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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 16-07-2017 - 09:38 -   Notícia original Link para notícia
'Juro deveria cair mais rápido com desemprego alto'

Professor da FGV e do Instituto de Matemática Pura Aplicada receia que, para cumprir a meta de inflação mais baixa, em 2019 e 2020, país tenha de recorrer a uma dose alta demais de juros e que haja impacto negativo sobre o custo fiscal


"Vai ter eleição ano que vem. Não sei como o mercado vai se comportar frente às alternativas que vão surgir. Até agora está tudo calmo, mas os riscos são iminentes. Os mecanismos para controlar a inflação ficam difíceis. Aí a tendência é subir o juro demais."


Aloisio Araújo, da FGV, avalia que diante do desemprego elevado, país deveria acelerar redução da Taxa Selic O governo revisou para baixo a meta de inflação pela primeira vez em 14 anos. Passará a 4,25% em 2019 e 4% em 2020. Isso é factível?


MÁRCIA FOLETTOEmergentes. Para Aloisio Araújo, países como Chile e México têm meta de inflação de 3% porque "não têm um Estado tão perdulário"


Tenho preocupação. A sociedade brasileira gosta de ter uma inflação mais baixa, e isso é desejável. Agora, para ter inflação mais baixa, temos que ter impacto fiscal compatível. A meta atual, de 4,5%, tem sido difícil de ser atingida, porque temos uma situação ruim do ponto de vista fiscal. Por que, ao baixar a meta, aumenta-se o custo fiscal?


Os juros reais têm sido muito elevados no Brasil e isso significa custo fiscal. Os mecanismos para conduzir a meta monetária não são tão precisos. Numa situação como a que estamos vivendo, fica muito difícil. Por exemplo, você teve a Lava-Jato. O quanto isso prejudica a economia? Teve a situação do dólar, que subiu muito e depois caiu. Quais os efeitos disso sobre a inflação? Teve uma crise política, um impeachment, estão discutindo um segundo... Os modelos não conseguem captar isso. Sou favorável a adotar uma posição de que não sabemos tanto assim, principalmente nessas épocas difíceis.


A incerteza levaria o Banco Central a ser mais conservador e, assim, elevar mais os juros para alcançar uma meta de inflação mais baixa? No primeiro governo Fernando Henrique, a taxa de juro real teve que ser de mais de 20% para recuperar credibilidade. Depois teve o segundo governo, e a meta de inflação funcionou bem. Aí veio a possível eleição do Lula. O risco-país subiu demais, a inflação subiu. Foi bem administrada ali. Depois veio uma política mais tradicional e baixou a inflação muito rápido, mas a taxa de juro continuou alta. Nessas situações que fogem muito do tradicional, é difícil ter um mecanismo adequado para atingir a meta.


E estamos vivendo uma situação não tradicional...


Vai ter eleição ano que vem. Não sei como o mercado vai se comportar frente às alternativas que vão surgir. Até agora está tudo calmo, mas os riscos são iminentes. Os mecanismos para controlar (a inflação) ficam difíceis. Aí a tendência é você subir o juro demais. Tem risco de credibilidade se a meta for baixada, porque o mercado pode entender que ela não será atingida? Nem digo agora porque a situação está muito boa.


Está boa mesmo com essa crise política toda?


O que quero dizer é que os indicadores do mercado estão tranquilos. Mas os riscos potenciais estão aí. Se algum fator político interno ou mesmo fora do Brasil, um efeito (Donald) Trump ou uma disparada do dólar, o mercado vai ter mais desconfiança com a meta reduzida. Tenho medo disso. E, se subirmos o juro para controlar a inflação, o mercado pode entender que não vamos conseguir subir tanto, porque o contexto é outro. Aí a inflação pode subir mais do que subiria se tivesse uma meta mais alta.


Há países emergentes, como Colômbia e Chile, com metas de inflação menores que a nossa...


Chile, México e Colômbia têm meta de inflação de 3%. Mas esses países têm gastos mais controlados, não têm um Estado tão perdulário. Eles têm idade mínima de aposentadoria há muito tempo, têm investment grade (grau de investimento, chancela de que o país é um lugar seguro para investir), têm relação dívida/PIB bem mais baixa. Todos têm carga tributária mais amena. Num eventual choque, têm espaço para elevar tributos e ampliar a receita. O Brasil tem carga tributária muito alta. Somos campeões ou vicecampeões de juros reais do mundo sistematicamente. Tivemos investment grade por poucos anos. Houve um boom de commodities, que nos proporcionou uma situação fiscal mais conveniente, mas que depois foi revertida. Não foi resultado de um esforço fiscal de longo prazo. Numa situação dessa, fica difícil pensar em uma meta de inflação tão baixa.


O senhor acredita que há espaço para a taxa de juros cair mais rápido?


Acho que o BC, mais recentemente, teve um comportamento assimétrico no seguinte sentido: como você não sabe direito o que vai acontecer, com Lava-Jato, dólar, joga de forma mais cautelosa. Mas ele já teve informação suficiente. Juro deveria cair mais rápido numa situação de desemprego tão alto. Não acho que isso seja razoável.


Como o senhor avalia o discurso de elevar os impostos para reduzir o décit fiscal?


Estamos no limite. Sufocaria muito a economia, o setor privado. Houve uma queda na carga tributária mais recentemente, em função de mudanças estruturais na economia. A indústria perdeu espaço, vieram mais serviços. Como elevar as receitas então? Por exemplo, poderia haver novas devoluções de recursos do BNDES (ano passado o banco antecipou o pagamento de R$ 119 bilhões ao Tesouro, reduzindo a dívida pública), desmobilização de ativos de empresas públicas. Não dá para reonerar agora. Quando melhorar o consumo, a arrecadação vai aumentar e terá uma sobra fiscal. Seria uma tentação para acabar com a PEC do teto (que congelou os gastos do governo por vinte anos).


A reforma trabalhista foi aprovada no Senado. Ela deve desafogar o Judiciário, mas qual será o efeito para o trabalhador?



Esse sistema foi criado numa época em que a maioria dos trabalhadores mal sabia assinar o nome. Hoje, a grande maioria tem segundo grau. A flexibilização do mercado de trabalho é boa. Agora, existe assimetria (entre patrão e empregado) porque você tirou o imposto sindical (dos trabalhadores), mas não tirou todo imposto da classe patronal, porque tem um pedaço da administração do Sistema S que vai para essas federações, que são muito atuantes. Mas a reforma da Previdência é a mais importante de todas. A PEC do teto perde o sentido sem ela. Se o governo não tiver força para passá-la de forma integral, que passe um pedaço. Depois fazemos outra adiante.


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