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O Globo Online (RJ) ( Rio ) - RJ - Brasil - 02-11-2018 - 14:32 -   Notícia original Link para notícia
CPMF pode ser recriada para financiar Previdência

"Estou propondo a total desoneração da folha. O principal motivo da reforma tributária é causar um choque de emprego"



_ Marcos Cintra, responsável pela área tributária no grupo coordenado por Paulo Guedes



A equipe econômica do presidente eleito quer criar um imposto sobre movimentação financeira para custear a Previdência, substituindo a contribuição sobre a folha salarial paga pelos empregadores, informa MARCELLO CORRÊA.



Segundo Marcos Cintra, responsável pela área tributária na equipe de Paulo Guedes, a alíquota seria de 0,4% a 0,45% em cada operação. O ministro da Defesa, general Luna, disse que as Forças Armadas terão uma proposta de reforma que ampliará o tempo de contribuição dos militares. A equipe econômica do presidente eleito, Jair Bolsonaro, quer criar um imposto sobre movimentações financeiras para acabar coma contribuição ao INSS que as empresas recolhem sobre os salários dos funcionários. O tributo incidiria sobre todas as operações, como saques e transações bancárias, e a estimativa é que seria possível arrecadar, ao menos, R$ 275 bilhões por ano. O modelo é semelhante ao da extinta CPMF, mas o time refuta a comparação, afirmando que se trata de uma substituição, e não da criação de um novo imposto.





GABRIEL DE PAIVA



Efeitos. Proposta da equipe econômica de Guedes quer acabar com contribuição ao INSS que as empresas recolhem sobre os salários dos funcionários. Expectativa é que mudança ajude a criar empregos



A informação foi confirmada pelo economista Marcos Cintra, responsável pela área tributária no grupo coordenado por Paulo Guedes, indicado para ministro da Economia. A ideia de tributar movimentações financeiras foi revelada pelo jornal "Folha de S. Paulo" a indano primeiro turno e causou um acrise na campanha de Bolsonaro, devido à impopularidade do "imposto do cheque". Na ocasião, o então candidato negou a criação de impostos. Depois do episódio, Guedes cancelou encontros, e a campanha não tocou mais noas sunto .É a primeira vez desde as eleições que um integrante da equipe confirma que a ideia está na mesa e detalha suas condições.



IMPACTO PARA INFORMAIS



Na primeira versão do plano, apresentada em setembro, a ideia era criar um imposto único sobre movimentações financeiras, que substituiria vários tributos federais, como IPI, PIS e Cofins. Agora, a estratégia é implantara ideia aos poucos, substituindo, num primeiro momento, apenas a contribuição previdenciária patronal.



Segundo Cintra, a alíquota do novo tributo seria de 0,4% a 0,45%, em cada operação. Ou seja, numa transferência bancária, as duas partes seriam descontadas. Por exemplo, ao transferir dinheiro para outra pessoa, há um desconto de 0,4% a 0,45%. Quando o dinheiro entra na conta do favorecido, há um novo desconto na mesma alíquota. Na prática, a alíquota total da transação, portanto, ficaria entre 0,8% e 0,9%.



Em contrapartida, as empresas deixariam de recolher os 20% sobre afolha de pagamento. Nos cálculos do economista, esse sistema faria frente à arrecadação da contribuição sobre folha, que ficou em cerca de R$ 275 bilhões, segundo o mais recente Balanço Geralda União, de 2017.



O objetivo do economista, que defende esse modelo há 30 anos, é que a mudança gere mais empregos. Cintra afirma que a tributação sobre folha de pagamento impede a formalização no país - hoje, pouco mais de 30% dos empregados têm carteira assinada.



-A tributação sobre afolha é uma das mais injustas e regressivas (ao aumentar a desigualdade) que se pode imaginar. Estou propondo a total desoneração da folha. No momento em que se propõe isso, estimula-se o emprego. O principal motivo da reforma tributária é causar um choque de emprego -afirma Cintra.



O novo tributo substituiria apenas a contribuição patronal. O desconto no contracheque do empregado seria mantido. Hoje, trabalhadores recolhem 8%, 9% ou 11%, de acordo com a faixa salarial.



Para compensar a perda dos trabalhadores com o novo imposto seria criado um sistema de reembolso. Assim, as empresas pagariam, junto com o salário, um adicional calculado sobre a renda bruto, a partir da alíquota do novo imposto. Por exemplo, um empregado que recebe R$ 3 mil teria um pagamento adicional de R$ 27, equivalente a 0,9% do salário, considerando que seja essa a alíquota definida.



Trabalhadores informais não teriam essa compensação, já que não contribuem para a Previdência. Esses trabalhadores, no entanto, continuariam a recolher o imposto, caso façam uma movimentação financeira.



-Quem está na informalidade não teria essa proteção legal. Masa ideia é que mais pessoas estejam no mercado formal -afirma.



Segundo Cintra, além de incentivara contratação formal, a ideia do grupo também é garantir uma fonte mais segura de arrecadação para o atual sistema de Previdência. Ele explica que a medida não resolve o problema do déficit no sistema de aposentadorias, mas permite que ele seja financiado por uma fonte menos instável, que não é afetada, por exemplo, pela queda do número de trabalhadores formais.



A proposta é o principal ponto em que o desenho de reforma tributárias e relaciona com os planos para a reformada Previdência, considerada apauta econômica mais urgente, pelo efeito que tem nas contas públicas. Em agosto, em entrevista ao GLOBO, Paulo Guedes chegou a afirmar que uma das formas de ajudara lidar como déficit bilionário do regime seria aumentara base de incidência de contribuição, sem especificar como isso seri afeito.



Uma das propostas de reformada Previdência à disposição da e quipede Bolsonaro é a elaborada por um grupo de especialistas coordenado pelo ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga e o economista Paulo Tafner. O plano foi detalhado ontem e prevê que a seguridade social pode ter novas fontes de financiamento.



QUESTÃO DE QUÓRUM



Segundo Marcos Cintra, ainda não há uma definição sobre se esse plano será posto em prática nesses moldes exatamente. Ele destaca, no entanto, que a medida poderia ser tomada já no primeiro momento do governo, que assume em janeiro.



Ele acredita que, para passar a CPMF previdenciária, seria necessária apenas uma lei complementar. Hoje, é uma lei complementar (a lei 8.212) que prevê a contribuição previdenciária sobre folha. O economista argumenta que a Constituição Federal já prevê, no artigo 195, que a seguridade social será financiada por "toda a sociedade", o que abriria espaço para que a medida fosse à frente sem necessidade de uma emenda constitucional. Os detalhes jurídicos, no entanto, ainda não estão completamente definidos.



O quórum para aprovar uma lei complementar é de maioria absoluta nas duas casas do Congresso, ou seja, 257 deputados e 41 senadores. A votação em dois turnos é necessária apenas na Câmara. Para passar uma emenda constitucional, são necessários 308 votos de deputados e 49 de senadores, com dois turnos em cada Casa.



Procurado para comentar os planos detalhados por Cintra, Paulo Guedes não retornou as ligações e mensagens. Quando a ideia surgiu na campanha pela primeira vez, o economista reforçou o discurso de Cintra de que o tributo não tem paralelo com a CPMF. Ele não negou, no entanto, que a proposta estivesse em estudo.



A reforma tributária seria o primeiro passo de um pacote mais amplo. Em uma proposta que chegou a ser divulgada no primeiro turno das eleições, a ideia seria criar um tributo que chegaria a uma alíquota de 2,6% para substituir vários tributos federais de uma só vez. Esse modelo disputa com a proposta de criar um imposto sobre valor agregado (IVA), defendido pelo economista Bernard Appy, que reuniria em um único tributo cinco impostos.



Em outra frente, a reforma tributária de Bolsonaro prevê a criação de uma alíquota única para o Imposto de Renda, de 15% a 20%.



Nos anos 90, contribuição similar era destinada à Saúde



Cobrança sobre transações financeiras teve alíquota máxima de 0,38% e acabou sendo usada para custear outros gastos



Não é a primeira vez que o brasileiro pode pagar um imposto sobre transações financeiras com destino definido para a arrecadação. Na década de 1990, o objetivo era gerar recursos para a saúde, mesmo assim, a alíquota era bem menor do que a prevista agora para a CPMF previdenciária.



Em 1993, o governo Itamar Franco criou o Imposto Provisório Sobre Movimentação Financeira, que vigorou até o fim de 1994. Em 1996, já no governo Fernando Henrique Cardoso, o tributo foi recriado como Contribuição Provisória Sobre Movimentações Financeiras (CPMF). A cobrança não poderia durar mais de dois anos, e a arrecadação deveria ser destinada exclusivamente à Saúde. A cobrança começou a incidir em janeiro de 1997, e, originalmente, a alíquota era de 0,2% sobre todas as movimentações, exceto pagamentos de salários e aposentadorias, seguro-desemprego e transações da Bolsa de Valores.



No entanto, a partir de 1999, várias emendas constitucionais foram aprovadas pelo Congresso, prorrogando a vigência da CPMF até 2007, sendo que a alíquota passou para 0,38%. Progressivamente, sua arrecadação passou a ser usada pelo governo para financiar outros gastos, como Previdência Social, e até para superávit primário.



O Ministério da Fazenda defendia o tributo como fundamental para o equilíbrio das contas públicas e, principalmente, como ferramenta para auxiliar no combate à sonegação, a partir do cruzamento dos dados da CPMF coma declaração de Imposto de Renda.



No entanto, em dezembro de 2007, pelo placar de 45 a 34, o Senado acabou coma CPMF, impondo ao então presidente Lula uma das maiores derrotas de seu governo no Congresso. A cobrança foi extinta a partir de janeiro de 2008. À época, o governo sustentou que perderia, apenas no ano, mais R$ 40 bilhões da arrecadação federal.





Luna: militar terá plano de reforma da Previdência



Ministro da Defesa afirma que Forças Armadas vão apresentar proposta própria de mudanças na aposentadoria para o próximo governo. Ideia é ampliar o tempo de permanência na ativa de 30 para 35 anos



O ministro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna, afirmou que as Forças Armadas terão uma proposta de reforma da Previdência para oferecer ao próximo governo. A ideia é ampliar o prazo de permanência dos militares na ativa. O limite, que hoje é de 30 anos, seria ampliado para 35 anos. Seria uma forma de reduzir despesas sem fazer corte direto nos benefícios.





DANIEL MARENCO



Economia. O general Luna diz que o projeto é uma forma de reduzir despesas sem fazer corte direto nos benefícios



- Sabe-se que existe a necessidade de aumentar a permanência nas Forças Armadas. Este estudo está pronto para ser discutido com o próximo governo - disse Luna, em entrevista ao GLOBO.



Já o presidente eleito, Jair Bolsonaro, defendeu mudanças no regime de aposentadorias, mas sinalizou que as Forças Armadas não devem entrar em sua proposta de reforma. O capitão da reserva afirmou que não é corporativista, masque incluir os militares poderia fazê-lo perdera capacidade de governar:



- Não sou corporativista. Só que aí você não governa, você perde as Forças Armadas. Os militares, ao longo de 35 anos de serviço, na verdade trabalham 45. É diferente. Assim como o trabalhador comum que trabalha na construção civil, que você não pode botar 65 anos porque a partir dos 60 ele não consegue carregar mais um saco de cimento -afirmou.



A ideia de prorrogar por mais cinco anos o tempo de permanência de militares em serviço circulou logo que o governo Michel Temer tentou aprova ruma reformada Previdência no Congresso. Mas acabou ficando em segundo plano, diante das dificuldades políticas em avançar coma proposta no Legislativo.



Não há, no entanto, disposição no meio militar para assimilar mudanças mais significativas, além das propostas já anunciadas. Luna lembrou que os militares já fizeram uma reforma em 2001, e, desde então, as Forças Armadas passaram por uma série de mudanças, com o objetivo de economizar recursos públicos. O país tem hoje 350 mil militares. Deste total, 58% são temporários, ou seja, não demandam despesas previdenciárias. P orisso, não seria necessário mais cortes no setor.



-Não temos direito a hora extra, adicional noturno ou adicional de periculosidade -argumenta o ministro.



Luna disse ver com naturalidade o retorno dos militares à linha de frente do poder político. Além do presidente eleito e do vice, general Hamilton Mourão, outros militares deverão ocupar postos estratégicos.



- Não há nenhum risco à nossa democracia. O povo escolheu o presidente (um militar). Imagino que os valores que as pessoas queriam manifestar estão sendo colocados para fora agora - afirmou o ministro.



Bolsonaro: proposta atual pode ser aproveitada



Equipe econômica do futuro governo acredita que 'fator Moro' pode ajudar em acordo no Congresso



O presidente eleito, Jair Bolsonaro, reconheceu ontem, em entrevista coletiva após acertara nomeação do juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça e da Segurança Pública, que é difícil os parlamentares aprovarem até o fim do anoa reformada Previdência, mas disseque"dá para aproveitar alguma coisa" da proposta que está em tramitação no Congresso.



-Ninguém quer fazer maldade com ninguém, mas algumas reformas, nós temos que, obviamente, tentar fazê-las, a da Previdência é uma. E não é a proposta inicial como o Temer quis, mas dá para aproveitar alguma coisa dela-disse .- Apoio a reforma( da Previdência) que pode ser aprovada pela Câmara. Não é a proposta que eu quero, que o Paulo Guedes quer, ou quem quer que seja quer, é aquela que pode ser aprovada pela Câmara.



Integrantes da equipe econômica de Bolsonaro avaliam que o cenário é difícil, mas ainda há chance de aprovar este ano o texto de reforma da Previdência parado no Congresso. A leitura é que é possível chegar a um entendimento. Na definição de um parlamentar, que pediu para não ser identificado, a equipe conta agora com o "fator Moro", em referência ao anúncio do juiz como futuro ministro:



- É difícil, mas esse fato novo pode mudar a cabeça das pessoas.



CHANCE MAIOR NO 1º ANO



Na avaliação de parlamentares, a estratégia mais acertada seri atentar aprovar uma única reforma, preferencialmente no começo do mandato. A avaliação é que dividir o tema em duas etapas - uma com mudanças mais leves, outra mais ampla, com regime de capitalização (no qual cada um poupa para sua própria aposentadoria) -seria menos eficaz.



- Aprovar uma reforma é uma operação de guerra, porque mexe com a vida de muita gente e mobiliza diversos grupos de interesse na Casa - afirmou o líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro. -Há risco político em fatiar a reforma. É recomendável aprovar logo uma proposta que tenha efeitos nas contas públicas e, ao mesmo tempo, viabilidade de aprovação.



O deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) também observou que a chance de aprovar uma reforma é maior no primeiro ano de governo. Ele ressaltou que, nesse caso, deve ser uma proposta que "tape o buraco" da Previdência.



O presidente do Senado, Eunício Oliveira, por sua vez, já disse, de forma reservada, que não tem interesse em incluir a matéria na pauta porque não há clima para isso. Ele destacou que os senadores não estão dispostos a aprovar a reforma para evitar desgaste para quem vai assumir em 2019:



-Muitos perderam a eleição por causa da reforma trabalhista. Você acha que eles vão querer aprovar a da Previdência e carregar mais esse ônus nas costas?



Procurado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que não tratará disso agora.





Para economistas, projeto de Arminio é mais completo



Especialistas avaliam que novo governo deveria usar início de mandato para aprovar mudança



A proposta de reforma da Previdência elaborada pelos economistas Arminio Fraga e Paulo Tafner é considerada por especialistas como mais completa do que a tentada pelo governo de Michel Temer. Por isso, se aceitar defendê-la, o presidente eleito Jair Bolsonaro deveria aproveitar o capital político do começo de mandato para tentar aprová-la.



- Um presidente recém eleito sempre tem um capital político e ele vai usá-lo. Já que vai gastá-lo, talvez seja melhor fazê-lo em prol de uma reforma mais completa do que por uma reforma que não convença os investidores plenamente - disse Gustavo Rangel, do ING Financial Markets.



A proposta prevê a fixação de uma idade mínima de 65 anos para homens e mulheres, a desvinculação do benefício previdenciário do salário mínimo e a criação de um benefício universal do idoso, equivalente a 70% do salário mínimo e que seria pago a todos que completarem 65 anos. O período de transição para cumprir a idade mínima é de 12 anos para o setor privado.



MUDANÇA NECESSÁRIA



Para Solange Srour, economista da ARX Investimentos, a proposta seria "a reforma dos sonhos", por ser mais abrangente e de longo prazo, introduzindo um regime de capitalização. Mas enfrentaria maior resistência por "mexer com privilégios de grupos específicos." Um exemplo é o dos militares, que teriam um regime próprio, sem idade mínima, mas com alíquotas de contribuição maiores.



Para Luís Eduardo Afonso, da FEA-USP, o período de transição mais curto (12 anos) do que o do texto na Câmara, de 18 anos, teria impacto fiscal mais rápido, mas poderia gerar reação maior de setores da sociedade. Ele considera positiva a intenção de desvincular o benefício do salário mínimo:



- Pode ser controverso, mas é necessário. Caso contrário, qualquer política de valorização do salário mínimo continuará tendo impacto muito maior na Previdência do que no mercado de trabalho.



Segundo o secretário de Previdência do atual governo, Marcelo Caetano, a desvinculação do salário mínimo tem risco de judicialização e pode ser derrubada na Justiça. Essa ideia chegou a ser cogitada na elaboração da reforma do presidente Michel Temer, mas foi abandonada ao ser considerada cláusula pétrea pela área jurídica da Casa Civil e, portanto, não poderia ser alterada na Constituição.



Para Caetano, o risco de enviar uma proposta mais dura é que, durante a negociação política, o texto final acabe semelhante ao texto final da reforma de Temer, aprovado na comissão especial. Ele avalia que, ao reabrir as negociações, os grupos afetados vão se mobilizar para barganhar a fim de manter seus interesses.


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