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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 17-03-2018 - 09:37 -   Notícia original Link para notícia
Papel verde-amarelo

Com aval do BNDES, Fibria fecha com Suzano, criando 'gigante mundial' de mais de R$ 60 bi



Controladores da Fibria, líder mundial em celulose de eucalipto, a família Ermírio de Moraes e o BNDES fecharam sua venda para a Suzano, uma das maiores do setor no país. Juntas, as empresas têm valor superior a R$ 60 bilhões e 28% do mercado externo. A opção dos controladores da Fibria, a família Ermírio de Moraes e o BNDES, de vender a companhia para a Suzano, formalizada ontem, faz lembrar os tempos em que o banco de fomento tinha como estratégia financiar a criação de "campeãs nacionais". Desta vez, contudo, em vez de aportes bilionários, o BNDES está reduzindo sua participação acionária e embolsando cerca de R$ 8,5 bilhões. E a companhia resultante da união das duas fabricantes nacionais de papel e celulose vai muito além do festejado selo verdeamarelo de anos atrás.



RICH PRESS/BLOOMBERG/26-7-2011Opção brasileira. Uma folha de celulose sendo preparada na fábrica da Fibria no Espírito Santo: a proposta do grupo asiático Paper Excellence acabou sendo rejeitada



Juntas, Suzano e Fibria terão valor de mais de R$ 60 bilhões, com 11 unidades industriais, 37 mil funcionários e capacidade de produção de 11 milhões de toneladas celulose por ano. As receitas com exportações chegam a R$ 18 bilhões anuais, e os investimentos previstos para 2018, R$ 6,4 bilhões. Ou seja, uma gigante global, cuja produção abrange 28% do mercado mundial da commodity.



- É a maior empresa de agronegócio do país e a quinta maior empresa não financeira do Brasil - comemorou o presidente da Suzano, Walter Scharlka, ao apresentar detalhes da transação.



A nova empresa vai ultrapassar a JBS. Em valor de mercado, ficará atrás de Petrobras, Ambev, Vale e Telefônica.



A aprovação do negócio pelos controladores da Fibria foi comunicada pouco depois de baterem o martelo, na noite de quinta-feira, pelo BNDES, que, por meio da BNDESPar, detém 29% do capital da empresa. A fusão foi confirmada ontem pelas duas companhias, em comunicados ao mercado.



- Vamos fazer dessa empresa uma vitoriosa. Vai dar orgulho aos brasileiros - disse Walter Schalka, presidente da Suzano Papel e Celulose, ao apresentar detalhes da operação na tarde de ontem, citando que, somente em sinergias, a união das empresas deve gerar ganhos de R$ 8 bilhões a R$ 10 bilhões.



Os controladores privados das duas empresa, as famílias Feffer (Suzano) e Ermírio de Moraes, já haviam negociado anos atrás, e voltaram a conversar sobre uma combinação dos negócios no fim do ano passado. Há duas semanas, já próximas de um formato final para a fusão, foram surpreendidas por uma oferta do grupo asiático Papel Excellence, que apresentou uma proposta de compra da Fibria. Inicialmente de R$ 67 por ação, a oferta foi elevada, na semana passada, a R$ 71 por ação, o que daria à Fibria um valor de mercado de R$ 40 bilhões. Esse movimento ousado deixou em suspenso o desfecho do negócio. E, segundo fontes, deu ao BNDES um papel fundamental na sua conclusão.



EXECUTIVOS VEEM GANHOS FUTUROS



O presidente do banco de fomento, Paulo Rabello de Castro, classificou ontem a fusão de um "negócio extraordinário". No ano passado, quando a Eldorado, fabricante de celulose controlada pelo J&F, estava à venda, Paulo Rabello chegou a afirmar que preferia que a compradora fosse uma empresa brasileira. Quem arrematou a Eldorado, porém, foi a Paper Excellence, por R$ 15 bilhões.



No entanto, ao comentar a fusão ontem, Paulo Rabello - que admite ter interesse em se candidatar à Presidência este ano -, rechaçou que, ao escolher a Suzano, o BNDES tenha se guiado por qualquer critério relacionado a uma ideia de campeãs nacionais.



- O que nos fez decidir foi a demonstração de um negócio otimizado, que cria valor - afirmou. - O indiscutível e indelegável papel dos arrojados empreendedores privados, e aí eu estou falando das famílias Ermírio de Moraes e Feffer, não torna ninguém campeão mundial, isso é pouco, mas gigantes mundiais.



Teriam pesado em favor da Suzano, ainda, dúvidas em relação à capacidade financeira da Paper Excellence para obter os recursos para fechar a compra da Fibria. Além disso, há restrições a estrangeiros no que se refere à propriedade de terras no país - a Fibria tem grande extensão de florestas de eucalipto em Mato Grosso do Sul.



Segundo fontes, em uma conta direta, a oferta da Suzano pela Fibria teria sido menor que os R$ 40 bilhões oferecidos pela Paper Excellence. Perguntado sobre um possível receio de acionistas minoritários contestarem a opção pela proposta da Suzano, supostamente menos vantajosa, Schalka negou e explicou que ainda é necessária a aprovação dos termos do negócio em assembleias de acionistas das duas empresas:



- Entendemos que temos, para os dois lados, maioria para a aprovação dessa operação. E nós estamos absolutamente tranquilos de dizer que essa transação cria valor para todo mundo, e as sinergias são a fonte principal da criação de valor.



De acordo com Marcelo Bacci, diretor financeiro da Suzano, "não é possível comparar preço entre ofertas com estruturas diferentes". Mas ressaltou que a fusão com a Suzano dará ao acionista o benefício das sinergias:



- Portanto, vão ter um preço no futuro que será a combinação do que estão recebendo hoje, mais o que valerá a ação da Suzano.



Num primeiro momento, contudo, não foi essa a percepção dos investidores. Ontem, as ações da Suzano já abriram em alta na Bolsa - o acordo foi fechado no fim da noite de quintafeira -, fechando com um salto de 21,79%, cotadas a R$ 28,50. Os papéis da Fibria, por sua vez, desabaram 10,21%, a R$ 64,25.



Pelo acordo, os acionistas da Fibria receberão cerca de R$ 29 bilhões em dinheiro, e dividirão, proporcionalmente às suas participações, 255 milhões de novas ações da empresa resultante da fusão com a Suzano. A estrutura societária terá a seguinte configuração: 46,6% do capital em poder dos acionistas controladores da Suzano; 11,1% com a BNDESPar; 5,6% com a Votorantim, da família Ermírio de Moraes; e os 36,9% restantes pulverizados no mercado.



Pelo acordo aprovado pelos controladores, os acionistas da Fibria receberão R$ 52,50 para cada ação ordinária da Suzano em parcela única, mais 0,4611 ação ordinária de emissão da Suzano. Já os detentores de American Depositary Receipts (ADRs, papéis negociados em Nova York) da Fibria receberão ADRs da Suzano na mesma proporção. Concluída a operação, as ações e ADRs da Fibria deixarão de ser negociadas na B3 (antiga Bovespa) e na Bolsa de Nova York, respectivamente, sendo trocadas pelos papéis da nova companhia, que, por enquanto, chama-se Suzano.



Para desembolsar os R$ 29 bilhões prometidos aos acionistas da Fibria, a Suzano recorreu a instituições financeiras internacionais, com as quais conseguiu levantar US$ 9,2 bilhões, disse Bacci. Segundo ele, reduzir rapidamente o endividamento da companhia será prioridade nos próximos anos. Somadas, as dívidas de Fibria e Suzano somam R$ 21 bilhões.



- O foco será gerar caixa para reduzir o endividamento - disse Bacci.



À ESPERA DA DECISÃO DAS AUTORIDADES



Schalka explicou que, com a fusão, a alavancagem chega a 3,5 vezes o resultado operacional (Ebitda, lucro antes do pagamento e juros, impostos, depreciação e amortização) da nova empresa. E a meta é reduzi-la a 3 vezes em dois ou três anos.



- A companhia (Suzano) sempre se pautou por uma gestão consciente e conservadora, e assim vamos continuar. Vamos manter o foco no investment grade (grau de investimento, selo de bom pagador dado pelas agências de rating) - acrescentou Bacci.



De acordo com Schalka, ainda não está definido se o nome da empresa mudará, ou mesmo se a marca Fibria será extinta. A conclusão do negócio depende ainda da aprovação dos órgãos reguladores, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). em que pese o poder de mercado que a nova companhia terá, o executivo disse não acreditar na imposição de restrições pelos órgãos antitruste. Além do Cade, a empresa terá de consultar órgãos similares de países como China, Estados Unidos e Europa.



- Não entendemos que seja necessário nenhum desinvestimento (venda) de ativos. Estamos discutindo sobre um mercado de commodities. Tem muitos players no mundo que fabricam em condições adequadas - afirmou Schalka.





A Suzano informou ainda que o acordo prevê multa de R$ 750 milhões em favor da Fibria, caso a fusão não se materialize em função de restrições muito onerosas por parte dos órgãos antitruste, no Brasil e no exterior.





O fator estrangeiro





Restrição à compra de terras brasileiras por grupos de fora pesou na decisão



As restrições legais para a venda de terras a estrangeiros e a proximidade entre as famílias controladoras de Fibria e Suzano - os Ermírio de Moraes e os Feffer - foram determinantes para a fusão entre as duas empresas brasileiras, deixando de lado os asiáticos da Paper Excellence, segundo analistas ouvidos pelo GLOBO. Desde 2010, o Brasil tem restrições à compra de terras por estrangeiros: a Advocacia-Geral da União (AGU) proibiu grupos internacionais de adquirirem o controle de propriedades agrícolas.



- A Fibria tem uma área muito extensa de florestas: 1,056 milhão de hectares. Isso poderia ser um entrave quando a fusão fosse analisada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), se os compradores fossem os asiáticos - diz um advogado que acompanhou as negociações.



Esse fator não atrapalhou a compra da Eldorado pela Paper Excellence porque a maior parte das florestas da antiga empresa do Grupo J&F era arrendada.



A mesma fonte diz que o pouco conhecimento sobre a família indonésia Widjaja, que controla a Paper Excellence, também pesou. Os Widjaja, que atuam no setor de celulose em diversos países, deram um calote de US$ 12 bilhões em credores no início do ano 2000, depois da crise asiática. Na tentativa de comprar a totalidade da Fibria, além de oferecer até R$ 71 por ação, eles se comprometeram a pagar uma multa de R$ 4 bilhões, a todos os acionistas, caso o Cade barrasse o negócio.



- Foram lances muito ousados, e não se sabe se eles têm tanta bala na agulha assim. Isso gerou desconfiança de como eles conseguiriam funding para o negócio - diz a fonte.



NEGOCIAÇÃO JÁ CAMINHAVA



Além de uma sinergia avaliada em R$ 10 bilhões, contou a favor da Suzano a amizade entre os Feffer e os Ermírio de Morais, que controlam a Votorantim. As duas famílias começaram a conversar para unir seus negócios de celulose há pelo menos três anos. Em 2017, voltaram à mesa, mas a fusão não andou. Depois que a Paper Excellence fechou a compra da Eldorado por R$ 15 bilhões, em setembro, as conversas foram retomadas, e o negócio assumiu um ritmo mais acelerado.



A Votorantim, que tem negócios em pelo menos outras sete áreas, já havia manifestado desejo de reduzir sua participação no setor de celulose. O grupo saiu da metalurgia, ano passado, ao vender sua divisão na área para a ArcelorMittal, e agora reduziu sua participação a 5,6% na nova empresa de celulose. Na Fibria, detinha 29,42%. Por isso o mercado apostava em um entendimento entre os Feffer e os Ermírio de Moraes.



Para a analista do setor de celulose do BB Investimentos, Gabriela Cortez, há muitos benefícios com a fusão, como redução de custos e despesas, melhora da estrutura logística e maiores avanços em tecnologia. Em relatório a clientes, ela disse ainda considerar os ganhos que virão de um maior poder de barganha: "Esse novo gigante está apto a negociar melhor com clientes, reduzindo descontos, contribuindo para melhores receitas".



A oferta da Paper Excellence pela Fibria pegou as duas famílias de surpresa, mas não mudou a direção da conversa. As duas empresas já haviam praticamente fechado a fusão quando, há duas semanas, os asiáticos ofereceram R$ 67 por ação da Fibria - oferta que subiu depois a R$ 71 por ação. Se fosse bem-sucedido, o grupo teria ainda mais força no mercado nacional de celulose, que, há apenas um ano, era dominado por três famílias brasileiras.



- A chegada da Paper Excellence trouxe algum incômodo. Certamente isso pesou na fusão com a Suzano - diz outra fonte, que não quis ser identificada.



O BNDES, que tinha 29% da Fibria e 7% da Suzano, foi peça-chave na opção pela Suzano, disseram fontes ouvidas pelo GLOBO. O presidente do banco, Paulo Rabello de Castro, já havia afirmando, no ano passado, que preferia que a Eldorado ficasse com um grupo nacional. A Fibria chegou a manifestar interesse, mas desistiu após a oferta da chilena Arauco, de R$ 14 bilhões, que acabou desbancada pelos asiáticos.



SALTO NO PREÇO DA CELULOSE



O salto do preço da celulose no mercado internacional, puxado principalmente pela demanda da China, deixou as exportadoras com o caixa reforçado para investir. A tonelada do produto saltou de US$ 650 em 2016 para US$ 1 mil no fim do ano passado. A Suzano, que não fazia investimentos há alguns anos, saiu à frente.



O analista Marco Saravalle, da XP Investimentos, lembra que o custo de produção de celulose no Brasil é muito mais baixo que o da concorrência. Na Fibria, é de US$ 203 por tonelada, contra média de US$ 208 no Brasil. Nos Estados Unidos, é de US$ 440.



- Por isso, a empresa foi cobiçada - diz Saravalle.


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