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Valor Online ( Finanças ) - SP - Brasil - 04-05-2015 - 10:08 -   Notícia original Link para notícia
'Copom encerrou atual ciclo de aperto', diz Megale

Por José de Castro | De São PauloMegale, do Itaú: para economista, Selic ficará estável em 13,25% pelo resto do ano, meta de 2016 não será cumprida e BC balizará expectativas para 2017


Na contramão do mercado, que na quinta-feira antes do feriado passou a projetar um ajuste entre 0,25 e 0,50 ponto percentual para a Selic em junho, o economista do Itaú Unibanco Caio Megale acredita que o Comitê de Política Monetária (Copom) fez, na semana passada, o último aumento de juro do atual ciclo de aperto monetário. Para ele, o ambiente contracionista, em parte pelo ajuste fiscal em curso, e a esperada desaceleração na inflação vão permitir que o BC interrompa a sua rodada de correções. Isso não quer dizer, porém, que ele acredite que a autoridade conseguirá levar a inflação para o centro da meta de 4,5% no ano que vem.


De qualquer forma, a publicação da ata da reunião do Copom na quinta-feira, com as diretrizes que moveram o colegiado a subir a Selic em 0,50 ponto percentual, para 13,25% ao ano na semana passada, deve servir de guia para os agentes financeiros.


Megale projeta que o IPCA de abril diminua para 0,70%, o Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre caia 1%, os salários subam menos que a inflação no período, e o desemprego continue crescendo.


"Todos esses fatores nos levam a pensar que a Selic deve ficar estável em 13,25% pelo resto do ano", afirma.


A seguir, os principais trechos da entrevista:


Valor: O BC evitou sinalizar o fim da alta de juros por entender que a política fiscal ainda precisa ser mais contracionista?


Caio Megale: Por enquanto não vejo dessa forma. Acho que as decisões de política econômica estão coordenadas neste começo do ano na linha do aperto fiscal. As sinalizações que o BC vem dando são de que o aperto está em linha com os demais ajustes. Não me parece que ele aumenta a taxa de juros porque o fiscal não vai ser contracionista. Com uma atividade que deve recuar 1,5% neste ano e corte de gastos, claramente a política fiscal está caminhando no sentido contracionista.


Valor: O BC sobe mais os juros?


Megale: Acreditamos que esse foi o último aumento da Selic do atual ciclo. Entendo que o BC não tem razão alguma para definir a ação de junho. Ele vai esperar os dados que sairão até lá. E, na nossa visão, esses dados vão convencer o Banco Central a não subir mais a Selic. O IPCA de abril deve desacelerar para 0,70%, o PIB no segundo trimestre deve cair 1%, os salários vão subir menos que a inflação, e o desemprego deve continuar crescendo. Todos esses fatores nos levam a pensar que a Selic deve ficar estável em 13,25% pelo resto do ano.   



Valor: Dado o ajuste que se viu na curva de DI [na sexta], o fim da alta de juros não causaria ruído em torno da comunicação do BC, gerando mais aumento nos prêmios de risco?


Megale: O mercado só reclamaria da comunicação do BC se ele dissesse uma coisa e os dados mostrassem outra. O BC não se comprometeu com nada [na quarta-feira passada], e esse é justamente o objetivo dele, para ter tempo para avaliar melhor os cenários. O mercado entende que as decisões de juro vão ser baseadas nos indicadores econômicos. Isso não quer dizer, porém, que achamos que com essa postura o BC vai conseguir levar a inflação para 4,5% no ano que vem. O IPCA deste ano vai ser muito alto, prevemos 8,2% com viés de alta. Mas ainda que não vá para a meta, deve haver uma desinflação importante, para 5,5% em 2016.


Valor: Por que o BC não consegue ancorar as expectativas?


Megale: Ele não consegue ancorar para 2016, mas sim para 2017. A inércia inflacionária pesa muito e dificulta essa ancoragem da inflação já para 2016. Mas, como disse, o que o mercado espera pelo menos é que haja uma desinflação considerável no ano que vem.


Valor: Ainda é possível pensar em corte de juros em 2015?


Megale: A possibilidade do corte existe, mas achamos que o que vai nortear as decisões do BC é a persistência. Não só do BC, mas da política econômica como um todo. O BC deve deixar a Selic em 13,25% por algum tempo para promover o rebalanceamento da economia. No nosso cenário, ele só reduz o juro no primeiro trimestre de 2016. Não está descartado um corte ainda neste ano, mas acho que os argumentos mais fortes são para redução apenas no próximo.


Valor: Cortando o juro neste ano ou no próximo, provavelmente estaremos na contramão do Federal Reserve, que deve começar a apertar a política monetária em breve. Qual o custo disso para a eficácia da política monetária?


Megale: O risco de alta de juro nos Estados Unidos é mais um motivo para o BC ser bastante cauteloso ao avaliar o momento de cortar o juro. Mas esperamos que o Fed seja gradual nesse movimento, sem grandes impactos para os ativos locais. Por isso, achamos que as condições internas de inflação ainda vão ter um peso bastante importante nas ações de política monetária.


Valor: A recente elevação nas taxas de juros de títulos soberanos dos EUA e de alguns países europeus, em especial Alemanha, combinada com a recuperação das commodities pode impor mais pressão inflacionária ao Brasil e limitar o espaço para o BC parar a alta de juros?


Megale: Acredito que não. O câmbio serve justamente para amortecer esses impactos. A recuperação das commodities ajudou no alívio do câmbio, o que ajuda a reduzir ou anular a importação da inflação externa. Além disso, estamos num período recessivo no Brasil, e isso reduz bastante essa inflação de fora. Um terceiro ponto é que o mundo está crescendo menos e, ainda que algumas taxas de juros e commodities estejam subindo, não vejo o cenário externo como inflacionário.


BC ganha pontos na briga pela credibilidade


Por Lucinda Pinto | De São Paulo


O esforço pela reconquista da credibilidade perdida no primeiro mandato de Dilma Rousseff, empreendido pelo governo desde que foi reeleito, começa a ser percebido também na atuação do Banco Central. Há 15 dias, a autoridade monetária parece ter dado início a uma nova estratégia de comunicação, ao declarar, em evento em Washington, que fará uma política monetária "vigilante para que ocorram as ancoragens das expectativas". Até então, a vigilância buscava fazer a inflação convergir para o centro da meta.


A mudança, sutil, mostra que o valor que BC e governo atribuem à credibilidade aumentou. É um reconhecimento de que o primeiro objetivo, controlar a inflação, não pode ser alcançado sem a ancoragem das expectativas. Embora esse seja um conceito básico em termos de política monetária, ele não foi a marca deste Banco Central. A atenção aos dados correntes muitas vezes prevaleceu sobre a avaliação das projeções futuras. E não foram poucas as situações em que o BC surpreendeu com uma postura mais branda, a despeito da crescente preocupação com a evolução dos preços. Sem falar em discursos contraditórios de diretores ou mudanças inesperadas de sinalização. Atitudes que consolidaram entre agentes a visão de que, na dúvida, o BC miraria a atividade, mesmo correndo o risco de ser leniente com a inflação.


Em duas situações recentes, o BC quebrou esse paradigma. No fim de março, após uma leva de indicadores econômicos mais fracos e diante da queda do dólar, em resposta a uma alteração nas apostas para a alta de juros americanos, o mercado revisou sua projeção para o rumo da Selic e passou a contar com o fim do ciclo no encontro de abril, com uma última dose de 0,25 ponto. Prontamente, o Banco Central agiu e veio a público corrigir a rota do mercado: disse que a política monetária "foi, é e continuará sendo vigilante", levando o mercado de volta à aposta em alta de 0,5 ponto. Declaração feita de forma orquestrada tanto pelo presidente Alexandre Tombini quanto pelo diretor Luis Awazu Pereira.


Na reunião do Copom da semana passada, o BC também agiu de forma a impedir que o mercado caminhasse para apostas no fim do ciclo. Repetiu a íntegra de um comunicado lacônico, em vez de introduzir algum elemento que preparasse o mercado para o fim do ciclo. Postura que coloca o 0,5 ponto claramente no páreo de volta para junho. A menos que algo muito diferente aconteça até lá, a Selic poderá alcançar o patamar de 13,75%, patamar idêntico ao de dezembro de 2008.


Antes desses dois eventos de política monetária, a gestão do programa de swap cambial já foi uma demonstração de reconhecimento de que a hora é de correção de excessos passados. Diante do inédito estoque de US$ 114 bilhões em contratos, o BC interrompeu as ofertas líquidas no fim de março, a despeito da desvalorização recente da cotação e da volatilidade ainda no radar.


Reverter essa deterioração das expectativas não é simples e, muito menos, barato. Não são poucos analistas que consideram que a continuidade do aperto monetário agora tem mais a ver com a necessidade de assegurar a confiança do mercado do que com a necessidade de conter a economia. Afinal, a atividade já está muito fraca e pode impactar os índices de inflação nos próximos meses, por meio da redução da renda, do consumo, o que limita o repasse do câmbio para os preços. A correção de rota na política parafiscal, com contenção da oferta de crédito por bancos públicos, por exemplo, também trabalha a favor da redução da inflação. Mas o que parece é que o BC tem de fazer o mercado acreditar que, desta vez, não vai recuar diante das expectativas fora do lugar. E são elas, as projeções de inflação, que mostrarão se a estratégia deu resultado.


Na pesquisa Focus, a estimativa mediana para o IPCA segue em 5,6%. E, para 2017, em 5%. Mas já começa a haver alguma correção no discurso de alguns economistas, que já veem o IPCA em 4,5% como algo "possível", ainda que não seja "provável". Foi o que afirmou, por exemplo, o ex-diretor de Política Econômica do BC, Mario Mesquita, em entrevista ao Valor na semana passada. "Não é nossa projeção, mas não é um cenário impossível", disse.


Quando se olha para a projeção da Selic nos contratos de juros futuros, o mercado já colocou no preço mais uma dose de 0,5 ponto. E, mais importante, a inclinação da curva (a diferença entre os contratos curtos e os longos), que mostra a confiança que investidores depositam na eficácia da política monetária - tem ficado cada vez mais negativa. Na quinta-feira, o degrau entre o contrato para janeiro de 2017 e o janeiro de 2021 estava em -0,68%. No fim de fevereiro, esse spread era de -0,54% e, no fim de março, de -0,42%.


A ata do Copom terá muito a contribuir para que essa estratégia do BC se consolide. Na ata, o BC não pode "piscar". Tem de manter o mercado em alerta, contando com a chance de continuidade da alta do juro.


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