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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 22-12-2017 - 06:48 -   Notícia original Link para notícia
Embraer pode voar mais alto

Boeing negocia parceria com fabricante brasileira para fazer frente à expansão da Airbus



As fabricantes de aviões Embraer e Boeing negociam parceria que, para analistas, pode envolver a venda de parte da empresa brasileira. Já houve acordo similar entre Airbus e Bombardier. O governo, que tem poder de veto, não aceita a venda do controle, mas daria aval a uma associação. As ações da Embraer subiram 22%. -SÃO PAULO E WASHINGTON- A fabricante brasileira de aviões Embraer e a gigante americana Boeing anunciaram ontem que estão negociando uma possível associação. A transação, tratada como "uma potencial combinação de seus negócios" em comunicado conjunto divulgado pelas empresas, pode, segundo analistas, envolver a venda de parte do capital acionário da Embraer à Boeing.



LUCAS LACAZ RUIZ/7-3-2017Alta tecnologia. O jato E195-E2 foi apresentado em março pela Embraer em São José dos Campos: modelo é usado por companhias de todo o mundo em rotas regionais



A notícia sobre as tratativas entre Boeing e Embraer, que só foi confirmada depois de reportagem do "Wall Street Journal", vem a público pouco mais de dois meses depois de a Airbus anunciar a compra do projeto de jatos comerciais C-Series da canadense Bombardier. Boeing e Airbus disputam a liderança do mercado de mundial aviação comercial, enquanto a Bombardier é a maior rival da Embraer no segmento de jatos de médio porte.



- Esse rumor de uma eventual parceria entre as duas já vem de algum tempo, principalmente depois do movimento da Airbus. A Boeing e a Embraer também têm linhas de produtos complementares, e juntas, além de ganhos naturais de escala e sinergia, poderiam atender qualquer tipo de demanda - diz o advogado Guilherme Azevedo, especialista em aviação do escritório SBZ Advogados.



As duas companhias já têm diversas parcerias, focada por projetos, mas desta vez os americanos querem algo maior, focado em aviação civil. Para a Boeing, seria uma forma de tentar frear a expansão da Airbus e ter um portfólio idêntico à da europeia: a empresa brasileira atua em um segmento que não é atendido pela americana.



A fabricante brasileira é líder na produção de jatos com capacidade de 70 a 146 lugares (o novo modelo E195-E2), usados por companhias de todo o mundo em rotas regionais. Também já possuiu uma fábrica na Flórida, o que facilitaria sua entrada no mercado americano e parcerias mais abrangentes com a Boeing. A companhia americana, por sua vez, produz aviões maiores com longo alcance.



AÇÕES DISPARAM NA BOLSA Para a Embraer, que tem 58% no mercado de jatos regionais, seria uma forma de ter respaldo em um momento que a China, o Japão e a Rússia tentam abocanhar este mercado, com o apoio de governos que seguem o exemplo dos subsídios canadenses à Bombardier. Isso gera uma enxurrada de questionamentos na Justiça.



- Também pode ser uma oportunidade para a Embraer ter acesso a toda a plataforma comercial da Boeing. Neste setor, questões sobre pós-venda, manutenção e treinamento são tão importantes quanto o valor das aeronaves - afirmou Pablo Bentes, diretor de Comércio Internacional e Investimento da Steptoe & Johnson, escritório de advocacia especializado em disputas comerciais que está atuando nas diversas frentes do setor em entidades como a Organização Mundial de Comércio (OMC).



A divulgação das negociações fez as ações da Embraer dispararem na B3 (a Bolsa brasileira) e também na americana, onde são negociadas na forma de recibos de ações (American Depositary Receipt).



Aqui, as ações da companhia chegaram a subir 39%, mas fecharam em alta de 22,49%. Nos Estados Unidos, as ADRs avançaram 21%. As ações da Boeing, por sua vez, caíram 0,64% em Nova York.



A concretização das negociações entre as duas companhias, contudo, dependerá da anuência do governo brasileiro, que detém a chama "golden share", uma ação de classe especial que lhe dá direito de veto à venda do controle, entre outros poderes. Fontes próximas à empresa americana reconhecem a dificuldade de uma compra direta da Embraer, mas estudam uma solução que garanta o controle brasileiro da companhia e, ao mesmo tempo, que a empresa americana tenha voz na divisão dos jatos comerciais da Embraer.



Perguntado há uma semana sobre como pensava em enfrentar a associação de Airbus e Bombardier, o presidente da Embraer, Paulo César de Souza e Silva, disse não temer o novo concorrente:



- O concorrente é mais forte, mas há duas coisas que nos valoriza. Primeiro, a Airbus validou o segmento (em que atuamos). Com a associação ela diz "existe mercado aí". A outra é que a Airbus não está desesperada. Ou a Bombardier vendia seu projeto ou morria. Então, a Airbus não vai vender avião abaixo do custo (como os canadenses vinham fazendo, o que levou ao Brasil a abrir um Painel na OMC contra a canadense) - disse Souza e Silva, completando: - Então, temos um competidor mais forte, com maior capacidade de suporte, mas que vai atuar dentro das regras. Não temos medo.





Governo descarta vender controle da Embraer, mas aceitaria parceria





União tem poder de veto. Produção de aeronave militar é tema sensível



-BRASÍLIAE RIO- O governo detém um tipo de ação na Embraer, denominada golden share (ação de ouro ou dourada, em tradução livre do inglês), que garante poder de veto em eventual mudança acionária na empresa. E é contando com esse instrumento que não vai permitir que a indústria brasileira de aeronaves passe totalmente para o controle da americana Boeing. Essa é a posição do presidente Michel Temer, transmitida ao ministro da Defesa, Raul Jungmann, e a outras autoridades da área militar, ao tomar conhecimento da operação em curso. Segundo interlocutores, Temer afirmou: "Em meu governo, a Embraer jamais será vendida".



LUCAS LACAZ RUIZ/2-2-2016Novo mercado. Avião militar da KC-390, que está em fase final de certificação: brasileira está negociando até seis aeronaves com o governo português



Uma fonte graduada do governo revelou que uma possibilidade seriam as duas empresas atuarem em projetos conjuntos, na forma de associações e joint-ventures. É com esse caminho que o Palácio do Planalto estaria trabalhando.



- O que existe é uma reestruturação global do mercado: associação Bombardier/Airbus, além de China e Japão entrando no nicho de aeronaves médias - explicou essa fonte. - A Embraer não passará para a Boeing. Ela é inegociável!



O poder de veto pode ser aplicado em várias situações. Por exemplo, na mudança no nome da companhia ou de seu objeto social; na criação/alteração de programas militares que envolvam ou não o Brasil; na interrupção de fornecimento de peças de manutenção e reposição de aeronaves militares; e na transferência de controle acionário.



A avaliação de integrantes do governo é que qualquer negócio entre a Embraer e a Boeing deverá ser analisado com "cuidado". Isso porque a companhia brasileira tem importante participação no desenvolvimento de tecnologia nacional e na produção de equipamentos militares, segundo uma fonte da área econômica.



Quando esteve em viagem oficial à América do Norte, em meados de novembro, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, se encontrou com autoridades da Boeing. Na época, entre os assuntos tratados, foi abordada a boa relação entre Embraer e Boeing têm, mas não se falou em compra ou associação das empresas.



ÔNUS POLÍTICO Na viagem, o ministro disse que a americana poderia vir a se associar à fabricante brasileira em mais um projeto, relacionado a uma eventual exploração da base de lançamentos de Alcântara (MA), cuja cooperação entre Brasil e Estados Unidos está em análise pelo Departamento de Estados dos EUA.



Na avaliação de Jorge Leal, professor de Transporte Aéreo da Escola Politécnica da USP, dificilmente o interesse comercial das duas empresas vai se sobrepor ao interesse do governo brasileiro.



- A área de defesa é estratégica para qualquer governo. Dificilmente, o Brasil vai permitir que a empresa que fornece aviões para a Força Aérea Brasileira fique nas mãos de outro governo - disse o Leal. Pode até ser que seja feito algum tipo de associação, mas não compra de controle.



Além da questão estratégica, avaliam pessoas que acompanha m o setor de defesa, qualquer decisão do presidente da República reflete sobre sua popularidade, já que a Embraer, assim como a Vale, ainda são símbolos nacionais, apesar de terem sido privatizadas há bastante tempo.



- Acredito que Temer não vai querer esse ônus político - disse uma fonte.



O governo brasileiro detém golden share na Embraer, na Vale e no IRB. Essa classe especial de ações geralmente existe em empresas estatais ou de capital misto. Há alguns meses, contudo, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, consultou o Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a possibilidade de extinguir essa classe de ação.


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