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Isto é Dinheiro online ( Entrevistas ) - SP - Brasil - 02-05-2015 - 11:02 -   Notícia original Link para notícia
"Os brasileiros precisam acalmar os nervos e trabalhar"

Por: (Diretamente de Goiana (Pernambuco)) // Hugo Cilo


Sergio Marchionne, CEO mundial do grupo Fiat Chrysler Automobiles ( foto: AFP PHOTO/ANDREA BALDO)


O executivo Sergio Marchionne, presidente mundial do grupo Fiat Chrysler Automobiles (FCA), sob qualquer ângulo é o estereótipo do italiano em pessoa. Aos 62 anos de idade, Marchionne não esconde a impaciência em eventos sociais - mesmo quando se trata da inauguração de uma importante fábrica da companhia -, é avesso a entrevistas e costuma disparar respostas ásperas, temperadas muitas vezes com ironia, quando está contrariado. O estilo turrão, no entanto, o ajudou a conduzir a montadora de Turim durante a crise global dos últimos anos e a transformá-la num dos maiores conglomerados automobilísticos do planeta, com faturamento de € 103,6 bilhões no ano passado. Sob seu guarda-chuva estão marcas icônicas, como Ferrari, Alfa Romeo, Maserati, Jeep, RAM e Dodge, além da Fiat e da americana Chrysler.


Na última terça-feira 28, o chefão da companhia esteve no País para inaugurar a primeira fábrica da Jeep no País, em Goiana, zona da mata pernambucana. Marchionne se comportou à altura de sua fama. Acompanhado pelo presidente do grupo na América do Sul, Cledorvino Belini, conversou com a DINHEIRO, deu uma entrevista coletiva a jornalistas de todo o mundo, encontrou-se com a presidente Dilma Rousseff, refutou as insinuações de que o governo ajudou a construir a unidade, interrompeu a fala de seu chefe, John Elkann, chairman da FCA e herdeiro da família fundadora Agnelli, e aproveitou a ocasião para reafirmar o compromisso da companhia com o futuro do Brasil. "Não tenho dúvidas de que o País vai recuperar o padrão de crescimento dos últimos anos", disse. Veja, a seguir, a avaliação de Marchionne sobre o atual momento da economia e quais são seus planos para a FCA no mercado brasileiro:


DINHEIRO - A Fiat foi a montadora que mais sofreu no mercado brasileiro no primeiro trimestre, com uma queda de quase 30% nas vendas. Mesmo assim, decidiu inaugurar mais uma fábrica no País. Faz sentido? 
SERGIO MARCHIONNE -
 Faz sentido porque esta fábrica produz o modelo Jeep Renegade, que concorre no segmento de SUVs premium. Essa categoria não está sendo afetada pela retração das vendas no mercado brasileiro. Está crescendo. Além disso, nos próximos 18 meses estaremos produzindo mais dois modelos aqui em Pernambuco, um da marca Fiat e outro da marca Jeep. Mesmo assim, em relação à queda nas vendas, estou otimista. Acredito que vamos nos recuperar também na categoria de maior demanda.


DINHEIRO - A fábrica mineira de Betim já está reduzindo a produção, cortando horas-extras e escalonando férias dos funcionários. 
MARCHIONNE -
 A fábrica da Jeep não tem nada a ver com a fábrica de Betim. Não há concorrência entre elas. Temos plena consciência do que está acontecendo com a economia brasileira e sabemos que, com o aumento de nossa capacidade de produção, graças a essa fábrica, estaremos muito mais fortes quando o mercado voltar a crescer. Projetamos uma fábrica com uma arquitetura capaz de se ajustar às oscilações e demandas do mercado.


DINHEIRO - Uma alternativa será ampliar as exportações? 
MARCHIONNE -
 Não existe ambiente para a exportação, atualmente. Nem interno, nem externo. Não existe uma política tributária de incentivo. Temos um terminal fenomenal a poucos quilômetros daqui, o Porto de Suape, que nos permite começar a exportar a qualquer momento. Estamos prontos para isso. Os carros produzidos nesta fábrica terão qualidade para competir no mercado internacional. Mas, por enquanto, não dá. Se alguém puder me ensinar a como exportar agora, gostaria de ouvir.


DINHEIRO - Dos cerca de R$ 7 bilhões investidos nesta fábrica, menos de 25% foram com recursos próprios do grupo Fiat Chrysler. A maior parte, cerca de 2/3, foi financiada com dinheiro do BNDES. A companhia precisava desse dinheiro público? 
MARCHIONNE -
 A presidente Dilma Rousseff gosta de enaltecer a participação dos bancos públicos no projeto, e acho legal isso. Desde o início, tivemos o apoio do ex-presidente Lula e do então governador, o falecido Eduardo Campos. Mas é preciso esclarecer que se trata de empréstimo. Nós estamos pagando juros sobre um financiamento. É uma relação comercial. Não é dinheiro dado, nem ajuda. Todo projeto dessa dimensão exige recursos próprios e emprestados. Não podemos confundir as coisas.


DINHEIRO - Os escândalos de corrupção na Petrobras, os partidos que estão no poder e grandes empreiteiras prejudicaram de alguma forma o setor ou a Fiat? 
MARCHIONNE -
 Nosso compromisso com o Brasil, uma potência econômica, está mantido, independentemente do que acontece no ambiente político. Os casos de corrupção são questões internas que estão sendo resolvidas. A crise atual vai afetar os resultados da economia neste ano, e parte de 2016, acredito. Mas não tenho dúvidas de que o País vai recuperar o padrão de crescimento dos últimos anos.


DINHEIRO - Esse otimismo está baseado em quê?
MARCHIONNE -
 Há espaço para crescimento da indústria automobilística no Brasil. Os consumidores são jovens e muitos ainda não possuem automóveis. Além disso, nos últimos anos, principalmente a partir de 2008, o Brasil cresceu, enquanto a Europa e os Estados Unidos enfrentaram uma gra­ve crise. Isso foi quase um milagre.


DINHEIRO - Mas, agora, o mundo está crescendo, e o Brasil, encolhendo...
MARCHIONNE -
 Isso faz parte. São ciclos. Os brasileiros precisam acalmar os nervos e trabalhar. Só isso. É assim que se enfrenta a crise. O mercado automobilístico brasileiro não é mais emergente há muito tempo. É sólido. Quando olhamos para um mercado de 3,5 milhões de automóveis e a evolução dos últimos anos, notamos que é estável e promissor.


DINHEIRO - Se a marca Fiat está encolhendo, a estratégia será investir em marcas mais sofisticadas do grupo? 
MARCHIONNE - 
Sim. A ideia é diversificar nossa oferta de marcas e categorias de produtos aos consumidores. Quando um determinado segmento se retrair, outros irão segurar. Isso não significa que vamos trazer todas as marcas. Não vamos trazer a Chrysler para o Brasil, por exemplo. Não como marca. A Jeep é a força motriz da nossa estratégia no País. As vendas da Jeep cresceram 22%, no primeiro trimestre desde ano, em todo o mundo. Faz muito sucesso nos Estados Unidos, está crescendo na Europa e na China. Tanto é que vamos inaugurar uma fábrica na China em novembro, que produzirá, inicialmente, o modelo Cherokee. Um outro modelo, desenvolvido só para o mercado chinês, chegará em 2016. O importante, em resumo, é termos marcas globais, mantendo o DNA de cada uma, é claro.


DINHEIRO - A Alfa Romeo poderá vir para o Brasil?
MARCHIONNE -
 Sim.


DINHEIRO - O grupo Fiat Chrysler está ampliando os investimentos em ações sociais nas comunidades onde constrói suas fábricas?
MARCHIONNE -
 Não. Sempre fazemos os investimentos necessários, conforme acordamos com as autoridades locais antes da construção. Investimos muito dinheiro nisso. Todos os anos, publicamos um relatório de responsabilidade social, que ninguém lê. Lá, mostramos o que tem sido feito em cada comunidade. Não estou reclamando, mas é fato que nossos esforços não são vistos e valorizados por todos. Infelizmente, poucas pessoas dão atenção a isso.


DINHEIRO - Qual foi o acordo firmado em Pernambuco?
MARCHIONNE -
 Vários. Assinamos um acordo de quatro anos com o sindicato. Colocamos tudo no papel, desde acordos de remuneração, bonificação, ações sociais e bolsas de estudos para filhos de funcionários. Está tudo lá.


DINHEIRO - A deterioração da economia brasileira fez, em algum momento, a companhia pensar em rever o plano de investimentos? 
MARCHIONNE - 
Nós nunca mudamos o plano ou estudamos rever os investimentos. A fábrica seria inaugurada, independentemente do que acontecesse no mercado. Não se ergue uma fábrica olhando para o próximo semestre.


DINHEIRO - Existe a possibilidade de um casamento entre o grupo Peugeot Citroën (PSA) e a Fiat Chrysler? 
MARCHIONNE -
 Casamento? Não gosto da expressão casamento, quando se fala na possibilidade de fusão de grandes empresas. Bom, respondendo objetivamente, não existe nada disso. O mercado passa, sim, por um processo de consolidação. A FCA e a PSA são parceiras em veículos comerciais na Europa. Só isso. Esses argumentos de fusão global são vazios.


DINHEIRO - Apesar da crise, o Brasil continua sendo o maior mercado para a Fiat, no mundo. A crise não compromete o andamento dos planos globais? 
MARCHIONNE -
 Somos líderes no mercado brasileiro e a sétima maior montadora do mundo. É natural que o líder sinta mais uma retração do mercado. Agora, sobre a importância do Brasil para o grupo, posso dizer que somos tão brasileiros que, em 13 de outubro do ano passado, quando concluímos o processo de unificação da Fiat com a Chrysler, hasteamos a bandeira brasileira em Wall Street. Em certo sentido, me sinto brasileiro. Todos nós nos sentimos.


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