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Isto é Dinheiro online ( Economia ) - SP - Brasil - 21-10-2017 - 10:36 -   Notícia original Link para notícia
O consumidor tem a força

Queda na inflação de alimentos favorece as classes C, D e E, que voltam a consumir. Em meio à retomada, o varejo já registra alta nas vendas, mas as empresas precisam prestar atenção nos novos hábitos de compra





Loja cheia: a queda nos preços dos alimentos proporciona uma folga no orçamento das famílias, que estão voltando a comprar em lojas como as Casas Bahia (Crédito: Marcio Fernandes/AE)



Há um ditado que diz: a corda sempre arrebenta para o lado mais fraco. Nas crises econômicas, essa é uma dura realidade. Na derrocada brasileira dos últimos anos, incentivada pelos erros econômicos do governo de Dilma Rousseff, que conseguiu a proeza de unir baixo crescimento com inflação alta, foram os mais pobres que sofreram na pele as consequências da má administração. Isso se deve ao fato de que os diferentes grupos que compõem o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador de inflação oficial, terem pesos distintos no orçamento das famílias, dependendo de sua faixa de renda.



Os alimentos e bebidas, por exemplo, correspondem a uma parcela bem maior dos gastos para as classes C, D e E do que para as classes A e B. Na prática, o que acontece na crise é que o rico deixa de comer fora. Já o pobre tem de mudar drasticamente seus hábitos para não estourar o orçamento. "As famílias acabam consumindo menos ou escolhendo produtos de pior qualidade", afirma Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, especializado em pesquisas de consumo. No ano passado, os alimentos foram um dos grandes responsáveis pela alta nos preços. O resultado foi uma queda em cascata no consumo.



Feira livre: no ano, o grupo alimentos e bebidas, que compõe o IPCA, registra deflação. O consumo das famílias deve liderar o crescimento da economia (Crédito:Tiago Queiroz)



Como tinham de gastar mais dinheiro para pôr comida na mesa, as famílias tiveram de cortar gastos considerados supérfluos, num ciclo perverso para a economia do País. A boa notícia é que, nos últimos meses, essa tendência se inverteu. Os alimentos e bebidas estão puxando a desaceleração da inflação. Em agosto, esse grupo registrou uma deflação de 1,07%, de acordo com dados do IBGE. Em setembro, a queda nos preços continuou: deflação de 0,41%. No ano, a deflação acumulada dos alimentos e bebidas está em 1,97% e, nos últimos 12 meses, acumula 2,14%. Já o IPCA registra inflação de 1,78%, no ano, e de 2,54%, em 12 meses.



A nova conjuntura já se reflete no varejo. Em agosto, o volume de vendas nos supermercados cresceu 3,6%, ainda segundo o IBGE, na comparação com o mesmo mês do ano passado. No ano, o varejo registra um crescimento de 0,7% nas vendas, revertendo a tendência de queda dos últimos 12 meses. Um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em setembro, aponta que o IPCA deve encerrar o ano abaixo de 3%. Em junho, a previsão do instituto era de uma inflação entre 3,5% e 4,3%. A deflação dos alimentos foi apontada pelo Ipea como um fator que pode estar contribuindo para ampliar o consumo, em especial nas famílias de baixa renda.





O documento diz, ainda, que o crescimento da economia brasileira será liderado pelo consumo das famílias e pelas exportações, considerando a ótica das despesas, e pelo agronegócio, tendo em vista a ótica da oferta. A política monetária é o que está dando o grande impulso para essa retomada, uma vez que, com a inflação controlada, o Banco Central está conseguindo reduzir a taxa básica de juros, a Selic. Atualmente em 8,25% ao ano, ela deve chegar a dezembro na casa dos 7%, de acordo com a previsão do instituto. As boas perspectivas de retomada do consumo pelas famílias de baixa renda não estão restritas a questões como a queda na inflação e o recuo no desemprego.



Para analistas consultados pela DINHEIRO, o fato de esses e outros indicadores apresentarem melhorias constantes, mês a mês, sinaliza que o período mais agudo da crise ficou para trás. "Já é possível perceber um cenário sólido, que se reflete no bolso do consumidor. Não é um quadro pontual", diz Carolina Araújo, líder da indústria de alimentos da consultoria Nielsen. Na visão de Meirelles, do Locomotiva, ainda é cedo para apontar uma relação direta entre a queda da inflação dos alimentos e a alta no varejo. "O problema é que não houve uma recuperação da renda", afirma. Mas o que está acontecendo é uma mudança no patamar de consumo. "Daqui para frente, haverá uma maior conscientização a respeito de qualidade e de marca." Ou seja, o consumidor voltará a comprar, mas será muito mais criterioso.



Varejo popular: com a retomada, os consumidores devem se tornar mais criteriosos. Isso traz oportunidades para companhias de bens de consumo (Crédito:Clayton de Souza/Estadão)



Isso representa uma oportunidade para empresas que surfaram na onda da ascensão da classe C, na década passada, como Unilever e P&G, gigantes do setor de bens de consumo, que estão entre as maiores companhias do Brasil no anuário AS MELHORES DA DINHEIRO. Só que elas precisam entender o comportamento desse novo consumidor. "Não haverá aquela grande demanda por marcas, como no passado. Mas a percepção da qualidade será muito maior", diz o pesquisador. É o que tem acontecido, por sinal, no setor de alimentos. Com maior folga no orçamento, os consumidores estão deixando de priorizar apenas itens básicos e abrindo espaço em seus carrinhos e cestas para produtos não essenciais, que tinham sido descartados durante a crise. "Categorias como biscoitos, requeijão, chocolates estão voltando a crescer ou, no mínimo, estancando a queda nas vendas", afirma Carolina, da Nielsen. Ela destaca ainda os bons índices recentes no segmento de higiene e beleza.



Outros dados reforçam esse quadro de reaquecimento e diversificação. Em setembro, os shoppings registraram o melhor resultado do ano, com um crescimento de 4,4% no fluxo de pessoas, em comparação com o mesmo mês, um ano antes. Segundo o estudo divulgado pelo IBOPE Inteligência, esse avanço foi puxado, especialmente, pelos centros de compras de perfil mais popular. Nessa faixa, a alta foi de aproximadamente 7%. "Segmentos como o varejo popular, vestuário, eletrodomésticos e eletroeletrônicos já estão se beneficiando desse cenário mais animador", diz Joelson Sampaio, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV). Uma das categorias mais afetadas durante o longo período de recessão, o setor de eletroeletrônicos é justamente um dos que estão recuperando o fôlego.



No acumulado de janeiro a agosto, as vendas desse segmento registraram um salto de 8,8% em relação ao mesmo intervalo de 2016, segundo dados compilados pela consultoria GfK. Para Sampaio, da FGV, já é possível identificar outros elementos que, na esteira desse conjunto de bons indicadores, fortalecerão o aumento do poder aquisitivo das famílias de baixa renda. "A oferta de crédito para esse perfil de consumidor está voltando, pouco a pouco, a ter mais flexibilidade", afirma. O analista alerta, no entanto, que sob a ótica das políticas econômicas do governo federal, é preciso tomar cuidado para não repetir erros do passado recente, quando o consumo foi o principal motor do crescimento do País. "A via do consumo é ótima para sair da crise, mas não para consolidar um crescimento sustentável. É tiro curto", diz. "O governo precisa emplacar as reformas e atrair investimentos."








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