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Estado de Minas Online ( Feminino e Masculino ) - MG - Brasil - 02-09-2018 - 07:53 -   Notícia original Link para notícia
Exclusividade compartilhada

Carlos Ferreirinha analisa os movimentos do mercado de varejo ligado ao luxo e seus reflexos no comportamento das empresas


Heloisa Aline


Publicação: 02/09/2018 04:00



Carlos Ferreirinha Ao longo do tempo, vem renovando e se reinventando

Difícil encontrar uma área de negócios ligada à gestão do luxo, não só no Brasil, mas em outros países, em que o dedo de Carlos Ferreirinha não esteja presente. Há 40 anos no mercado, este carioca cidadão do mundo iniciou sua carreira na multinacional texana Eletronic Data Systems - EDS, foi presidente da Louis Vuitton no Brasil e diretor sênior da América Latina e fundou a MCF Consultoria, há 17 anos. Ao longo do tempo, vem renovando e reinventando o repertório sobre o tema-chave, trabalhando com inteligência estratégica, consultorias, treinamentos, capacitação para empresas diversificadas como bancos, cartões de crédito, shoppings centers, empresas aéreas, segmento imobiliário, ótica, marcas de carros, moda e beleza, hotelaria, entre muitas outras.




Na palestra share exclusivity - Exclusividade compartilhada", que fez em Belo Horizonte, a convite do Espaço Sou BH, Ferreirinha abordou os movimentos do mercado de varejo ligados ao luxo e como eles impactam todas as atividades como grande termômetro do consumo. O conteúdo é fruto da participação da MCF Consultoria na National Retails Federation - NFR, o maior evento de varejo do mundo, realizado anualmente em Nova York, e dos roteiros de experiências e vivências que a empresa realiza na mesma cidade por meio de imersões em operações bem-sucedidas em suas áreas de atuação, que tenham como principal elemento a inteligência da gestão do luxo. "Juntamos a inteligência dos nossos projetos, este momento Nova York e nossas observações mercadológicas e elegemos um tema que define as nossas reflexões ao longo do ano. Para 2018, ele é a Exclusividade compartilhada", explica o consultor.



Nada mais contemporâneo em um cenário mundial conturbado político-economicamente, particularmente no Brasil, que, na opinião do consultor, vive um momento macabro, no qual as empresas consolidadas precisam se reinventar para seguir em frente por meio de mudanças de paradigmas. E podem aprender muito com as experiências do mercado do luxo. Para isso, é preciso compreender o comportamento desse segmento.



"O que tem a ensinar a Mercedes Benz, líder do setor automobilístico há 125 anos? O que a torna a marca mais desejada do mundo no segmento luxo? Será que não posso me inspirar nela e tentar transformar a minha marca fazendo-a tão desejada quanto a estrela da Mercedes.?", jogando as perguntas para a plateia. O mesmo vale para a Hermés, companhia com 184 anos de existência, que continua vendendo bolsas de R$ 88 mil reais no Brasil, com fila de espera. "Há duas chances de observação diante disso: o conceito subjetivo em que se pode fazer qualquer tipo de reflexão como "quem é louco para comprar uma bolsa neste preço?"; "mesmo se tivesse dinheiro, não compraria"; ou "tenho dinheiro e não compro". Porém, na cabeça do empresário, do gestor, a reflexão tem que ser outra. As perguntas são: "Como a Hermes vende bolsas a R$ 88 mil há 184 anos? Ou como posso aprender com ela para vender picolé de forma diferente?".



No portfólio de clientes da MCF Consultoria se encontram várias empresas que não são do segmento luxo, mas que desejam mirar algumas das especificidades e experiências desse setor. É o que Ferreirinha chama de pílulas de luxo, que devem ser prescritas e administradas de acordo com o perfil e necessidade de cada uma. A Cacau Show, maior monomarca de chocolate do mundo, líder isolado do mercado varejista, com 2.200 lojas só no país, está buscando esse caminho. "Não é uma marca de luxo, nem pode ser, porque isto quebraria seu modelo de negócio. A Cacau Show é popular em sua essência. Mas como é possível trabalhar com ela em nossa consultoria? Por meio de ações que envolvam movimentação de lojas, parcerias, atendimento, chocolate assinado...". O mesmo se aplica a O Boticário, hoje incluído entre os sete maiores grupos de beleza do mundo, que tem 4.200 pontos de venda somente no Brasil. Segundo o consultor, esses são alguns exemplos de como lidar com o luxo e traduzi-lo como elemento importante da inteligência.

Contar histórias Importante também para entender esses processos é rever os conceitos e peculiaridades que envolvem o luxo. A palavra, que vem do latim lux/luz, significa que todos os produtos e serviços que dialogam com esse universo têm que ser potencializados, elevados ao máximo da iluminação. O termo remete ao raro, ao extraordinário, ao excepcional, à perfeição, códigos e estilos emocionais, histórias bem pensadas e bem criadas.



O último ponto é destacado pelo palestrante: as marcas internacionais de luxo são excepcionais contadoras de histórias, ao contrário das brasileiras, algumas há 20, 30 anos no mercado, que não sabem sequer falar de onde vieram ou para quem vendem. "Até hoje me impressiona o fato de a Hermès, com mais de 100 anos, continuar contando a história da bolsa Kelly, homenagem à princesa Grace Kelly. Ninguém pode dizer se a Jane Birkin teve mesmo relacionamento com a grife. Mas essas histórias são tão bem construídas que, no final, não importa a realidade. O importante é que as bags Kelly e Birkin continuam fazendo fila no mundo", pontua Ferreirinha.



Entre outras características observadas nas grifes de luxo, ele destaca que elas se relacionam continuamente com os clientes, exploram oportunidades contínuas, buscam alternativas o tempo inteiro, incrementam serviços e treinam roteiros de atendimento à exaustão. A geração de experiências nelas é real e, de fato, exercitada constantemente. "A palavra experiência é usada inadequadamente pela maioria das empresas e empresários. Temos que lembrar que experiência é uma ação estratégica, gerada e desenhada para emocionar os clientes", explica.



Segundo ele, a cultura empresarial brasileira não investe em treinar: espera-se por funcionários prontos, decididos e preparados, enquanto nas marcas de luxo ocorre o contrário. Eles são medidos pelo tempo de treinamento e pela forma como conduzem o que aprenderam. Com relação à comercialização, as grifes do segmento, que trabalham no Brasil, levam os seus produtos até a casa das pessoas, para que elas experimentem no seu timing e com liberdade. "A maioria das vendas não é feita nas lojas ou no e-commerce, mas nesse sistema. Essas empresas reservam mesa de restaurante no shopping para os clientes, levam pet para tomar banho, entre outros serviços, em função de uma compra que pode representar a meta do mês".



Outra particularidade citada por Ferreirinha é que na inteligência do luxo os produtos e serviços determinam os preços, que são defendidos com segurança. Não existem liquidações ou qualquer expediente que a desmereçam. Nesse contexto, aplica-se ainda o reforço nos ícones das grifes, para que eles fiquem tatuados na memória e alma do consumidor. Exemplos? Quem conhece bem o setor luxo identifica o xadrez da Burberry, o vermelho da Manolo Blahnik, a coroa da Rolex, a estrela da Mercedes Benz, o orange da Veuve Clicquot, presentes nas embalagens, frascos, tags, cores, estampas, modelagem, detalhes. Para completar, essas empresas vão além de produtos e serviços, a competitividade está na relevância contemporânea que remete ao desejo. A mensagem é "no tempo presente, me faço presente no desejo".
Para o consultor, no momento em que o Brasil enfrenta sua maior crise, refletida em cerca de 200 mil lojas fechadas nos últimos dois anos e em 20 milhões de desempregados, e diante de um consumidor apático e cauteloso, é necessário entender cada vez mais a jornada do relacionamento. As empresas precisam pensar em novas estratégias e ferramentas, e focar em despertar sensações, oferecer conteúdo e repertório - além de treinamento -, para que seus colaboradores sejam ótimos contadores de histórias, mais do que batedores de metas. "Captar clientes novos está difícil, a alternativa é investir no que se tem e no que já foi feito", garante.

Compartilhamento Impossível imaginar, até bem pouco tempo atrás, uma experiência compartilhada na Chanel, situada no patamar elevado do luxo. Mas no escritório da sede da empresa, em Nova York, paredes foram quebradas para agrupar os funcionários, criando uma área de convivência, e no centro foi colocada uma geladeira à disposição dos mesmos. A loja da American Eagle Outfitters, na mesma cidade, oferece aos estudantes uma lavanderia na qual, mediante apresentação de identificação, eles podem lavar gratuitamente suas roupas. Além disso, há um espaço com mesas, sofás, tomadas, oferta de água mineral e wi-fi, onde os clientes podem trabalhar ou passar o tempo com liberdade. Sem que ninguém pergunte se vão comprar alguma coisa.



No Chelsea Market, frequentado por clientes de nível social elevado, não se faz reserva e todo o ambiente é compartilhado. Esses foram alguns cases apresentados por Carlos Ferreirinha em sua palestra, dentro do, digamos, subtema Coworking revolution, que representam a quebra de modelo de negócios nessa área. "Entendemos que houve uma evolução do coworking, uma linha tênue dividindo o público e o privado", observa.



Na opinião do especialista, em um mundo virado de cabeça para baixo, com o advento da revolução digital - e o surgimento de uma nova cultura na área, que exige que as empresas se adequem e se equipem para lidar corretamente com essas ferramentas, conhecendo as suas linguagens e especificidades para se comunicar com precisão, é necessário outro diálogo com o consumidor. Novas referências e paradigmas, os rumos da política mundial, movimentos migratórios na Europa e movimentos em torno da diversidade quebram a dinâmica do mercado. "A marca que mais cresceu no mundo - com 85% em vendas no ano passado - foi a Gucci. Suas campanhas abordando miscigenação, inter-racialidade, cultura negra e black power, mexeram com a cabeça das pessoas, quebrando o status quo. O Brexit, por sua vez, fez com que o valor das marcas caísse em 38%".



Uma das lições que o consultor e equipe apreenderam em seus roteiros nova-iorquinos e imersões em operações ligadas à inteligência do luxo é que o think sustainable terá cada vez mais lugar no planeta, capitaneado por uma nova geração - e isto inclui pessoas de idade mais avançada - que pensa dessa forma. A revelação aconteceu na visita ao 1 Hotel, que, segundo ele, representa toda uma cultura genuína da sustentabilidade. Madeira de demolição, ferros reciclados, espelhos antigos manchados nos elevadores, bebedouros disponíveis para encher as garrafas e evitar geração de lixo, frigobar com produtos dos fornecedores locais e spa contendo produtos orgânicos, compõem o leque de ofertas do hotel, cuja diária pode chegar a US$ 1.500.



Ferreirinha lembra que, seguindo a mesma filosofia, a Gucci foi a primeira marca do setor a cancelar o uso de pelo animal nos acessórios, um segmento líder de vendas, e que a proposta, certamente, repercutirá em outras grifes. San Francisco, nos Estados Unidos, também cancelou toda a venda do mesmo produto na cidade e elevou os impostos da Coca-Cola e Pepsi-Cola. Para completar, a Inglaterra, país que produz Rolls-Royce, Bentley, Land Rover, aprovou lei no Parlamento proibindo o uso de combustível fóssil a partir de 1940. Na esteira, são identificadas outras movimentações no meio da nova geração, que não deseja mais possuir imóvel próprio - prefere ser mutante - nem carro.


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