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O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 15-08-2015 - 11:25 -   Notícia original Link para notícia
O outro lado da moeda

Alta do dólar melhora balança comercial. Retração econômica atenua efeito na inflação


"Não há outra coisa a se fazer. O mercado doméstico derrete dia após dia" Fábio Silveira Sócio da GO Associados


A desvalorização do real reduziu importações e já leva empresas a retomarem planos de exportação. A Panasonic venderá refrigeradores fabricados em Minas para países da América Latina. O novo patamar do dólar, próximo a R$ 3,50, o dobro do que há pouco mais de três anos, não traz apenas nervosismo ao mercado financeiro. O outro lado do câmbio é ajudar no ajuste da economia brasileira. E os primeiros efeitos já começam a aparecer. O saldo comercial do país saiu do vermelho. Ano passado, até a primeira semana de agosto, as receitas das vendas externas eram US$ 783 milhões menores do que as despesas com a compra de importados. Em 2015, este resultado está positivo em US$ 5,334 bilhões, graças principalmente a um freio nas compras do exterior. E, agora, muitas empresas já começam a retomar seus planos de exportar.



DIVULGAÇAO PANASONIC Mercado externo. Linha de montagem de geladeiras da fábrica da Panasonic, em Minas, onde 15% da produção está sendo exportada


O impacto do câmbio na inflação, que poderia ser um efeito maléfico da alta do dólar, não deve ser tão grande, dizem os analistas, devido à retração da economia.


- Os alimentos estão subindo e puxando a inflação no varejo, mas somente nos alimentos o repasse do dólar é imediato. Se formos olhar os produtos dolarizados, eles estão sendo vendidos até com desconto. Se o varejo quiser repassar esse aumento do dólar, não vai conseguir. Já está repassando o custo de energia elétrica, está muito estocado, dando descontos enormes. Vai ser o ano das liquidações - afirma o chefe da Divisão Econômica da CNC, Carlos Thadeu de Freitas.


GELADEIRAS DE MINAS PARA O EXTERIOR


Segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC), a inflação do varejo está em 6,5% em 12 meses, enquanto, na média, os preços estão subindo 9,5% no mesmo período. Nos bens duráveis, que têm a maioria dos componentes importada, a inflação é de 2,2%.


A recessão também ajuda no ajuste das contas externas. A reação das exportações ainda é tímida. Porém, com o dólar mais alto e o consumo em queda, as compras do exterior caíram. Economistas destacam, porém, que os primeiros sinais de recuperação das exportações começam a surgir. A economista Zeina Latif, da XP Investimentos, destaca que a parcela da produção da indústria de transformação exportada subiu: saiu de 17,5% em 2010, quando o dólar, descontado a inflação, estava em seu patamar mais baixo, para 18,3% em 2014, e para 19,2% no segundo trimestre deste ano, de acordo com dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI).


Até o freio no consumo interno é um estímulo à busca de mercados no exterior. Nessa onda, a Panasonic está desviando 15% da produção de linha branca para Colômbia, Peru, Equador e Panamá. A capacidade ociosa da fábrica em Extremo, Minas Gerais, permitiu que a empresa possa exportar lavadoras e refrigeradores, e o dólar tornou os preços dos produtos mais mais competitivos lá fora.


- Mas a nossa prioridade é o mercado local - afirma Sergei Epof, gerente de linha branca da Panasonic.


Para Fábio Silveira, sócio da GO Associados, essa é a alternativa num ano em que ele prevê recessão de 2,7%, a maior queda desde 1990, quando Fernando Collor confiscou o dinheiro da poupança e PIB retrocedeu 4%.


- Não há outra coisa a se fazer. O mercado doméstico derrete dia após dia - diz Silveira.


Para Zeina, as válvulas da economia estão funcionando, com a alta do dólar dando algum fôlego às exportações:


- A indústria pode ser beneficiada com a substituição das importações. A reação ainda é muito tímida e não deve ser suficiente para termos um PIB positivo no quarto trimestre,mas é uma válvula que está funcionando.


Graças ao ajuste que o dólar está provocando nas contas externas, o Brasil deixou de ser considerado, esta semana, como um dos "cinco frágeis", lista cunhada pelo banco JP Morgan para se referir aos países emergentes mais vulneráveis às turbulências internacionais. Agora, segundo o JP Morgan, Colômbia, México, Indonésia, África do Sul e Turquia integram o grupo.


Quem não escapa do efeito nocivo da alta dos dólar são as contas públicas. A atuação do Banco Central em defesa do real também tem reflexos. Os contratos de venda de dólar no mercado futuro - swaps cambiais - somam mais de US$ 110 bilhões. Em 2013, não chegavam a US$ 10 bilhões. Mesmo com reservas superiores a US$ 370 bilhões, o custo de rolar esses contratos contamina a dívida pública. Exatamente o indicador que as agências de risco mais observam na hora de avaliar a capacidade de pagamento do país.


- Esses contratos deixam as contas públicas vulneráveis às oscilações cambiais - explica o economista José Júlio Senna, da Fundação Getulio Vargas (FGV). Thadeu de Freitas complementa: - É uma sangria diária. O economista da CNC também chama a atenção para outro flanco aberto que a valorização do dólar afeta, a parcela da dívida pública nas mãos de não residentes:


- Para alongar a dívida, o governo estimulou a venda de títulos públicos para não residentes. O objetivo na época era alongar a dívida, mas agora temos 22% da dívida na mão deles. A qualquer sinal de crise, saem do país na hora, o que pressiona mais ainda o câmbio.


SÓ O MERCADO EXTERNO SALVA


Para Silveira, só o mercado externo salva o Brasil neste momento:


- O problema é que um processo demorado. Não é da noite para o dia que vamos fortalecer o mercado externo. O crescimento da China está menor, a recuperação dos Estados Unidos ainda não é consistente. Mas é o tem para hoje: tentar estimular o setor externo, para daqui a um ano e meio ver os efeitos multiplicadores no resto da economia.


A GO Associados já prevê um recuo da importação que vai garantir um saldo comercial de US$ 10 bilhões este ano, depois de o país ter fechado 2014 com déficit de US$ 3,9 bilhões. Mas ainda não será suficiente para reduzir o déficit nas nossas contas com o resto do mundo como parcela do PIB. Como a economia deve recuar entre 2%e 3%, segundo a previsão dos analistas, o déficit nas transações correntes ganha espaço e deve passar 3,9% do PIB para 4,4%, apesar de em dólares baixar de US$ 91 bilhões para US$ 81 bilhões.


José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, vê crescimento na exportação de material de construção, madeira, granito, calçados e móveis. No caso de produtos finais, ele só vê espaço de crescimento nas vendas para os Estados Unidos que, tradicionalmente, compram produtos manufaturados brasileiros e, hoje, respondem por apenas 10% das exportações.      


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