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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 10-02-2018 - 11:15 -   Notícia original Link para notícia
Projetos para novo Código Comercial causam polêmica

Especialistas e parte do mercado veem risco de insegurança jurídica


Em tramitação no Congresso há quase sete anos, a atualização do chamado Código Comercial - conjunto de normas que balizam as relações empresariais, como regras para contratos - pode ser votada nos próximos meses. A retomada das discussões colocou em alerta especialistas e parte do setor produtivo, que veem na medida fonte de aumento de insegurança jurídica. Embora a proposta original tenha sido adaptada nos últimos anos para reduzir um caráter considerado intervencionista, persiste o temor de que a introdução de nova legislação crie mais burocracia.


FERNANDO LEMOS/20-3-2017 Incerteza. Nova legislação trataria de relações contratuais entre empresas: compras, vendas e relações entre sócios


Dois projetos de lei tratam do tema: um na Câmara dos Deputados e outro no Senado. O texto da Câmara é o mais antigo, apresentado em junho de 2011, quando foi criticado por conter trechos polêmicos, como a previsão de que o Ministério Público possa anular um contrato por falta de cumprimento da "função social", conceito vago, na avaliação de especialistas. A redação foi retirada pelo relator da matéria, deputado Paes Landim (PTBPI), que apresentou seu substitutivo em 2016. O parlamentar prepara uma terceira versão do texto, incorporando as sugestões.


- O mercado achou o projeto um pouco intervencionista. Vaise corrigir ao máximo esse traço e ver se a comissão e o mercado aceitam - afirma Paes Landim.


EXPECTATIVA DE MIL EMENDAS


O texto do Senado, de 2013, tem a mesma essência, mas inclui regras de processo, ou seja, as que definem como são tratadas as disputas judiciais entre empresas. A matéria tem 1.103 artigos. A versão em discussão na Câmara tem 785. A tramitação no Senado corre por fora. Segundo o relator, senador Pedro Chaves (PSC-MS), a expectativa é que o projeto seja votado até junho. Os dois textos devem se tornar um só, quando e se uma das Casas legislativas concluir a votação.


- Vamos analisar os questionamentos das federações. Óbvio que não vai ter unanimidade - afirma Chaves, que prevê que o texto receba ao menos mil propostas de emendas.


Hoje, as regras empresariais são regidas principalmente pelo Código Civil, a Lei das Sociedades Anônimas e a Lei de Falências. O país até tem um Código Comercial em vigor, mas o texto é de 1850. A maior parte foi revogada pelo Código Civil, de 2002, que dedica ao menos 229 artigos ao direito empresarial. Trechos do texto quase bicentenário estão valendo até hoje, exclusivamente para regulação do comércio marítimo. A lei faz referência a embarcações que "verdadeiramente pertencem a súditos do Império".


A ideia dos projetos é atualizar a legislação em uma só lei. Para isso, ora repete trechos inteiros do Código Civil, como o que determina o que fazer em caso de morte de um dos sócios, ora prevê mudanças em outras leis.


Para Gisela Gadelha, gerente geral do departamento jurídico do Sistema Firjan, há uma discussão sobre a necessidade de um Código Comercial:


- A crise exige reformas muito mais estruturantes do que um simples código. Não vai melhorar o ambiente de negócios e pode gerar insegurança jurídica.


O advogado Francisco Müssnich, fundador do escritório BMA - Barbosa, Müssnich e Aragão e especialista em direito societário, avalia que o texto, que considera obscuro, pode causar confusão:


- (O projeto) nunca foi discutido com a sociedade. Tem coisas repetitivas, sem sentido, sem reflexão, mexendo com coisas que são constituídas há anos.


A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) é crítica. Nos últimos dois anos, fez sugestões, parcialmente atendidas. Não consta mais a previsão da figura do facilitador, um auxiliar do juiz que ajudaria em processos complexos ou volumosos.


"A Fiesp expôs sugestões que espera sejam contempladas para que um novo Código Comercial melhore o ambiente de negócio para a indústria, que vem tentando se recuperar da crise, gerar empregos e se manter competitiva", informou a entidade.


IMPACTO BILIONÁRIO DA MUDANÇA


Já a Confederação Nacional do Comércio (CNC) é a favor. Um dos vice-presidentes da entidade, o deputado Laércio Oliveira (SDSE) é o presidente da comissão especial que analisa o assunto na Câmara. Para ele, o projeto vai desburocratizar o ambiente de negócios. Entre os pontos positivos, cita o estabelecimento de regras para o comércio eletrônico:


- Estamos construindo um código que trata dessas relações, das novas atividades que tratam das novas rotinas.


O presidente do Conselho de Direito da Fecomercio-SP, Ives Gandra Martins, concorda.


- Vai ser um novo marco de inserção daquilo que está no Código Civil, trazendo o Brasil de 1975 para 2018 - afirma, em referência ao ano em que o Código Civil começou a ser elaborado.


O advogado Fábio Ulhoa, especialista em direito comercial, destaca que o código é necessário, pois a legislação atual não contempla relações entre empresas. Ele é membro das comissões de juristas que elaboram os projetos na Câmara e no Senado.


- Juntar todas as relações civis como empresariais em um único código está errado - diz Ulhoa, em referência ao Código Civil. - Não se trata do mesmo jeito um contrato de locação de um apartamento com o de compra de uma siderúrgica.


Outra linha de raciocínio defende que o ambiente de negócios seja aprimorado, mas não por meio de códigos.


- Não há mais exemplos contemporâneos de código comercial. Essa ideia é do século XIX, uma visão de que o Direito poderia, em um, código tratar de tudo. A ideia de código nasce morta - defende Nelson Eizirik, advogado e professor de Direito da Fundação Getulio Vargas.


Já Luciano Timm, advogado e ex-presidente da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE), defende uma visão pragmática: a relação custo-benefício da criação da lei. Em 2014, estudo do Insper com base na versão original do projeto estimou que as despesas adicionais das empresas para se adaptarem à lei poderiam ultrapassar R$ 180 bilhões:


- Nenhum projeto fez análise de custo do impacto que teria. Toda mudança de legislação permite que partes entrem na Justiça para testar a interpretação dos tribunais - diz Timm.


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