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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 05-04-2018 - 07:16 -   Notícia original Link para notícia
China e EUA exibem as armas

Em menos de 12 horas, Pequim retalia taxação de Trump com tarifas para produtos americanos



China e Estados Unidos mostram suas armas em meio à tensão crescente que pode se tornar uma guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo. Menos de 12 horas após o governo de Donald Trump publicar a lista de US$ 50 bilhões em produtos chineses sobre os quais aplicará tarifas de importação, Pequim respondeu na mesma moeda. Anunciou, na manhã de ontem, sua própria lista: pretende taxar em 25% 106 itens comprados pelos chineses dos americanos também em valor equivalente a US$ 50 bilhões. A retaliação chinesa está prevista para entrar em vigor só quando as taxas americanas começarem a ser aplicadas, o que deve acontecer após cerca de dois meses de audiências e reuniões entre representantes dos dois países. Ou seja: antes de um conflito aberto, espera-se que as duas potências conversem em busca de algum consenso.



CHINA OUT/AFPReciprocidade. Desembarque de soja importada no porto de Nantong, no Leste da China: produção americana terá de pagar tarifa



A reação chinesa afeta segmentos importantes de exportadores americanos. Inclui produtos como soja, aviões e carros. A lista é mais abrangente que outra divulgada há dois dias, que previa tarifas sobre US$ 3 bilhões em produtos americanos importados.



O governo da China diz querer evitar a todo custo uma guerra comercial e avisa que a retaliação é parte de uma "estratégia calculada". A rapidez e a intensidade da resposta assustaram os mercados ontem, mas, no fim do dia, houve recuperação. Um dos temores é que a China adote como estratégia uma nova desvalorização do yuan em relação ao dólar e venda títulos do Tesouro americano, dos quais é o maior detentor. Na Bolsa de Nova York, o índice Dow Jones fechou em alta de 0,96%, enquanto o Ibovespa saiu de uma queda de 2% no início da manhã para recuo de 0,31%, também influenciado pelo julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.



'TARIFAS SÃO COMO ARMAS NUCLEARES'



A China nega reações no campo financeiro, mas defende seu direito de retaliar no regime tarifário. Em entrevista coletiva, os vice-ministros de Finanças, Zhu Guandyao, e de Comércio, Wang Shouwen, acusaram Washington de usar argumentos sem fundamento para justificar suas medidas restritivas contra as exportações chinesas. Além disso, Pequim diz que os americanos criam impedimentos para suas próprias exportações de produtos de alta tecnologia, o que ajudaria a inflar o déficit comercial histórico dos EUA com a China. Zhu defendeu ainda que é do interesse dos americanos manter déficits não apenas com a China, mas com outros países do mundo, para garantir que o dólar continue a ser usado como moeda de troca global.



- É clara a violação das regras de comércio internacionais. Isso afetou diretamente os interesses chineses e a recuperação da economia mundial e sua estabilidade. A China está agindo no seu legítimo interesse. No artigo 7 da lei de comércio da China está dito que, se qualquer país tomar medidas restritivas contra a China, também podemos aplicar regras duras em resposta - disse Wang.



Os vice-ministros repetiram que a China não quer guerra, mas, se houver uma, está pronta para enfrentá-la.



- Ninguém sairá ganhando. Mas não temos medo - destacou Wang.



Na avaliação do economista Gaurav Saroliya, estrategista e diretor de macroeconomia da Oxford Economics, de Londres, ainda há espaço para negociação. A rápida resposta, inclusive, é vista com otimismo. Com os termos postos à mesa, as duas nações estão prontas para conversar, tendo em vista o que está em jogo:



- Uma guerra comercial pode custar para todos os lados. Tarifas são como armas nucleares: você raramente as impõe, mas as usa como ameaças.



Desde a eleição de Donald Trump, os chineses se preparam para uma disputa comercial com os EUA. O americano já havia ameaçado a China com tarifas de até 45% sobre produtos importados. Mas, após os dois encontros entre Trump e o presidente chinês, Xi Jinping, considerados bem-sucedidos pelos dois lados, imaginava-se que a tensão das relações havia sido reduzida.



- A China quer evitar uma guerra comercial o máximo possível, mas a sua mentalidade é a de "esperar pelo melhor e se preparar para o pior". Existe uma frustração com a continuidade das reclamações dos EUA sobre a China (sobre comércio e outros temas) e uma grande confiança de que a China está mais bem posicionada do que os EUA para sobreviver a uma guerra comercial - disse ao GLOBO o diretor do Centro Carnegie Tsinghua, Paul Haenle.



Já o especialista da consultoria Gavekal Economics em Pequim, Arthur Kroeber, afirma que tanto os EUA quanto a China têm razões para evitar o pior.



- A reputação de Trump como um negociador será maior se ele conseguir dizer que suas ameaças surtiram efeito nos chineses. A China, contudo, se beneficia fortemente do continuado acesso aos mercados globais e do fluxo de investimentos. A retaliação contra as sanções comerciais americanas teria um alto preço - afirmou Kroeber. Colaborou Marcello Corrêa



Abertura ajuda economia a crescer, diz estudo da FGV



Comércio exterior pode elevar PIB potencial, mas Brasil está atrasado


A tensão comercial entre Estados Unidos e China pode ser uma oportunidade - mas, ao mesmo tempo, um risco - para que o Brasil retome um processo no qual ficou atrasado em relação a outras economias: a abertura comercial. Um estudo do economista Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e diretor o Centro de Economia Mundial da FGV, com base em dados do Banco Mundial, mostra que, se o Brasil abrisse mais o seu mercado para aumentar a soma de suas importações e exportações dos atuais 27% do Produto Interno Bruto (PIB) para o equivalente a 40%, patamar similar ao da China, poderia elevar o potencial de crescimento da economia sem gerar pressões inflacionárias de 2,5% para até 4,5% ao ano.


O trabalho mostra oportunidades de acelerar a retomada da economia com abertura comercial. Nas últimas duas décadas, apesar da forte expansão do comércio internacional em meio à globalização, o Brasil manteve o perfil fechado. O país ocupa a 212ª posição em um ranking com 246 economias, incluindo países e blocos como a União Europeia. O comércio exterior brasileiro de 27% do PIB hoje é pouco maior que o tamanho que tinha em 2000: 22%. No mesmo período, a média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne economias desenvolvidas, saltou de 47,45% para 56,67%.


No Brasil, o chamado PIB potencial é baixo, um dos fatores que impedem um ciclo sustentável de crescimento da economia de engrenar. Na avaliação de Langoni, a abertura comercial é uma "reforma esquecida" que pode ajudar o país a elevar sua produtividade, apesar dos riscos do cenário internacional atual.


- Paradoxalmente, o protecionismo americano que gera retaliações de outros países oferece ao Brasil uma oportunidade. Abre espaço para buscarmos acordos comerciais no Pacífico da América Latina, onde temos Chile, Peru, Colômbia. E nos empurra para a Ásia - diz Langoni, para quem o tema precisará ser abordado pelos candidatos na eleição presidencial. - O que está na mesa é um novo modelo de desenvolvimento.


DIFICULDADES PARA ABRIR


Existe, no entanto, o risco de que, diante da turbulência, o país se feche, destaca Otaviano Canuto, diretor executivo do Banco Mundial para o Brasil e outros oito países. Isso porque o país deixou passar oportunidades no passado recente para fazer esse movimento. Canuto aponta a complexidade de tarifas e acordos comerciais superficiais entre os principais obstáculos. Para o economista, há potencial para uma taxa de abertura de 85% do PIB. Para ele, há instrumentos para proteger as empresas nacionais de práticas abusivas de outros países, como o dumping (subsídio para a venda de produtos abaixo do custo de produção):


- O kit para lidar com situações claras de dumping é reconhecido na OMC (Organização Mundial do Comércio), faz parte do painel de instrumentos. Mas não pode ser utilizado com leviandade.


Na avaliação do presidente da Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o Brasil não está integrado às cadeias de valor justamente porque tem empresas pouco produtivas. Por isso, a abertura é arriscada.


- Nós somos um país fechado porque somos incompetentes. Não temos preços competitivos para exportar produtos manufaturados. O valor das


commodities varia de acordo com as cotações internacionais. O Brasil não tem influência nem sobre preço, nem sobre demanda - critica Castro.



Em nota, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic) informou que a participação do comércio exterior no PIB deve aumentar, mas não citou uma meta específica. Entre as medidas para promover a abertura, citou o foco em acordos comerciais, como com a União Europeia. Já o presidente da Apex, Roberto Jaguaribe, destacou o programa de qualificação da agência que atendeu a 4.734 empresas no ano passado.


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