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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 24-09-2017 - 12:57 -   Notícia original Link para notícia
Crise? Que crise?

Pequeno grupo de varejistas consegue manter vendas em alta em meio à recessão no setor



"Quem tem consistência de resultados, tanto nos momentos bons como nos ruins, são aquelas empresas que têm consistência em suas estratégias" João Mamede Analista de varejo do Santander



A recessão que derrubou o consumo trouxe uma onda de dois anos inteiros de perdas para o varejo brasileiro. Um grupo de companhias do setor, porém, conseguiu surfar o mar turbulento e sair da crise com resultado e operação mais sólidos do que antes. Estão nesse time companhias como a Renner, que, desde 2014, ampliou sua rede de lojas físicas em 56%, para 473, e acaba de expandir suas operações para o exterior com uma filial no Uruguai. Os resultados da Magazine Luiza a transformaram em fenômeno da Bolsa, multiplicando seu valor de mercado em mais de nove vezes, para R$ 13 bilhões. No grupo Arezzo&Co, de moda, a capitalização quase dobrou, para R$ 4,6 bilhões. Já as Lojas Americanas ampliaram o faturamento em 7%, para R$ 5,5 bilhões no primeiro semestre deste ano, mesmo diante de competição mais acirrada em seu segmento. Com a melhora da economia, especialistas acreditam que varejistas como essas largarão na frente para aproveitar a retomada gradual do consumo.



O segredo por trás do movimento de expansão dessas companhias é a combinação de eficiência na gestão financeira com foco em inovação e tecnologia, resultando em ganhos em logística e criterioso mapeamento dos desejos do consumidor, avaliam especialistas. Ana Paula Tozzi, da AGR Consultores, destaca que estes são fatores determinantes para o desempenho das empresas atualmente. A diferença entre ganhar ou perder, explica, está atrelada à utilização ou não desse conjunto de estratégias.



- As empresas que estão em expansão durante a crise têm eficiência em gestão financeira. São principalmente aquelas que trabalham com projeto de orçamento base zero. Ou seja, reavaliam o orçamento ano a ano a partir do zero, analisando o que será necessário para o ano seguinte e reduzindo ao máximo as despesas. Além disso, apresentam capacidade de inovação afinada com a demanda do consumidor, o que pede forte investimento em tecnologia.



São diferentes escolhas acertadas para cada exemplo, como a diversificação do portfólio de marcas do grupo Arezzo; a aposta na transição para plataforma digital perseguida pelo Magazine Luiza; a fé inabalável no crédito na Renner; e a capacidade das Americanas de traduzir em vendas cada data especial do calendário.



Se garantir musculatura de caixa e competitividade à operação no cenário recessivo soou quase como um movimento contracorrente, essas empresas se veem ainda mais bem posicionadas em um cenário macro mais benigno.



De janeiro a agosto deste ano, o número de pedidos de recuperação judicial no país encolheu 18,9%, enquanto o de pedidos de falência recuou 14,4%, segundo a Boa Vista SCPC. Os juros - determinantes para um setor calcado em crédito - despencaram de 14,25% para 8,25% em menos de um ano. Esse contexto permitiu ao consumo das famílias avançar pela primeira vez, após nove trimestres, entre março e junho.



- Quem tem consistência de resultados, tanto nos momentos bons como nos ruins, são aquelas empresas que têm consistência em suas estratégias. São companhias que não desvirtuam suas operações em função de um momento ruim. Como costuma resumir o José Galló, da Renner, é preciso não cair em tentação - observa João Mamede, analista de varejo do Santander.



Leonardo Coelho, diretor da Alvarez & Marsal (A&M), especializada em reestruturação e recuperação de empresas, concorda que se sai bem quem se ajustou ainda no pré-crise:



- Quem está bem é porque mantém uma operação sólida, ajustada há tempos. Cada segmento tem uma dinâmica diferente. O de eletroeletrônicos demanda análise de dados e investimento em tecnologia, enquanto no vestuário o mais importante é o processo de identificação de tendências e a agilidade em "tropicalizar" isso ao mercado brasileiro.



Levantamento da A&M mostra que o nível de endividamento de 12 empresas do varejo com capital em Bolsa está estável na comparação com 2016.



- Há um efeito da crise que foi benéfico para todos: a queda da taxa de juros, que reduz o montante que as empresas têm de pagar para quitar seus débitos. A estabilidade na dívida é um sinal positivo - diz Coelho.





RENNAN SETTI - 'Cortar o crédito nem sempre é a melhor decisão na crise



'Há 26 anos à frente da Renner, executivo apostou em novas lojas na recessão, estratégia que admite ser 'inusitada'



Por que a Renner atravessou a crise com menos problemas que o setor de varejo como um todo?





DIVULGAÇÃO/JEFFERSON BERNARDES/ AGÊNCIA PREVIEW



Fôlego. "Nunca entramos no negativo com nossas linhas", assegura Galló Além de roupas, a Renner tem participação importante em segmentos como perfumaria, no qual é líder. Como tem sido o desempenho dessas outras linhas? Como estão os planos para sua sucessão, com sua aposentadoria em 2019? Há cinco anos, a gente vem tocando um plano bem estruturado de sucessão. Não só com o cargo de CEO, mas em todos os níveis. Há chance de o senhor continuar no cargo após 2019? Não tenho autorização para fazer esse tipo de declaração (risos). Depende mais do Conselho de Administração. Estamos trabalhando com entusiasmo. E, de qualquer forma, não vou desaparecer da Renner. Continuarei no Conselho.



As crises são um teste para o seu modelo, e as empresas que têm marcas fortes e diferenciais competitivos passam melhor por ela. Nossa proposta de valor está em cada produto que vendemos. Mas também trabalhamos muito a questão do crédito. Muitas vezes, em uma crise, o primeiro impulso é cortá-lo, porém essa nem sempre é a melhor decisão. Fazemos isso por meio de uma reavaliação constante da nossa base de clientes. E hoje temos um consumidor menos endividado. No Brasil, aliás, nunca tivemos uma crise de crédito ao nível do consumidor, porque o crédito funciona quase como um ativo. Ele é usado até para comprar alimentos.



Por que a Renner escolheu o Uruguai para abrir sua primeira loja no exterior?



É um país estável, cujo Produto Interno Bruto (PIB) cresce 2,5%, a renda per capita é 60% maior que a do Brasil e tem uma distribuição de renda parecida com a brasileira. Além disso, fica próximo de nosso escritório central e do centro de distribuição que temos em Santa Catarina. E os uruguaios visitam bastante o Brasil, a Renner é uma marca conhecida entre eles. Vocês planejam abrir mais lojas naquele país? E quanto a outros países, há planos?



Até o fim do ano, teremos mais duas lojas em shoppings em Montevidéu, no Punta Carretas e no Costa Urbana. No momento, não temos planos de ir além do Uruguai. Queremos primeiro testar nosso modelo no exterior. Viramos exportadores, então temos um trabalho a fazer em termos de ajuste de sistema e de produtos. Mas é preciso dizer que estamos bastante agressivos também aqui no Brasil. Como está essa estratégia? Estamos abrindo 30 lojas da Renner, 15 da Camicado e 25 da Youcom este ano. É algo bastante inusitado na crise.



A queda do preço dos imóveis por causa da crise ajuda essa expansão?



Sim, existe uma relação com os ativos imobiliários mais baratos. Algumas das negociações que tínhamos foram muito favoráveis. Mas a questão é que nosso segmento é bastante fragmentado, com cada uma das cinco grandes varejistas detendo de 12% a 14% do mercado. Os outros 40% do mercado de roupas são informais. Esta fatia está diminuindo, era 60% há alguns anos. Mas há bastante oportunidade para reduzi-la ainda mais. Para isso, precisamos de metro quadrado.



A Renner está investindo com força em seu canal digital? Ele já é relevante?



Ele cresce a um ritmo de dois dígitos bem altos e passa a ganhar importância, mas seu tamanho ainda não chega a influenciar significativamente o resultado da Renner como um todo. Mas acreditamos no modelo multicanal, de ofertar os produtos em todas as plataformas, e todas as grandes estão fazendo isso. Veja o caso da Amazon comprando a Whole Foods, que é uma loja física...



Toda essa parte de cosméticos sentiu muito menos a crise, então é natural que, agora, com os sinais de melhora na economia, ela tenha um crescimento menor. Mas a verdade é que nunca entramos no negativo com nossas linhas de produtos durante a crise. O que houve foi um menor crescimento.



A Renner planeja fazer alguma aquisição ou lançar mais uma marca?



Não. Mas temos tido uma boa experiência com a marca de roupa plus size Ashua, que é vendida apenas na internet, mas que pode vir a ter lojas físicas no futuro.





Recessão fecha operação de ícones do varejo



Vendas do comércio já sobem, mas retomada deve ser lenta até no Natal



Marcas icônicas do varejo no Brasil e no Rio sucumbiram à recessão. Recentemente, a Casa Cruz e a Roberto Simões encerraram suas operações. Grifes como Espaço Fashion e XSite, de moda feminina, e Andarella, de calçados, também baixaram as portas. A Leader está em recuperação extrajudicial, enquanto a Máquina de Vendas - união de Ricardo Eletro e Insinuante - luta para reestruturar sua dívida e reequilibrar as atividades.



O principal fator a impactar negativamente o desempenho de uma varejista é a gestão financeira ineficiente, que fragiliza a operação, diz Leonardo Coelho, diretor da consultoria Alvarez & Marsal:



- Com a crise, muitas empresas deslocaram o foco para a operação financeira. Com os esforços concentrados na reestruturação, perdem capacidade operacional. No pequeno varejo, sobretudo nas empresas familiares, isso é ainda mais danoso.



EXPANSÃO DE 0,3% ATÉ JULHO



Em 2015, as vendas recuaram em 4,3%, segundo o IBGE. Ano passado, a queda foi de 6,2%. Já em 2017, o desempenho voltou a ser positivo, com expansão de 0,3% até julho. Grande parte do crescimento ficou concentrado no segundo trimestre, impulsionado pelos recursos das contas inativas do FGTS.



- Com o consumo reprimido, este Natal será melhor, mas não bom o suficiente para comemorar nem para ajudar quem está mal a se recuperar - diz Coelho.



A atualização do negócio é outro pilar fundamental.



- O pequeno varejo, em apuros, não se preparou ou perdeu o momento de consolidação. Isso resulta em perda de competitividade. A Camicado foi comprada pela Renner e ganhou fôlego ao ser integrada à estrutura do grupo - avalia Ana Paula Tozzi, da AGR Consultores.



A Leader pediu recuperação extrajudicial no fim de 2016, com dívida superior a R$ 1 bilhão. No processo, estão R$ 222,43 milhões em dívidas com fornecedores. A empresa passa por uma reestruturação, aprofundada após sua compra pela Legion, fundo de Fábio Carvalho, ex-Casa&Video, do BTG Pactual.



A Máquina de Vendas também amarga perdas após o processo de consolidação, com negociação de dívida junto a Itaú, Bradesco e Santander.



- O caminho é correto. Houve a consolidação de operações regionais, decidiram adotar marca única. Mas se a sinergia calculada para o negócio não é cumprida em até dois anos, a empresa começa a perder dinheiro. Agora, a Máquina corre atrás do tempo perdido - diz Ana Paula.





Tecnologia e eficiência financeira são a chave



Vendas multicanal, gestão de estoques e até mesmo concessão de crédito contribuem para receita maior



Estrutura de vendas multicanal, combinada a um robusto investimento em tecnologia, impulsiona o avanço das empresas no varejo. No caso do Magazine Luiza, o motor desse movimento está no foco em transformar a empresa em plataforma digital nos próximos anos. Está funcionando. No último trimestre - o melhor da história da companhia, quando teve lucro de R$ 72 milhões, seis vezes mais que de abril a junho de 2016 - o e-commerce cresceu 55%, alcançando o equivalente a 28% do faturamento.





- O comércio eletrônico vem em ritmo forte desde 2015, quando lançamos o aplicativo. Foi criado para ser de fácil utilização, capaz de personalizar a oferta ao consumidor, com frete grátis em diversos casos, e, recentemente, deixou de consumir dados - explica Eduardo Galanternick, diretor de e-commerce da varejista.



Este mês, a companhia anunciou que fará uma oferta pública de ações que pode gerar R$ 1,89 bilhão. Os recursos serão utilizados, entre outros objetivos, para a expansão digital.



Outras frentes são o marketplace, lançado no fim de 2016 e que já ampliou em mais de 20 vezes o estoque de produtos. Tem peso também a compra pelo site com retirada de produtos nas lojas físicas. E os vendedores usam uma ferramenta para recomendar produtos de acordo com o perfil do cliente.



- Essa personalização gera vendas. Faz diferença também a tecnologia usada na logística, a conexão entre as lojas e os centros de distribuição para entregar mais rápido e com menos custo. No início do ano, compramos a Integra, um hub de integração de marketplace, que acelerou as possibilidades de crescimento - conta Galanternick.



As lojas físicas - mais de 800 no país - mantêm sua expansão. A meta é abrir 60 em 2017. Os vendedores usam um aplicativo que permite finalizar a venda em cinco minutos, contra até 40 minutos anteriormente.



O efeito na Bolsa nos últimos 12 meses foi de valorização de 760% nos papéis da empresa, principalmente em razão da reorganização financeira da companhia, diz Mário Roberto Mariante, analista-chefe da Planner:



- Lá atrás, criaram a Luizalabs, que desenvolve ideias a serem implantadas na venda pelo site. Com isso, criaram um canal forte, abrindo sua loja virtual a outros varejistas, como Ri Happy.



Relatório do BTG Pactual alerta para uma perspectiva mais desafiadora para as grandes em marketplace no país em 2018, quando a Amazon começa a operar de forma mais ampla no segmento.



A Arezzo&Co é outra que avança pela eficiência nas vendas multicanal, com ajuda do variado mix de marcas e produtos. Com cinco marcas - Arezzo, Schutz, Anacapri, Alexandre Birman e Fiever - tem opções de calçados para mulheres de 12 a 60 anos, com preços médios de R$ 110 a R$ 960.



- A Arezzo é uma potência em desenvolvimento de produto e fabricação. Investiu em tecnologia lá atrás, segmentou a empresa, estava preparada para a crise. A eficiência financeira passa também pela gestão das marcas, o que tem a ver também com a capacidade de fechar lojas menos rentáveis - diz Ana Paula Tozzi, da AGR Consultores.



EXPANSÃO DE LOJAS



O grupo lança entre 15 e 18 coleções por ano, totalizando 11.500 modelos, com 90% da produção terceirizada. Tem 560 lojas e está em 2.188 multimarcas.



Nos últimos 12 meses, suas ações dobraram de valor. O lucro líquido subiu 36,9% no primeiro semestre, para R$ 61,44 milhões, ante janeiro a junho de 2016.



- Apesar de ter um tíquete mais alto, a empresa mostrou crescimento em todas as marcas - diz Mariante. - Tem presença também em exportação e lojas Schutz e Alexandre Birman no exterior.



Os números das Lojas Americanas aparecem como negativos, com prejuízo de R$ 70,2 milhões na primeira metade do ano. Desde o início da crise, porém, está no azul, cresceu em faturamento e expandiu em mais de 20% a rede de lojas.



- Seu segredo é fazer muito bem a gestão de categoria, adaptando o mix de lojas a cada momento do ano. É a única no Brasil que se aproveita de carnaval, volta às aulas, São João e Páscoa, com uma estratégia agressiva de abrir 800 lojas entre 2015 e 2019 - conta João Mamede, analista de varejo do Santander.



Embora o retorno de capital da empresa tenha caído de 40% para 20% em cinco anos, o patamar ainda é considerado elevado, destaca Gustavo Oliveira, do banco UBS. O desafio da companhia, segundo o analista, será enfrentar uma competição cada vez mais acirrada:



- Está havendo muita competição com drogarias e lojas de conveniência. Quem está investindo na companhia acredita que a piora em alguns indicadores foi por causa da crise. Tenho dúvidas quanto a isso.



No caso da Renner, segundo analistas, o salto em operação e faturamento - foram R$ 2,86 bilhões no primeiro semestre - se deveu a uma combinação de logística, inteligência financeira e estabilidade na gestão. Isso permitiu uma expansão agressiva, dizem especialistas, incluindo o início das atividades fora do país.



A varejista tem estratégia agressiva de oferta de cartões de marca própria, atua na concessão de empréstimos e faz gestão de sua carteira de crédito, que saltou 15% em um ano, para R$ 2,14 bilhões. Com isso, os resultados dos produtos financeiros subiram 28,4% este ano, para R$ 158 milhões.



- Foi o permitiu à Renner não recuar no crédito. Ela conhece o perfil de crédito de cada pessoa, pois pegou na mão da consumidora que tem 40 anos quando ela tinha 25. Eles fazem a gestão dessa informação muito bem - diz Mamede.










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