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O Globo Online (RJ) ( Brasil ) - RJ - Brasil - 10-07-2018 - 10:03 -   Notícia original Link para notícia
PIB de 1,5%, o 'novo teto'

Greve freia ainda mais ritmo da retomada, e analistas revisam para baixo projeções para economia



Depois de as projeções para a alta do PIB no ano terem chegado perto de 3%, por conta do crescimento acima do esperado em 2017, os efeitos da greve dos caminhoneiros sobre os principais indicadores estão derrubando as expectativas de retomada da economia. Especialistas afirmam que um crescimento de 1,5% já é considerado "teto" para o PIB em 2018. A avaliação é que a queda de 10,9% da produção industrial em maio, em relação a abril, dificilmente será recuperada integralmente, e a subida da inflação em junho, acumulando 4,39% em 12 meses, aumenta o risco de alta dos juros antes do fim do ano. -RIO E SÃO PAULO- A expectativa de que 2018 seria um ano de retomada da economia está sendo frustrada a cada novo indicador divulgado nas últimas semanas, principalmente de números que refletem os efeitos da greve de caminhoneiros. A avaliação é que a paralisação freou ainda mais um ritmo que já vinha mais fraco que o imaginado. Já há quem veja um crescimento da ordem de 1,5% - consenso no mercado financeiro - como espécie de "teto" para a alta do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. No início do ano, analistas chegavam a projetar avanço de 2,9%, e os mais otimistas arriscando previsões acima dos 3%, embalados pelo crescimento acima do esperado em 2017.



MÁRCIA FOLETTO/13.07.2017Em queda. Fábrica de caminhões em Resende. Tombo de 10,8% na produção industrial em maio foi um dos motivos para a piora nas previsões de crescimento da economia



Uma série de resultados tem puxado as revisões para baixo. Em maio, a produção industrial despencou 10,9%, em relação a abril, uma queda que, segundo analistas, dificilmente será recuperada integralmente. Já a inflação, que ainda dava um alívio na renda e poderia ajudar a incentivar o consumo, entrou em novo patamar em junho, alcançando 4,39% em 12 meses, o que aumenta o risco de uma alta de juros antes do fim do ano.



- Hoje em dia, 1,5% seria o teto para o PIB. É o que estamos projetando e esperando para ver - diz Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, que previa alta de 2,5% no início do ano.



O mercado começou 2018 com previsões até mais otimistas, como mostra o Boletim Focus, divulgado semanalmente pelo Banco Central. Na máxima do ano, entre o fim de fevereiro e o início de março, a mediana das projeções chegou a bater os 2,9%. As expectativas passaram a cair meses depois, com a dificuldade de recuperação do mercado de trabalho e despencaram de vez a partir da greve. No mais recente relatório, divulgado ontem, a mediana estava em 1,53%. No mesmo documento, os analistas elevaram pela oitava semana seguida a estimativa para a inflação oficial, que agora é de 4,17%. Para 2019, a previsão ainda é de crescimento de 2,5%. INCERTEZAS TRAVAM INVESTIMENTOS O Bradesco atualizou sua previsão de crescimento de 2,5% para 1,5%. No Itaú, a projeção é de 1,7%. Até mesmo o Banco Central derrubou, na semana passada, a estimativa de crescimento deste ano de 2,6% para 1,6%.



- Há muitas incertezas tanto no cenário doméstico, com as eleições, quanto no externo, com a guerra comercial concreta iniciada pelo presidente Donald Trump. Além disso, a greve dos caminhoneiros trouxe prejuízo concreto para a indústria, por exemplo, no setor de aves, no qual o ciclo reprodutivo foi interrompido com a morte de muitas delas - avalia Thiago Xavier, economista que analisa atividade econômica na consultoria Tendências.



O problema, destacam os especialistas, é a consolidação de um ciclo vicioso. As incertezas travam investimentos, que adiam a retomada do emprego e o avanço do consumo.



- O cenário é adverso para recuperação do investimento. Alguns projetos que foram desengavetados na indústria, no primeiro semestre, foram apenas para modernizar ou manter a competitividade. Não se viu investimento de porte para ampliação da capacidade. E isso não deve acontecer até o fim deste ano - aponta o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).



É um panorama que afeta o caixa de empresas a Cabovel, do setor de autopeças, com cinco unidades em São Paulo (duas em Osasco e três em Vinhedo). A fabricante de cabos para aceleradores, embreagens e freios viu sua receita cair 28,5%, no mês de maio, consequência da greve dos caminhoneiros. A companhia deixou de receber componentes e matéria-prima para as linhas de produção, que diminuiu de ritmo, embora não tenha parado totalmente porque boa parte dela já estava programada.



- Do dia 21 de maio, data do início do movimento, até o fim do mês, não faturamos nada. E este período do mês representa 30% de nossas receitas - conta Nasser Barbosa, gerente comercial de reposição da empresa, lembrando que, se o movimento dos caminhoneiros durasse mais uma semana, as fábricas ficariam paralisadas por falta de material.



Um dos únicos fatores com impacto positivo na economia, no segundo semestre, é a volta do saque dos recursos do PIS/Pasep, que pode impulsionar um pouco o consumo, já que as famílias estão menos endividadas do que quando receberam os recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), no ano passado.



- Nossa estimativa é que, se 60% desses recursos forem para o consumo, haverá impacto de 0,3% no PIB. Esse impacto já está embutido na nossa previsão de crescimento de 1,7% - diz Xavier.



No Santander, a estimativa de crescimento do PIB foi revisada de 3,2% para 2%, principalmente por conta dos dados frustrantes da indústria e da recuperação mais lenta do mercado de trabalho, especialmente nas categorias em que o emprego é formal.



- Entre impactos diretos, que são vistos na produção industrial, por exemplo, e indiretos, como a queda da confiança dos consumidores, avaliamos queda de 0,7 ponto percentual no PIB deste ano, que já está contemplada em nossa previsão - diz o economista Rodolfo Margato, do Santander, que cita ainda o cenário de incerteza trazido pela eleição.



Na Guide Investimentos, o crescimento da economia foi revisado de 2% para 1,8%, e o viés continua sendo de baixa. O economista da Guide Investimentos Ignacio Crespo Rey observa que a mediacomo na das estimativas para o PIB apresentadas pelo Boletim Focus caiu mais de 40% nos últimos dois meses, o que não é pouco. Ele destaca que os efeitos positivos da queda da taxa de juros Selic ainda não foram totalmente repassados à economia, o que pode contrabalançar um pouco os fatores negativos. Mas lembra que a incerteza segue alta, o que inibe o consumo e o investimento:



- O índice de incerteza de junho calculado pelo Ibre/FGV chegou a 125,1 pontos. Dada a média de 100,4 desde o início da série, hoje a incerteza está quase 25% acima do patamar histórico. RISCO DE RECESSÃO NÃO É DESCARTADO O banco suíço UBS revisou recentemente a estimativa de crescimento do PIB de 2,2% para 1,8%. Os motivos para a redução foram os dados mais fracos da atividade econômica no primeiro trimestre, que ficou em 0,4%, ante a previsão de 1%. A instituição financeira lembra que houve um ensaio de recuperação em abril, mas a greve dos caminhoneiros, em maio, causou impacto não só na atividade, mas na confiança de empresários e consumidores.



Diante desse cenário, já há quem veja até o risco de uma nova recessão. Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, chegou a prever alta de 3% do PIB em 2018. Hoje, espera 1,9%, em um cenário sem reviravoltas políticas, o que considera "menos provável". O cenário político vai determinar se 2019 será de crescimento ou de novos números negativos, como em 2015 e 2016:





- Existe sim (risco de recessão), já para o próximo ano, a depender de quem ganhar (as eleições). A economia ainda está muito frágil, e qualquer desvio de rota nos joga em crise de novo. Talvez só assim será claro que precisaremos, por exemplo, de uma reforma da Previdência de verdade. Talvez a recessão que tivemos não tenha sido suficiente para quebrar os privilégios de Brasília e de quem se sustenta no Estado. Uma outra crise poderá ser necessária para deixar isso incontornável.


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