Mais de 59 milhões de pessoas estão inadimplentes em todo o Brasil, segundo dados da Serasa de fevereiro deste ano. Com essa marca, o comércio e os prestadores de serviço estão fazendo o que podem para minimizar prejuízos. "Desconto de 40% no valor da próxima fatura se você pagar a deste mês em dia", foi a promessa que a cozinheira Midiã de Oliveira, 32, recebeu da Net, empresa que oferece TV por assinatura, acesso à internet e telefonia fixa. "Eles me ligaram oferecendo esse desconto. Não acreditei, mas depois, com o protocolo em mãos, fui convencida", disse.

Esses benefícios para o cliente pagar os atrasados são positivos, e é legítimo, por parte das empresas, dar esses descontos. Mas e quem está em dia com as contas? Segundo o coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa, o cliente que está em dia também precisa ser beneficiado.

"Eles devem ter tratamento diferenciado dos inadimplentes. Isso (dar desconto para quem atrasa) é polêmico, mas é legal. O que não pode é um inadimplente ter facilidades e benefícios, e outro, que também tem fatura em aberto, não ter os mesmos descontos. Assim, ele não teria incentivo para ser adimplente", explica. Barbosa diz que o tratamento deve ser igual.

Segundo o especialista, as empresas podem dar descontos e facilitar o pagamento para o cliente que está devendo - mas aquele que é adimplente pode exigir benefícios como forma de incentivo para que continue pagando em dia. O que não pode, segundo Barbosa, é a empresa tratar de forma diferente os clientes que estão na mesma situação.

Uma vendedora, que não quis ter o nome divulgado, soube do desconto da Net por uma amiga e procurou a empresa. "Fui informada pela atendente que essa ação não existe", diz a cliente, que está com as faturas em dia. Procurada pela reportagem, a Net disse, por meio de assessoria, que "cada cliente tem suas especificidades".

A fatura da Net de Midiã de Oliveira gira em torno de R$ 380, e, segundo ela, as contas dos meses anteriores estavam pagas. "Vou ficar atenta, já que me prometeram um desconto uma vez e não cumpriram", conta.

O jornalista Claudinei Moreira, 47, também recebeu a proposta de desconto da mesma empresa. "Eles me ofereceram 10% de desconto nas próximas três contas se eu pagasse a do mês de maio em dia. Além disso, a operadora de telemarketing me disse que, se eu colocasse no débito automático, eu teria mais 10% de desconto", explica.

A diarista Joana Acad, 45, foi informada pela operadora Oi de que teria abatimentos nas três faturas seguintes. "Eles me ligaram e disseram que, se eu pagasse em dia a fatura do mês de maio, as três próximas viriam com 15% de desconto", disse. Joana, que está com a fatura de abril em aberto, vai aproveitar a oferta. "No passado, isso era impossível. Já pedi descontos, anos atrás, e nunca consegui. Hoje, eles me ligam com a proposta. A crise também gera oportunidades", comenta. Procurada, a Oi não se pronunciou.

Barganha maior

Vale tudo para aumentar a receita

Em tempos de venda escassa e pagamentos atrasados, o consumidor está mesmo empoderado. O geógrafo Ewerton de Oliveira, 32, foi comprar uma batedeira elétrica no site do Extra e, ao desistir da compra, recebeu na tela, na hora, uma oferta do mesmo produto com desconto. "Eu havia desistido pelo valor mesmo. Quando fui fechar a janela, apareceu uma mensagem: "Não vá embora ainda. Quanto você acharia justo pagar por esse produto?". A partir daí, foi um leilão, eu fui colocando o valor que podia pagar, até chegarmos a um acordo. De R$ 400, a batedeira saiu por R$ 300", relata.

Para a economista da Câmara de Dirigentes LojistasCâmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDLCDL-BH) Ana Paula Bastos, as empresas preferem receber do cliente o que eles podem pagar a ficar no prejuízo. "Os empresários estão de olho na liberação do FGTS inativo, por isso eles dão desconto para que o devedor possa usar o dinheiro para quitar as dívidas", disse. É o caso do vendedor Leandro Sena, 33, que está devendo uma fatura da Net do mês de abril. "Eles falaram que, se eu pagar até a semana que vem, terei 15% de desconto. Vou tentar negociar ainda mais", disse.

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