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