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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 03-03-2018 - 08:51 -   Notícia original Link para notícia
Tombo bilionário

Siderúrgicas brasileiras perdem R$ 1,9 bi em valor de mercado devido à decisão de Trump



União Europeia pode retaliar, e OMC teme guerra comercial



RICHARD DREW/APEfeito na Bolsa. Em NY, o Dow Jones reduziu suas perdas no fim do dia, mas Ásia e Europa fecharam em baixa



O anúncio do presidente Donald Trump de que vai taxar em 25% a importação do aço e em 10% a do alumínio provocou perdas bilionárias nas Bolsas do mundo. No Brasil, as siderúrgicas sofreram queda de R$ 1,91 bilhão em valor de mercado no pregão de ontem. Trump disse que "guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar". A União Europeia ameaça com retaliação, e a OMC quer evitar uma guerra comercial global. -RIO, SÃO PAULO, BRASÍLIA E NOVA YORK- Enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se gabava no Twitter de que "guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar", o restante do mundo reagia com perdas bilionárias nas Bolsas e ameaças de retaliação a sua proposta de taxar a importação de aço e alumínio. As siderúrgicas listadas na B3 (antiga Bovespa) perderam ontem R$ 1,91 bilhão em valor de mercado, devido à queda de suas ações. Diante do temor de uma guerra comercial global, organismos internacionais tradicionalmente cautelosos, como União Europeia e Organização Mundial do Comércio (OMC), foram contundentes.



Na quinta-feira, Trump anunciou que vai impor sobretaxa de 25% às importações de aço e de 10% às de alumínio, alegando motivo de segurança nacional: precisa ter aço para produzir equipamentos militares. Ontem, no Twitter, Trump empregou um tom desafiador para responder às críticas ao plano, sugerindo que uma guerra comercial seria bem-vinda. Um dos temas de sua campanha eleitoral fora suposta injustiça nas relações comerciais dos EUA, sobretudo com China e Japão.



"Quando um país (EUA) está perdendo bilhões de dólares no comércio com virtualmente todos os países com os quais faz negócios, guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar", escreveu o republicano na rede social. "Quando um país taxa nossos produtos em, digamos, 50%, e nós taxamos esses produtos em ZERO, isso não é justo nem inteligente. Em breve vamos ter impostos recíprocos de forma que tributaremos a mesma coisa que eles nos taxam. (Com um) déficit comercial de US$ 800 bilhões, não há escolhas!"



INSTITUTO QUER QUE BRASIL TAMBÉM ADOTE TAXAS



A possibilidade de aumento das tarifas de importação sobre o aço e o alumínio nos Estados Unidos atingiu em cheio o desempenho das ações do setor no Brasil. Na última semana, com o aumento da expectativa em relação à mudança, a desvalorização ultrapassou os 10%, mesmo que apenas uma pequena parcela das vendas das siderúrgicas brasileiras tenha como destino os Estados Unidos.



- O anunciado protecionismo ensejou fuga em massa dos ativos de risco, especialmente das Bolsas globais, além de ter semeado temores de que a iniciativa provoque uma guerra comercial mundo afora - avaliou Ricardo Gomes da Silva, superintendente da Correparti Corretora.



A expectativa das sobretaxas vinha ganhando força desde o carnaval, quando Trump tocou no assunto pela primeira vez, mas só na quinta-feira foi sinalizada como algo concreto. No acumulado da última semana, o papel que mais sofreu no Brasil foi o da CSN, com queda de 10,2%, a R$ 9,21. No caso da Usiminas, o tombo foi de 7%, para R$ 11,34. Os papéis menos afetados foram os da Gerdau, com recuo de apenas 1,5% na semana. A empresa também produz nos EUA e poderia se beneficiar das tarifas sobre produtos importados.



As ações da CSN e da Usiminas recuaram, só ontem, 5,05% e 3,89%, respectivamente. Com a queda, a primeira perdeu R$ 679,8 milhões em valor de mercado, enquanto a Usiminas registrou desvalorização de R$ 597,5 milhões. No caso da Gerdau, sua queda ontem foi de 2,38%, proporcionando uma perda de R$ 458,6 milhões em capitalização. A holding Metalúrgica Gerdau recuou R$ 180,1 milhões.



Foram esses papéis que mais pressionaram ontem o Ibovespa, principal índice de ações do mercado brasileiro. Pela manhã, a queda foi de mais de 1%. Mas, à tarde, a melhora dos mercados americanos e o desempenho positivo da Petrobras fizeram com que o índice encerrasse em alta de 0,45%, aos 85.761 pontos. Segundo Ari Santos, gerente de renda variável da corretora H.Commcor, os investidores exageraram no pessimismo em relação às sobretaxas e, aos poucos, corrigiram os excessos:



- Essa notícia causou um desgaste mundial, já que há um temor de uma guerra comercial. Mas, após esse impacto, as Bolsas nos Estados Unidos começaram a reagir, melhorando o desempenho do Ibovespa.



De fato, os principais índices americanos também conseguiram se recuperar. Depois de cair mais de 1%, o S&P 500 fechou em alta de 0,51%, enquanto a Bolsa eletrônica Nasdaq avançou 1,08%. A única queda foi no Dow Jones, mas de apenas 0,29% - pela manhã, também caíra mais de 1%. Já os mercados europeus, que fecham mais cedo pela diferença do fuso, encerraram em queda. O DAX, de Frankfurt, recuou 2,27%, e o CAC 40, de Paris, perdeu 2,39%. Em Londres, o FTSE 100 caiu 1,47%. Na Ásia, a Bolsa de Tóquio teve queda de 2,50%, e a de Hong Kong, de 1,48%.



Para o presidente do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Mello Lopes, o governo brasileiro precisa aumentar as tarifas de importação sobre o aço, atualmente de 12%, em média. Isso, diz, seria uma forma de evitar que o Brasil seja invadido por produtos siderúrgicos de outros países que perderão acesso ao mercado americano com as sobretaxas.



- O Brasil não pode ser ingênuo. Também tem que subir suas alíquotas de importação, para que o mercado interno não seja inundado - disse Lopes.



Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) classificou a decisão do governo americano de "injustificada e ilegal". Se adotadas as sobretaxas para o aço e o alumínio, alertou a entidade, as exportações brasileiras serão prejudicadas. Para a CNI, "o governo brasileiro deve utilizar todos os meios disponíveis para responder à decisão americana, inclusive no âmbito da OMC.



ELECTROLUX ADIA INVESTIMENTO NOS EUA



A agência de classificação de risco Moody's, no entanto, acredita que a adoção de sobretaxas será administrável para os produtores brasileiros. Isso porque as exportações de produtos acabados (aços planos e longos) não representam 22% do volume total vendido aos EUA. Segundo a Moody's, as exportações de Usiminas e CSN para os EUA não são significativas, e a Gerdau seria beneficiada por ter operações naquele país.



Trump, no entanto, já sofreu um revés por conta de sua decisão. A sueca Electrolux, maior fabricantes de eletrodomésticos da Europa, informou ontem que postergaria um investimento de US$ 250 milhões no estado americano de Tennessee por causa das sobretaxas.



- Estamos colocando esse plano em espera. Acreditamos que as tarifas podem causar um aumento significativo do preço do aço no mercado americano - afirmou Daniel Frykholm, porta-voz da Eletrolux.



A companhia compra localmente todo o aço que utiliza em suas operações nos EUA.





Sem fôlego para revidar



Defensora do multilateralismo, diplomacia brasileira deve, no máximo, recorrer à OMC



Quando o presidente Donald Trump avisa que vai sobretaxar em 25% as importações de produtos siderúrgicos, ele causa pânico nos países fornecedores, entre os quais o Brasil, e dá sinal verde para que outros grandes parceiros internacionais, como China, Rússia e União Europeia, também adotem sobretaxas. Trump desafia a Organização Mundial do Comércio (OMC), e é alto o risco de outros países adotarem medidas protecionistas em uma guerra na qual todos teriam algo a perder. Sem comércio, não há atividade econômica; sem atividade, empregos e renda são perdidos.



Porém, nem todos têm o mesmo fôlego para enfrentar os americanos. Segundo maior exportador de aço para os EUA, depois do Canadá, o Brasil dificilmente adotaria alguma retaliação bilateral contra os americanos. No máximo, recorreria à OMC.



Além de ser, por princípio, defensora do multilateralismo em todas as esferas, a diplomacia brasileira sabe que o mercado externo é uma das saídas para que as indústrias nacionais possam desovar seus produtos. Como define o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, "muitos vão rosnar, mas poucos morderão".



O reaquecimento da atividade econômica ainda é lento e insuficiente para que as siderúrgicas brasileiras superem de vez uma de suas maiores crises, alerta o Instituto Aço Brasil. Houve um pequeno aumento das vendas internas, de 1,2%, no ano passado, mas esse percentual não compensa a queda acumulada de 32,2% de 2013 a 2016.



A entidade afirma que essa guerra comercial já era iminente antes mesmo do anúncio de Trump. Segundo o setor, existe um excesso de capacidade de 735 milhões de toneladas de aço no mundo, das quais mais de 60% na China e na Rússia.



RISCO DE DAR UM TIRO NO PÉ



Pressionados pelo excedente de capacidade produtiva no planeta, alguns países começaram a se movimentar já no ano passado. Abarrotada de aço, a China é acusada de práticas predatórias a preços depreciados. No Brasil, as indústrias siderúrgicas sofreram, recentemente, uma derrota na Câmara de Comércio Exterior (Camex), que não aceitou sobretaxar aços planos laminados a quente chineses e russos, acusados de entrar no mercado brasileiro com preços artificialmente baixos.



Há uma briga interna no governo. De um lado, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços considera que a indústria siderúrgica nacional precisa ser protegida de eventuais surtos de importação. Defende a aplicação de tarifas antidumping. De outro, o Ministério da Fazenda afirma que, ao sobretaxar o aço importado, os produtos que usam esse insumo no mercado interno ficam mais caros, e, com isso, a inflação sobe. Com essa decisão dos EUA, o setor siderúrgico espera algum tipo de flexibilização da área econômica.



Nesse cenário, os EUA podem acabar afetando a si próprios. Ao fecharem seu mercado para proteger a indústria siderúrgica, podem ser prejudicados pelo enfraquecimento das empresas dos países fornecedores. Por exemplo: fabricantes de aço do Brasil importam carvão dos EUA. Se houver queda da produção, a compra de carvão desaba. Trump daria um tiro no pé.


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