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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 12-06-2016 - 11:40 -   Notícia original Link para notícia
Vale-tudo no varejo de moda

Com vendas em baixa, lojas seguram preços e apostam em estratégias para não fechar


A perda da renda e o medo do desemprego têm derrubado as vendas do comércio, mas itens como roupas e calçados estão sendo especialmente afetados, por não serem de primeira necessidade. Neste cenário, a inflação do vestuário tem sido sistematicamente menor que a taxa geral no país. Em 2015, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 10,67%, mas os preços de vestuário e calçados só avançaram 4,46%.



FERNANDO LEMOSDívidas. Dono de uma loja de roupas em Copacabana desde anos 1960, Seu Elias mostra os boletos de IPTU e condomínio atrasados, além dos empréstimos de bancos. Até o salário das seis funcionárias está sendo pago fora do prazo


O movimento dos preços reflete parte da estratégia dos varejistas para enfrentar uma crise que já completa 16 meses de quedas seguidas nas vendas de roupas e calçados. O tombo foi de 12,9% no primeiro trimestre do ano, o pior desempenho desde 2000. Liquidações passaram a ser quase permanentes, e o comércio corta margem de lucro para conseguir vender e diminuir as perdas. A tática de sobrevivência também inclui renegociação com os fornecedores, estoques menores, parcelamentos mais longos para o consumidor e demissão de funcionários.


Ao percorrer ruas de comércio de bairros como Copacabana, Ipanema e Madureira, são muitas vitrines vazias, com cartazes de vendese ou aluga-se. Quem está com as portas abertas, muitas vezes, tem dívidas com os bancos e atrasa o pagamento de impostos e de salários. Até mesmo um comportamento que era pouco tolerado pelos comerciantes começa a virar rotina: vendedores sentados durante o horário de trabalho.


- O varejo não tem espaço para repassar preços. Desde 2014, temos uma diferença grande entre a inflação geral e a inflação do vestuário. O varejo acaba apelando para liquidação o ano todo - afirma o economista sênior da Confederação Nacional do Comércio (CNC) Fabio Bentes.


Foi justamente essa a estratégia adotada na ACR Fashion, em Madureira. Segundo a gerente Adilene da Silva, todas as peças na loja chegaram há, no máximo, um mês. E já foram para as araras com preços promocionais.


- Essa é a coleção nova. As calças que saíam a R$ 65, por exemplo, estão custando R$ 50. Quem tem preço mais alto não vende - diz Adilene.


QUASE 1.500 LOJAS FECHADAS NO ESTADO


Ao recorrer a essas alternativas, os empresários tentam evitar o mesmo destino de 17.400 lojas de vestuário e calçados que fecharam as portas em todo o país no ano passado, segundo levantamento da CNC. Ao todo, o comércio nacional perdeu 95.400 estabelecimentos. Apenas no Rio de Janeiro, foram 7.430 lojas fechadas, das quais 1.428 de vestuário e calçados.


Os mais vulneráveis nesse momento difícil do setor são os pequenos lojistas. Proprietário da Aletex Magazin, Ali Kalil Charif ainda lembra dos tempos áureos da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, nos anos 1960, quando comprou a loja. Mais conhecido como Seu Elias, o sírio naturalizado brasileiro hoje acumula prejuízo, está com o pagamento do IPTU atrasado e não tem conseguido pagar em dia o salário das funcionárias.


- Tenho seis vendedoras, mas não há movimento nem para duas. Só não mando embora porque estão comigo há muitos anos. Se eu pagasse aluguel, já teria quebrado. Se alguém quiser comprar, não penso duas vezes - desabafa.


Durante quase uma hora, na manhã da última terça-feira, não entrou uma única pessoa na loja. No fim da tarde, ele costuma liberar parte da equipe mais cedo, diante do pouco movimento:


- O brasileiro é o povo que mais gasta quando tem dinheiro. Não há mais consumo.


Com vendas fracas, não há grandes reposições de estoque. Nos últimos seis meses, a loja só compra números que já acabaram. Os clientes quase não compram em dinheiro e, mesmo no cartão de crédito, os valores são parcelados.


Segundo Christian Travassos, economista da Fecomércio-RJ, a antecipação de promoções tem sido a estratégia da maioria dos comerciantes. Em pesquisa recente, 74% dos lojistas do setor de moda afirmaram que têm feito promoções antecipadas. Em outra sondagem, 60% disseram que o espaço entre o preço cheio de produtos e o valor de liquidação está cada vez mais curto.


- As promoções têm ditado o ritmo. O que orienta a tomada de decisão do consumidor é cada vez mais o preço do produto - analisa Travassos.


Bentes, da CNC, diz que são ações como essa que jogam a inflação do vestuário para baixo, porque o preço médio fica menor. Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe do ABC Brasil, destaca que o cenário está relacionado à recessão:


- Não é coincidência termos uma desaceleração forte da economia nos últimos dois anos e a menor alta nos preços do varejo.


Por isso, nos 12 meses encerrados em maio, a alta do IPCA foi de 9,32%, enquanto a dos preços de vestuário foi de 5,72%. Os preços médios do short infantil e da sandália feminina estão caindo 1,97% e 2,41%, respectivamente, este ano.


SEM ESPAÇO PARA REPASSAR ALTA DE CUSTO



A maior parte do setor é composta por pequenos comerciantes, mas, segundo Haroldo Monteiro, professor do Ibmec, as grandes redes também são afetadas. Nas empresas de capital aberto, um dos sintomas é a redução na margem de lucro. Das cinco maiores companhias do segmento com ações negociadas na Bolsa, Riachuelo, Marisa, Hering e Restoque encolheram suas margens na passagem de 2014 a 2015, segundo os balanços. A Renner teve aumento. Os piores desempenhos ficaram com a Restoque, cuja margem bruta recuou de 62,7% para 58,1%, e na Hering, onde o tombo foi de 43,7% para 39,5%. Procuradas, as empresas não comentaram.



SEM VENDER, SETOR FECHA 621 LOJAS NO RIO


Comerciantes amargam custo alto e movimento fraco


No lugar de roupas e calçados, vitrines estão repletas de placas de vende-se ou aluga-se. O elevado custo dos aluguéis contribuiu para o início desse movimento no Rio, mas a tendência foi intensificada com a crise na economia e o aumento do desemprego, que fizeram o consumo despencar. Com isso, 621 lojas do setor de vestuário foram fechadas na cidade em 2015, frente a 2.939 no varejo.


CUSTÓDIO COIMBRASobra de espaço. Galeria Forum Ipanema, uma das mais tradicionais do Rio, está com 12 de suas 60 lojas vazias, inclusive uma que fica bem na entrada


Christian Travassos, economista da Fecomércio-RJ, ressalta que o setor é mais um a sofrer os efeitos da crise:


- A situação da economia fala por si. São dois anos de recessão.


Ícone do comércio de grifes, a galeria Forum Ipanema está com 12 de suas 60 lojas com vitrines vazias, inclusive uma na entrada, em plena Visconde de Pirajá.


- A galeria é de uma época em que não tínhamos tantos shoppings. Foram criados novos espaços, e o mercado superaquecido permitia isso. Só que as vendas do varejo hoje são metade do que eram há cinco anos - afirma o presidente da Associação dos Lojistas da galeria, Mario Schaladowsky.


No Top Center 550, na mesma rua, 20 lojas estão vazias.


- As lojas não estão conseguindo vender e ainda enfrentam inadimplência e alto custo - diz Ernesto Simões, administrador do condomínio, ressaltando que a realidade é de todo o comércio.


Na calçada em frente, o Ipanema 2000 tem três lojas fechadas, mas o número chegou a sete no início do ano. Gerente do condomínio, Marcelo Xavier explica que as lojas da sobreloja são normalmente menos procuradas. Mas o tempo em que permanecem fechadas aumentou de dois para até cinco meses:


- As pessoas estão apáticas, não querem gastar nem sair. (Lucianne Carneiro e Marcello Corrêa)


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