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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 01-03-2018 - 07:09 -   Notícia original Link para notícia
Renda desigual

Nos estados de Norte e Nordeste, ganhos 'per capita' são menores que um salário mínimo



"É impressionante como essa desigualdade tem relação com a informalidade, que é mais comum no Nordeste" Bruno Ottoni Economista da FGV



Moradores dos lares de metade dos estados brasileiros tinham ganhos mensais inferiores a um salário mínimo (R$ 937, em valores de 2017) no ano passado. Essa desvantagem econômica está concentrada em 13 estados do Norte e Nordeste, segundo dados divulgados ontem pelo IBGE. Entre as dez unidades da federação com renda domiciliar per capita mais alta, esses valores variaram entre R$ 1.224, em Minas Gerais, e R$ 2.548, no Distrito Federal, enquanto os integrantes das famílias do Maranhão têm o pior rendimento, R$ 597. Para especialistas, essa desigualdade é explicada por fatores como a estrutura do mercado de trabalho e a taxa de desemprego de cada região (mais altas no Norte e Nordeste), o nível educacional da população e o tamanho das famílias. Segundo o IBGE, a média do Brasil é de de R$ 1.268 mensais.



DOMINGOS PEIXOTOSinal de recuperação. A vendedora Synnd dos Santos, de 25 anos, da Paraíba, se mudou para o Rio em busca de emprego. Conseguiu uma vaga temporária no Natal e acabou efetivada



- É impressionante como essa desigualdade tem relação com a informalidade, que é mais comum no Nordeste, e explica em grande parte esse rendimento inferior a um salário mínimo. Também tem relação com a escolarização menor nesses estados, com o fato de a população ser mais jovem do que a do restante do país, o que pressupõe menos experiência e menores salários. Nas regiões, há maior dependência de benefícios sociais como o Bolsa Família e uma maior taxa de desemprego - afirma Bruno Ottoni, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV).



O mercado de trabalho, porém, começa a melhorar. O IBGE também divulgou ontem que a taxa de desemprego do país não subiu no trimestre encerrado em janeiro. Historicamente, no início do ano, os temporários são dispensados, e as pessoas voltam a procurar emprego depois do período de festas de fim de ano. Ainda assim, a taxa ficou em 12,2% - mesmo índice registrado no trimestre encerrado em outubro do ano passado, que serve como base de comparação, e menor frente aos 12,6% do início do ano passado. RIO TEM RENDIMENTO MAIOR QUE A MÉDIA Há, ainda, 12,7 milhões de pessoas desempregadas. Mas esse grupo também parou de crescer, tanto em relação ao trimestre anterior quanto na comparação com um ano antes.



- A taxa mostra que houve dispensas, provavelmente de temporários, mas houve contratações e efetivações. Ainda que essa estabilização sinalize uma melhora do mercado de trabalho, ainda está muito apoiada em empregos informais, desprovidos de proteção social - ressaltou Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE.



A vendedora Synnd dos Santos, de 25 anos, natural da Paraíba, é um exemplo dessa melhoria no mercado. No ano passado, ela se mudou para o Rio em busca de emprego. Conseguiu um trabalho temporário para o Natal numa loja de sapatos de um shopping da Zona Norte. A trabalho tinha data para acabar, mas ela foi efetivada antes mesmo de o contrato temporário chegar ao fim:



- Fiquei um ano desempregada no meu estado. Por isso, resolvi me mudar. Cheguei aqui em janeiro de 2017 e fui morar com uma amiga. Vim na cara e na coragem. Logo nos primeiros dias na cidade, já saí distribuindo currículos. Busquei fazer tudo da melhor forma possível. Vesti a camisa da empresa. Outro ponto que considero importante é a forma com que trato os clientes, sempre de maneira educada e comunicativa.



O rendimento dos integrantes dos lares do estado natal de Synnd, a Paraíba, foi estimado em R$ 928 no ano passado. Somente sete estados mais o Distrito Federal têm rendimentos mensais per capita maiores do que a média de R$ 1.268. É o caso do Rio, onde foi estimado em R$ 1.445. A explicação dos especialistas para esse valor ser relativamente alto num momento em que o estado vive uma das piores crises fiscais, com taxas de desemprego muito acima da média do país, é o estado ter boa parte da população empregada ou aposentada no setor público, que paga os maiores salários entre todas as ocupações.



- Por ter sido capital do país, o Rio tem essa característica histórica - explica João Saboia, economista especializado em mercado de trabalho da UFRJ.



Segundo o dado mais recente apurado pelo IBGE, referente ao último trimestre do ano passado, o estado tem quase um milhão de funcionários públicos que ganhava, em média, R$ 4.199 mensais. Esse rendimento só perdia para os empregados do setor público do Distrito Federal, que ganhavam o dobro.



Para calcular o rendimento domiciliar per capita, o IBGE soma todo o dinheiro que entra na casa (em salários, pensões, aposentadorias, bolsas de estudo, aluguéis, rendimentos de poupanças e outras aplicações, entre outros) e divide pelo total de moradores da residência, incluindo crianças e outras pessoas sem qualquer fonte de renda. E os valores são nominais, sem descontar a inflação do período.



A composição familiar também faz o rendimento domiciliar per capita ser menor no Nordeste. Saboia lembra que estas famílias são mais numerosas do que as do Sul e do Sudeste.



Pesa também, observa o especialista, o fato de que essas duas regiões são mais dependentes de rendimentos de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família. Dados mais recentes do IBGE sobre o tema, referentes a 2016, mostram que, enquanto na média geral do Brasil 7,7% da população tinham outros rendimentos - seguro-desemprego, programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e poupança -, no Nordeste, esse percentual subia para 12,4% e, no Norte, para 10,5%. Enquanto isso, nas demais regiões caía pela metade: apenas 5,2% da população do Sudeste tinham rendimentos dessa fonte, no Sul eram 5,3% e no Centro-Oeste, 6%.



No Norte e no Nordeste, o rendimento do trabalho tem um peso menor, o que reforça a importância dos rendimentos provenientes de benefícios de programas sociais, e leva a uma renda mais baixa.



A boa notícia, segundo Luis Henrique da Silva de Paiva, sociólogo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), é que levantamentos comprovam que são os programas de transferência de renda que acabam reduzindo as desigualdades regionais e, mesmo que a reforma da Previdência seja aprovada, esses benefícios seriam os menos afetados.



- A tendência é que futuras reformas também preservem esses benefícios. Já benefícios de maior valor, concedidos em idades precoces, não parecem ter um papel muito relevante na redução das desigualdades. Eles serão mais afetados pela introdução da idade mínima e por regras mais duras para o cálculo do valor dos benefícios - explica. INFORMALIDADE AINDA CRESCE Estes dados sobre o rendimento per capita são anualmente enviados pelo IBGE ao Tribunal de Contas da União (TCU), pois servem de base para o rateio do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE). Os dados de 2017 serão usados para o rateio deste ano.



A Constituição Federal de 1988, de acordo com o artigo 159, determina que 21,5% da receita arrecadada com Imposto de Renda e Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) sejam repassados pela União aos estados e Distrito Federal.



A informalidade é uma das maiores preocupações dos analistas de mercado de trabalho, pois ela ainda cresce, enquanto o grupo dos empregados com carteira cai.



Segundo os dados do trimestre encerrado em janeiro, o grupo de 11 milhões de trabalhadores sem carteira aumentou 5,6% em relação ao patamar de um ano antes, o equivalente a mais 581 mil pessoas. Entre os 33 milhões de empregados com carteira assinada, houve queda de 1,7%. Foram menos 562 mil trabalhadores com proteção social.



- Você não têm motivos para comemorar em relação ao emprego com carteira, pois não estamos gerando postos formais, apenas perdendo menos do que antes - disse Azeredo, do IBGE.



Os analistas projetam que, a partir do segundo semestre, haverá geração maior de vagas com carteira de trabalho, o que contribuirá para a taxa média de desemprego do ano ficar na casa dos atuais 12%. Nas contas da FGV, neste ano serão criadas entre 700 mil e um milhão de vagas.


Palavras Chave Encontradas: Criança
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