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O Globo Online (RJ) ( Mundo ) - RJ - Brasil - 09-12-2018 - 09:31 -   Notícia original Link para notícia
Unasul em crise espera que Brasil decida se sai ou fica

"Não faz sentido a Unasul continuar sem o Brasil. Ela já está em estágio terminal" Guilherme Casarões, professor da FGV
"Não faz sentido jogar fora a com a água do banho" Antonio Ramalho, secretário-geral da Esude



Sem secretário-geral e com metade dos fundadores afastados, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) agoniza em penúria e dissenso político. A crise econômica, a polarização ideológica e a crise na Venezuela puseram em xeque, após uma década, o único fórum exclusivo da América do Sul. Principal fiador da integração do continente, o Brasil parou de custear a organização em 2016 e hoje deve US$ 12,7 milhões. O futuro governo Jair Bolsonaro não trata o bloco como prioridade, mas avalia se vai reformá-lo ou deixá-lo de vez. Interessa à equipe de transição o investimento na infraestrutura regional, que considera estratégico. Na avaliação do novo governo, a Unasul nasceu relevante, para articular respostas a problemas da região, mas se perdeu por vinculação à esquerda. Em junho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSLSP) classificou a organização como "nome fantasia do Foro de São Paulo". Criada por impulso do Brasil e sob a liderança dos então presidentes Lula, Néstor Kirchner e Hugo Chávez, a Unasul entrou em choque com a eleição de governos conservadores na região. Na Colômbia, Iván Duque anunciou a saída "irreversível" do país em agosto. Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Peru e Paraguai haviam decidido, em abril, suspender sua participação. Esses seis membros são responsáveis por oito em cada dez dólares do orçamento do bloco. A polarização política está na base do conflito. Na superfície, o problema é a nomeação do secretário-geral, inviabilizada pela falta de consenso há quase dois anos. As áreas técnicas continuaram em operação. Desde abril, não houve reunião oficial. Em novembro, a Bolívia convocou um encontro informal, em Montevidéu, no primeiro passo para discutir a paralisia. Colômbia e Guiana não foram. O bloco aguarda um relatório boliviano para avaliar os próximos passos.



DIVULGAÇÃO/5-12-2014Passado. Estátua do argentino Néstor Kirchner é inaugurada na sede da Unasul no Equador, em 2014, diante dos presidentes da região: articulação política ficou para trás



DÉBITO DESDE 2016



A Unasul foi criada em 2008, mas teve suas bases amadurecidas em quatro décadas. Começou com a criação do Mercosul (1991) e sua ligação com a Comunidade Andina (2004). Em 1999, o governo Fernando Henrique foi anfitrião da primeira reunião de cúpula sul-americana. No ano seguinte, para promover a integração física da região, foi aprovada a iniciativa IIRSA (Infraestrutura Regional SulAmericana), depois incorporada à Unasul. O bloco ganhou fôlego ao mediar a crise entre o presidente boliviano, Evo Morales, e os governadores da oposição; e o embate decorrente do bombardeio colombiano a uma base das Farc em solo equatoriano.



Na visão do professor de Relações Internacionais da FGV Guilherme Casarões, a Unasul entrou em crise por não entregar a proposta original:



- O propósito da Unasul está muito ligado a um protagonismo regional do Brasil. Do governo Dilma Rousseff para cá, o bloco perdeu grande parte da funcionalidade. A partir de 2014, o Brasil parou de pagar ou adiou pagamentos a várias organizações internacionais. Dilma criou uma instância para decidir de que organismos o Brasil continuaria parte. A Unasul acabou se mostrando prioridade menor. Com as maiores economia e população da América do Sul, o Brasil é responsável por 39% do orçamento, ou US$ 3,8 milhões anuais, e não pagou 2016, 2017 e 2018. Primeiro, pela crise econômica: segundo a Reuters, em junho de 2016 a dívida brasileira com organismos multilaterais superava R$ 3 bilhões. Depois, pela suspensão da participação. Com orçamento de US$ 9,78 milhões, a Unasul só havia recebido até julho US$ 222 mil, diz relatório obtido pelo site "4Pelagatos". Só Bolívia, Guiana e Suriname haviam contribuído.



No Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (Isags), órgão da Unasul criado em 2011 e sediado no Rio para capacitação e produção de conhecimento, o trabalho dos especialistas não foi interrompido, mas quatro eventos foram adiados e dois dos 15 funcionários tiveram contratos rescindidos.



"ESTÁGIO TERMINAL"



A Escola Sul-Americana de Defesa, sediada em Quito, perdeu um funcionário. Seu secretário-geral, o brasileiro Antonio Ramalho, toca os projetos de cursos e intercâmbio entre técnicos das pastas de Defesa. Em setembro, venceram contratos dos dois diretores que restavam; eram cinco. Na infraestrutura, segundo Casarões, a Unasul sofreu o baque da Operação Lava-Jato, que apontou corrupção de empreiteiras no continente. Para ele, o desinvestimento do Brasil enfraqueceu a integração física, assim como a deterioração da crise na Venezuela desacreditou a coordenação na Defesa. - A Unasul se tornou incapaz de lidar com o maior problema geopolítico da região. É natural que se esvazie politicamente. Acaba em certo descrédito - diz Casarões, para quem o bloco ficou "desfigurado" sem um secretário-geral que desse as diretrizes de estratégia e inovação. Apesar dos conflitos com a Unasul, inclusive quando o então secretário-geral, o colombiano Ernesto Samper, criticou o impeachment de Dilma, o governo Temer não cogitou deixar a organização. Agora, se o governo Bolsonaro decidir sair, provavelmente só restarão do bloco suas estruturas físicas, como a sede em Mitad del Mundo, perto de Quito, que complementa a renda com o aluguel de espaços para eventos, e o Parlamento em Cochabamba, na Bolívia, inaugurado neste ano e vazio de representantes.



- A Unasul foi criada no contexto das esquerdas no poder. A integração regional, como na Europa, não é necessariamente um processo de esquerda. Mas a organização reflete o momento histórico - avalia Casarões. -Não faz sentido a Unasul continuar sem o Brasil. Ela já está em estágio terminal. A grande questão é que o Brasil, e isso não tem a ver com o governo Bolsonaro, nos últimos cinco anos perdeu capacidade de liderança regional. Talvez a integração econômica tenha espaço, mas política, não. Ramalho defende que a associação da Unasul a um viés esquerdista não corresponde à realidade:





- É compreensível em disputas eleitorais, mas a constituição da Unasul foi um processo de Estado. Há problemas que transbordam fronteiras, precisamos de arranjo para resolvê-los. Se não for a Unasul, vai ser outro, mas já se investiu em dinâmica e estrutura. Não faz sentido jogar fora a com a água do banho -ponderou o chefe da Esude.


Palavras Chave Encontradas: Criança
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