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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 13-01-2019 - 11:15 -   Notícia original Link para notícia
Exportadores de produtos halal vivem suspense


Frigoríficos que produzem carne de acordo com preceitos muçulmanos temem retaliação de países árabes à proposta de mudar embaixada brasileira para Jerusalém. Medida pode afetar vendas de US$ 4,5 bi e 150 mil empregos em pequenas cidades


Apossibilidade de o presidente Jair Bolsonaro transferira embaixada do Br asilem Israel de Tel Aviv para Jerusalém, seguindo os passos do presidente americano Donald Trump, ameaça o acesso de exportadores brasileiros a um mercado de 1,8 bilhão de consumidores no mundo: o de carne halal, produzida de acordo com preceitos da religião muçulmana. Essa decisão preocupa frigoríficos dedicados a esse tipo de produção porque tem potencial para criar um imbróglio diplomático com países árabes com reflexos negativos no fluxo comercial com essas nações e também com consumidores muçulmanos em outros países. O setor teme retaliações comerciais ao Brasil. A proposta de mudança da embaixada é controversa pois viola resoluções da ONU, segundo as quais o destino de Jerusalém deve ser decidido em negociações entre Israel e palestinos. -O Brasil é o maior exportador dom undo de carne halal. A decisão demudara embaixada amplia o grau de incerteza para que as empresas brasileiras realizem investimentos voltados à expansão da produção desses produtos -diz o presidente da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Rubens Hannun. No início do ano, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que veio ao Brasil para aposse do novo governo, disse que Bolsonaro indicou a ele que a mudança da embaixada brasileira era uma questão de "quando, não de se". Em novembro, quando o presidente aventou a ideia, ainda antes da posse, o governo do Egito cancelou uma visita oficial que o então ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, faria ao país e vinte empresários brasileiros que já tinham viajado tiveram que retornar. Para os muçulmanos, a denominação halal significa um produto "lícito" para consumo segundo o Alcorão, produzido sem contaminação, vestígios de álcool ou de carne de porco. Nocas od acarne, atécnica h alal de abate prevê que alinha de produção esteja voltada para Meca e o boi ou frango deve ser abatido por um muçulmano com um só golpe, cortando esôfago, traqueia, artérias carótidas e veias jugulares para que não haja sofrimento. Todo o sangue deve ser retirado para que não haja contaminação. No momento de cada abate, o nome de Deus é invocado por meio da frase "Bismillah Allahu Akbar" (Em nome de Deus, Deus é maior). No caso de produtos industrializados, são utilizadas técnicas para verificar senão há vestígios de álcool ou porco em clarificantes, glicerinas ou outros componentes usados na fabricação. O trabalho é certificado.


DIVULGAÇÃO/FAMBRASProdução controlada. Supervisor responsável por certificação halal inspeciona abate de frango em frigorífico brasileiro: país é o maior exportador do mundo


EXPORTAÇÕES DE US$ 4,5 BI


A preocupação com retaliações às exportações brasileiras é grande porque apenas na cadeia de produtos halal estão envolvidos pelo menos 150 mil postos de trabalho, entre diretos e indiretos, de acordo com estimativa da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (Fambras). A maior parte dosem pregos está nos frigoríficos, já que acarne bovina e de frangos representa 97% das vendas de produtos brasileiros hala lao exterior. Em 2017, essas exportações renderam US $4,5 bilhões ao país, número que deve fechar 2018 comum crescimento de 10%. O prefeito da cidade de Carlos Chagas, em Minas Gerais, Acácio Vieira, disse ao GLOBO que, no ano passado, o frigorífico que produz carne halal detinha a expectativa de demitir 200 dos 400 funcionários. Isso não aconteceu porque, no segundo semestre do ano, compradores do Irã fecharam contrato para a exportação de 500 toneladas de carne bovina halal. -Este ano, os iranianos ainda não renovaram o contrato. Não sabemos se estão aguardando uma decisão do governo brasileiro sobre a embaixada em Israel. Por uma decisão federal, são cidades como a nossa que vão sair perdendo -afirmou o prefeito. Outras peque nascida des ligadas à atividade estão apreensivas. Em Palotina, no Oeste do Paraná, a cooperativa C. Valetem uma unidade h alal de abate de frangos que gera 5,2 mil empregos. Por mês, são exportados 3,1 mil toneladas dali, com faturamento de US$ 3,4 milhões. No frigorífico Plena, há produção ha lalem três unidades: Paraíso do Tocantins (TO); Porangatu (GO) e Contagem( MG ). Desde 2014, a empresa passou a exportar para o Norte da África e chegou a países como Líbia e Egito, além de Arábia Saudita, Emirados Árabes e Jordânia. Para o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal, Francisco Turra, um abalo nessas exportações tem impacto direto na economia dessas cidades. Ele tenta sensibilizar o governo: -Estamos apreensivos e já levamos nossa preocupação em relação aos problemas que podemos ter com o mundo islâmico à ministra da Agricultura, Tereza Cristina. O Brasil tornou-se o principal fornecedor de carne halal do mundo por sua vocação natural para a pecuária. O primeiro lote embarcado foi de 650 toneladas em 1980 para a Arábia Saudita, lembra o vice-presidente da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil, Ali Hussein El Zoghbi. Agora, começa a abrir uma nova fronteira com outros tipos de produtos halal industrializados, como açúcar, café e cosméticos. -Até chegarmos onde estamos foi preciso muita diplomacia, com empresários, governo e comerciantes criando uma verdadeira força-tarefa. Outros países como Turquia, França e Polônia estão atentos e podem ganhar esse mercado -diz Zoghbi, lembrando que 28 países com população muçulmana, não apenas os do Oriente Médio, compram produtos brasileiros.


Só com as nações árabes, o total de exportações brasileiras passou de US$ 9,8 bilhões para US$ 13,6 bilhões em 2017, um crescimento de 39%. Um embargo impediria o país de vender, além de produtos do agronegócio, outros de maior valor agregado, como fármacos, cosméticos, autopeças,produtos da construção civil e até aeronaves.


Mercado em expansão muito além da carne


De açaí e pão de queijo a cosméticos, Brasil tem pelo menos 135 empresas aptas a produzir e exportar


Omercado halal, de produtos que respeitam as regras muçulmanas, movimenta atualmente US$ 2,006 trilhões no mundo e deve superar os US$ 3 trilhões em 2022. O consumo medido em dólares da população muçulmana, de 1,8 bilhão de pessoas, só fica atrás dos mercados americano e chinês. Países como Malásia e Indonésia são hoje centros de excelência para produtos halal, mas o Brasil tem um enorme potencial de crescimento para exportar esses produtos, afirma Ali Hussein El Zoghbi, vicepresidente da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (Fambras), entidade que certifica empresas para a produção halal.


- O mercado muçulmano é muito fiel. Por exemplo, durante as investigações da operação Carne Fraca, que apontou problemas em alguns frigoríficos brasileiros, os muçulmanos pediram informações, fizeram ressalvas, mas não paralisaram as compras - explica El Zoghbi.


CONCEITO ÉTICO E MORAL


O Brasil é o maior exportador de carne halal do mundo, e empresas como JBS, BRF, Marfrig e Minerva possuem unidades produtoras certificadas. Mas esse mercado não está restrito apenas a bovinos e aves. Há pelo menos 135 empresas certificadas para produzir produtos halal industrializados no país. Oito indústrias brasileiras já exportam açaí halal para Ásia e Estados Unidos; açúcar orgânico para Japão, Coreia do Sul e Estados Unidos e até pão de queijo halal.


- Há cosméticos e fármacos halal, e cada vez mais empresas brasileiras nos procuram para certificar suas fábricas e iniciar a exportação para países muçulmanos. O mercado hahal é um dos segmentos de mercado mais lucrativos do mundo -diz Dib Ahmad El Tarrass, gestor da divisão halal da Fambras.


Para os muçulmanos, o halal significa um produto "lícito" para consumo, segundo o Alcorão, produzido sem contaminação, vestígios de álcool ou da carne de porco. - Halal é a base de um conceito ético e moral de ações lícitas, na alimentação, na Justiça, na conduta social, nas vestimentas. Halal significa lícito, permitido e ordenado por Deus - comenta El Zoghbi. É semelhante ao que acontece com os alimentos no judaísmo, em que a preparação kosher também trata os alimentos conforme os preceitos religiosos. Kosher quer dizer "adequado" em hebraico. O abate do animal também deve ser feito por um praticante do judaísmo, sem sofrimento, e todo o sangue deve ser extraído. Assim como na religião muçulmana, no judaísmo é proibido o consumo de porco. Assim, comer um alimento que seja halal ou kosher significa seguir os mandamentos religiosos conforme são ensinados, já que as formas de abate e preparação seguem as leis dessas religiões. (João Sorima Neto)


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