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O Globo Online (RJ) ( Opinião ) - RJ - Brasil - 16-02-2018 - 10:39 -   Notícia original Link para notícia
José Paulo Kupfer - Austeridade à brasileira

Pode parecer, mas a redução do déficit primário em 2017 não reflete uma política fiscal contracionista, nem um ajuste estrutural das contas públicas


Aeconomia brasileira encerrou 2017 com resultados fiscais bem melhores do que os previstos. O déficit primário do setor público limitou-se a R$ 110,6 bilhões - mais de R$ 50 bilhões abaixo da meta e R$ 45 bilhões menor do que o déficit de 2016. Apesar dessa aparente contração fiscal, a economia pode ter crescido pelo menos 1% no ano, e as perspectivas para 2018 são ainda melhores. As estimativas para a expansão do PIB se situam na faixa de 3% e, com a folga fiscal obtida no ano passado, é possível prever que tanto a meta fiscal quanto o teto de gastos determinados para este ano serão cumpridos sem grandes dificuldades. Prevê-se espaço fiscal adicional de R$ 90 bilhões em gastos, sem ameaçar metas e tetos.



Esse quadro parece dar razão aos defensores - aí incluídos a equipe econômica do ministro Henrique Meirelles e os economistas, geralmente ortodoxos, que formam seu bloco de apoio - da tese da "contração expansionista". A teoria polêmica e com resultados, para muitos, bastante discutíveis, tem sido aplicada, com variações, em países europeus afetados pela crise de 2008.


A "contração expansionista" coloca a austeridade fiscal - representada por políticas que buscam reequilibrar as contas públicas, a partir de cortes em gastos do governo - no centro de um movimento que levaria à retomada da confiança na recuperação da economia e, com isso, à deflagração de nova onda de investimentos produtivos. No fim do processo, apesar da retração temporária nos gastos públicos, componente importante da demanda agregada, a economia voltaria a crescer de forma consistente.


Ocorre que, no caso brasileiro, se a política fiscal em 2017 promoveu uma contração de gastos de R$ 45 bilhões em relação ao ano anterior, a economia, ao mesmo tempo, foi irrigada com outros tantos bilhões de reais em estímulos com características parafiscais. Os exemplos mais notórios foram os R$ 43 bilhões liberados das contas inativas do FGTS e mais R$ 2 bilhões no exercício (de um total estimado em R$ 16 bilhões) com a antecipação para saque do PIS por idosos. No final, a austeridade à brasileira revelou-se, pelo menos no ano passado, neutra ou até mesmo um pouco expansionista em termos fiscais.


O dinheiro do FGTS e do PIS injetado na economia expandiu a renda disponível das pessoas, acionou o consumo e fez rodar a atividade econômica - fez o que costumam fazer os gastos públicos. Como lembrou o economista Nelson Barbosa, ministro da Fazenda no governo Dilma, em artigo recente na "Folha de S.Paulo", aconteceria o mesmo se o governo tivesse, por exemplo, promovido uma desoneração tributária ou feito transferências via abono salarial. A diferença é que esse aumento de "gastos" não afeta diretamente a dívida pública, como ocorreria se a injeção de recursos tivesse como fonte rubricas das contas públicas.


A austeridade à brasileira, além disso, manteve o padrão tão criticado de recorrer a receitas não recorrentes, pouco sensíveis ao ciclo econômico, para cumprir a meta fiscal. Receitas não recorrentes - ou seja, aquelas extraordinárias, que não se repetem -, de acordo com a avaliação da Instituição Fiscal Independente (IFI), somaram R$ 90 bilhões em 2017 e contribuíram com 60% da redução do déficit em relação ao PIB, no ano.


Entraram no balaio concessões, Refis, repatriações, precatórios não sacados e aumento da tributação de PIS/Cofins sobre combustíveis.


Recorrer a receitas extraordinárias tem sido, historicamente, a saída encontrada para sanar desequilíbrios fiscais sem enfrentar o conflito distributivo imposto pelo corte de despesas, politicamente complexo, para dizer o mínimo. Outra manobra fiscal com o mesmo objetivo espreme gastos não obrigatórios, caso em que despontam os investimentos públicos, mantendo incólumes ou quase despesas de custeio.


Com base nos resultados de 2017, pode-se dizer que a política fiscal do governo Temer não tem fugido à regra. Enquanto os investimentos públicos recuaram 22% em termos reais no ano passado, a partir de uma base já deprimida dos períodos anteriores, os gastos com pessoal, por exemplo, avançaram 6,5%. Sem falar no recorde de R$ 10,7 bilhões em emendas de parlamentares, numa progressão de 50% sobre o montante liberado em 2016.


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