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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 25-09-2015 - 09:41 -   Notícia original Link para notícia
BC mostra seu arsenal

Tombini ameaça usar reservas e descarta subir juros. Dólar cai para R$ 3,992



Depois de cinco altas consecutivas, o dólar fechou ontem em forte baixa, de 3,69%, a R$ 3,992. Pela manhã, a moeda americana bateu novo recorde e chegou a R$ 4,249, levando o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, a declarar que poderia usar as reservas cambiais do país para conter a volatilidade do mercado. Ele também afirmou que a taxa de juros do país ficará estável. Com isso, os investidores diminuíram suas apostas contra o real, e o dólar caiu com força. O Brasil tem o sexto maior volume de reservas cambiais do mundo, com US$ 370 bilhões. Analistas divergem se a forte pressão sobre a moeda brasileira nos últimos dias foi resultado de ação especulativa ou se é mais um reflexo do agravamento da crise política e econômica. - RIO, BRASÍLIA E SÃO PAULO- Depois de cinco altas consecutivas, em meio a uma queda de braço entre o mercado e o Banco Central ( BC), o câmbio finalmente deu uma trégua ontem. O dólar comercial, após saltar 2,5% pela manhã, chegando aos R$ 4,249, encerrou em forte baixa: 3,69%, aos R$ 3,992 - a maior queda percentual para um dia desde 10 de maio de 2010. Entre a máxima e o fechamento, o tombo foi de 6%. A moeda perdeu força depois de o presidente do BC, Alexandre Tombini, afirmar que as reservas internacionais "podem e devem" ser usadas para atuação no câmbio. As reservas internacionais, hoje, chegam a US$ 370,8 bilhões. Tombini ainda reforçou que não pretende subir juros, o que, segundo analistas, afastou as especulações dos investidores de que a autarquia iria recorrer a isso.



Tombini apareceu de surpresa na entrevista coletiva de divulgação do relatório trimestral de inflação do BC. Além do impacto de suas declarações no câmbio, BC e Tesouro agiram de forma coordenada ontem, com o acompanhamento do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para conter a escalada do dólar e dos juros no mercado futuro.



- As reservas são um seguro que pode e deve ser utilizado. Todos os instrumentos estão à disposição do BC e estão num raio de ação num período à frente. Não vejo o Banco Central limitado a um instrumento - disse Tombini, sem antecipar, porém, a estratégia de atuação no câmbio. - Como se dará, quando e se vamos usar este ou aquele instrumento, é algo que veremos no acompanhamento diário do mercado de câmbio. Eu não gostaria de detalhar as estratégias no momento.



O dólar reagiu às declarações das autoridades. Às 9h, abriu já em forte alta, atingindo seu pico às 10h30m. Entrou, então, em trajetória de queda, acentuada pelo início do discurso de Tombini, às 11h. Por volta das 11h10m, o dólar havia praticamente retornado ao mesmo patamar de fechamento do dia anterior.



Mas, enquanto o presidente do BC falava, começou a recuperar fôlego, voltando à casa dos R$ 4,20 por volta das 12h30m. Neste momento, surgiu a notícia de que o presidente do Senado, Renan Calheiros, havia marcado para o próximo dia 30 a conclusão das votações dos vetos presidenciais a medidas que ameaçam o ajuste fiscal. A moeda americana retomou a trajetória de queda.



' O MERCADO ESTÁ TESTANDO O BC'



Na entrevista surpresa, Tombini lembrou que as questões de câmbio sofrem impacto de "variáveis não econômicas", ou seja, da crise política. Ele reforçou ainda que a estratégia do BC é manter a Taxa Selic, hoje em 14,25% ao ano, inalterada por período prolongado.



- As expectativas podem estar contaminadas pelo ambiente de mais volatilidade. Dito de outra forma, as taxas de juros do mercado não servirão como guia para a política monetária nos próximos meses - afirmou, em referência às taxas de juros futuros, que dispararam nos últimos dias.



Ele disse ainda acreditar que o esforço para aprovar o ajuste é capaz de evitar um novo rebaixamento da nota de crédito soberano do Brasil.



Para Jaime Ferreira, superintendente de câmbio da corretora Intercam, o mercado sentia falta de uma declaração mais direta do BC sobre o câmbio, e a fala de Tombini "deu um certo alívio".



Nos últimos dias, os analistas atribuíram a alta do dólar ao temor de um novo rebaixamento e à crise política, que emperra o ajuste fiscal.



- Ataque especulativo é um termo muito forte ainda, mas é como se fosse isso. O mercado está, de certa forma, testando o BC - afirmou Ricardo Zeno, sócio- diretor da AZ Investimentos. - A desvalorização do real tem fundamentos, mas não nesses níveis.



Ontem, o BC conseguiu vender 20 mil contratos de swap cambial ( espécie de venda de moeda no futuro), equivalentes a US$ 1 bilhão. Na véspera, de 20 mil, só houve demanda para 4,4 mil. O BC também fez a rolagem de 9.450 contratos que venceriam em outubro. No fim do dia, anunciou que hoje serão oferecidos mais 20 mil contratos.



Luiz Roberto Monteiro, operador da corretora Renascença, no entanto, ressaltou que o que mais pesou no mercado foi o fato de Tombini afirmar que não subiria os juros.



- Muita gente especulou, nos últimos dias, que o BC iria parar de intervir no câmbio por meio de swaps e leilões de linha ( venda de reservas com compromisso de recompra) e partir para uma alta de juros. Quando ele afirma que não vai recorrer a isso e reforça que tem mecanismos para segurar o câmbio, faz uma demonstração de força - explicou Monteiro, que não considera uma boa ideia vender reservas. - A interpretação dos investidores seria a de que o BC perdeu as rédeas. O mercado iria, logo, pedir mais.



LEVY REFORÇA DISCURSO DE TOMBINI



Paralelamente à entrevista de Tombini, o Tesouro anunciou que fará uma série de leilões de compra e venda de títulos públicos entre hoje e 2 de outubro. Isso teve efeito direto no mercado de juros futuros. Os contratos futuros de Depósito Interfinanceiro ( DI) com vencimento em janeiro de 2021, que haviam atingido 17,55% pela manhã, fecharam em 16%, contra 16,80% da quarta- feira



À noite, em evento em São Paulo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, reforçou o discurso de Tombini e disse que as reservas podem ser usadas e que o Brasil tem ainda outros mecanismos para lidar com a volatilidade.



- Eu acho que é uma possibilidade, mas quem decide isso evidentemente é o Banco Central. Mas nós temos mecanismos que têm se mostrado eficazes neste momento de maior incerteza doméstica e até global.





Para analistas, nenhuma ação isolada do BC conseguirá conter volatilidade, na página 20      


BC, sozinho, não resolve                                                                 


Para analistas, só ajuste fiscal e fim da crise política podem conter o dólar


"Elevar a Selic sem ação fiscal aumenta a chance de novo rebaixamento. E o dólar não cederia" Luciano Rostagno Economista do Banco Mizuho


Nenhuma ação isolada do Banco Central ( BC), como a venda de reservas ou um choque de juros, terá força para conter a volatilidade do mercado, que está estressado com a falta de força política do governo e de um programa fiscal com maior credibilidade, dizem analistas. Sem a sinalização de um ajuste fiscal mais forte pela via do corte de gastos e de uma solução para o impasse político entre o Executivo e o Congresso, o nervosismo no mercado financeiro deve continuar, já que o BC sozinho não tem como determinar a cotação do dólar.


- O governo não quer cortar gastos, e a sociedade não deseja aumento de impostos. Enquanto essa equação, que passa pelo campo político, não for solucionada, a moeda americana vai continuar pressionada a curto prazo, e não é possível prever qual é o teto para a divisa - explica o sócio da consultoria Opus e professor da PUC/ RJ José Márcio Camargo.


Ontem, o dólar e os juros futuros recuaram após a fala do presidente do BC, Alexandre Tombini, mas, segundo analistas, trata- se de um movimento temporário. A ameaça do BC de vender reservas para estabilizar o câmbio assustou os especuladores, que continuam apostando na alta da moeda americana no mercado futuro. Havia uma espécie de consenso no mercado de que as reservas não seriam utilizadas para conter a volatilidade do dólar, mas isso acabou depois das declarações de Tombini.


- Não há fuga de divisas do país. Se o BC entra no mercado vendendo dólares no mercado à vista derruba a cotação, e os especuladores que apostavam na alta da moeda americana tomam prejuízo. A fala de Tombini deu essa sinalização aos especuladores - diz o economista Silvio Campos Neto, da consultoria Tendências.


Mas o mercado deve seguir testando a disposição do BC de aumentar sua intervenção no mercado de câmbio para evitar uma explosão do dólar, acreditam os especialistas. Assim, o próximo movimento da autoridade monetária seria vender parte das reservas. Alguns economistas consideram o atual nível das reservas internacionais do país, de US$ 370 bilhões, muito elevado. Acham que elas rendem muito pouco ao governo, que tem custo elevado para emitir dívida.


- O BC não pode ficar só ameaçando. Nesse caso, deveria entrar vendendo um pouco das reservas para mostrar que as declarações de Tombini são firmes - afirma Maurício Pedrosa, sócio da Queluz Asset Management.


O efeito colateral de vender reservas no atual cenário de incertezas políticas e fiscais, segundo Camargo, da Opus, é uma possível interpretação pelo mercado de que o BC usou "a última bala da agulha". Isso porque Tombini afirmou que não vai aumentar juros e que a Selic deverá permanecer no atual patamar, de 14,25% ao ano, por um período prolongado.


- O presidente do BC não poderia ter prometido que não elevará juros. Se houver um overshooting ( disparada) do dólar, com fuga de investidores, o BC poderá ser obrigado a subir a Selic como forma de atrair capital e evitar uma explosão da moeda americana. O problema é que um aumento de juros vai aprofundar a recessão e elevar o custo da dívida pública - analisa Camargo.


Atualmente, o país gasta 8% do Produto Interno Bruto ( PIB) com o pagamento de juros, o que corresponde a um desembolso anual de R$ 500 bilhões. A cada ponto percentual de aumento na Selic, o custo da dívida sobe em R$ 14 bilhões, em um período de 12 meses, segundo um estudo da Fundação Getulio Vargas ( FGV).


Ao sinalizar que pretende manter os juros em 14,25% por um período prolongado, o presidente do BC mostrou ao mercado que está propenso a postergar a convergência para a meta de inflação ( estabelecida em 4,5%) para 2017, evitando elevar o custo com a dívida pública.


- Um choque de juros só deve ser usado quando há uma fuga de capitais, e este não é o cenário atual - diz Cardoso, da Queluz.


O estrategista- chefe no Brasil do banco japonês Mizuho, Luciano Rostagno, acredita que só uma ação coordenada entre o BC e o Planalto, com alta de juros e corte de gastos, mostrando um objetivo comum, poderia reduzir a volatilidade do câmbio neste momento. Ele avalia que o mercado está sem um teto para o dólar e, com a falta de uma solução para a questão fiscal, não "há luz no fim do túnel":


- Elevar a Selic sem nenhuma ação de política fiscal aumenta a chance de um novo rebaixamento do rating do país. E o dólar não cederia - afirma Rostagno.      


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