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O Globo Online (RJ) ( Opinião ) - RJ - Brasil - 27-10-2017 - 10:54 -   Notícia original Link para notícia
José Paulo Kupfer - O investimento ainda fora do radar

Dúvidas sobre a sobrevida produtiva do governo Temer depois da derrubada da segunda denúncia e condições objetivas adversas retardarão as decisões de investir


As taxas básicas de juros na economia, determinadas pelo Comitê de Política Monetária (Copom), chegaram, depois da decisão da quarta-feira, a 7,5% nominais ao ano, e rumam agora para o nível de 7% anual, no encerramento de 2017. Com isso, a trajetória da taxa Selic, que partiu há 14 meses de um pico de 14,25%, terá exibido uma quase inédita desaceleração, descendo ao menor nível nominal desde que se tornou a taxa de juros de referência da política monetária, em março de 1999. É possível, embora não seja ainda a aposta da maioria, que os juros básicos recuem mais, descendo abaixo de 7% em fevereiro de 2018, estacionando até meados de 2019.



Em combinação com a também quase inédita trajetória de desaceleração da taxa de inflação, sem previsão de nem sequer alcançar o centro da meta até 2020, a redução dos juros básicos surge como elemento fundamental nas projeções de recuperação da economia. A expectativa é a de que, ao se manter, em termos reais ex ante (considerando a inflação futura e a curva de juros projetada à frente), em 3% ou até mesmo um pouco menos, os juros de referência da economia operem, positivamente, na redução do endividamento e, em consequência, da inadimplência, destravando o canal de crédito e, assim, dando consistência à retomada da atividade, com a impulsão da mola do investimento.


Na prática, a teoria virtuosa por trás desse roteiro esbarra nas condições adversas da vida real da economia. A derrubada da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer e ministros ocupantes de gabinetes vizinhos tirou da sala um bode que, na verdade, já não estava mais lá desde que se estruturou com sucesso o padrão fisiológico de garantia da maioria parlamentar de apoio ao governo. Restaram, porém, muitas incertezas políticas, incluindo as indefinições para a corrida presidencial de 2018, que assume mais e mais protagonismo à medida que os dias e os meses avançam.


A estratégia do governo, exposta desde o minuto seguinte ao do encerramento da votação favorável na Câmara dos Deputados, é fazer parecer que o caminho das prometidas reformas, praticamente paralisadas desde a divulgação da conversa noturna de Temer com o empresário Joesley Batista, está agora desimpedido. Mas dúvidas sobre a qualidade da sobrevida produtiva do governo não foram eliminadas juntamente com a denúncia contra Temer, sobretudo em relação à aprovação de medidas impopulares do seu programa reformista, a começar pela Previdência.


Além disso, as condições objetivas da economia, embora estejam em processo de lenta descompressão, continuam adversas, no mínimo retardando, se não inviabilizando por ora, a retomada dos investimentos. A mais recente atualização do já clássico estudo do Cemec - que consolida a trajetória histórica da situação financeira de um grupo significativo de empresas abertas e fechadas, previsto para ser publicado nos próximos dias - mostra, com dados até fins do primeiro semestre, no caso das companhias abertas e até dezembro de 2016, no das empresas fechadas, que já é possível observar o início de uma reversão positiva dos investimentos. Mas o movimento ainda está longe de representar a superação das barreiras que impedem o seu deslanchar.


"Embora o custo da dívida e o endividamento estejam começando a cair, a melhora na relação entre taxa de retorno e custo do capital tem sido muito gradual e ainda não produz entusiasmo", diz o economista Carlos Antonio Rocca, professor da USP e diretor do Cemec, que coordenou o estudo. Rocca lembra que, além dessa defasagem, a ampla capacidade ociosa ainda existente colabora para retardar o movimento de retomada do investimento.


Os dados confirmam a avaliação. Enquanto a taxa de retorno do capital total, nas companhias abertas, por exemplo, evoluiu de 5,5% em 2015 para 7%, no acumulado de 12 meses encerrado em junho de 2017, depois de chegar a 7,7% em 2016, o custo médio estimado do capital, no período, recuou de 16,7% em 2015 para 12,2% em 2017. A diferença de 5,2 pontos percentuais entre uma e outra explica por si por que a decisão de investir, na média da economia, mesmo com recuperação no consumo, ainda está fora do radar das empresas.


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