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Valor Online ( Brasil ) - SP - Brasil - 24-04-2015 - 08:02 -   Notícia original Link para notícia
Estados e municípios garantem 83% do superávit no 1º bimestre

Por Tainara Machado | De São Paulo


Os Estados e municípios foram responsáveis por 83% do superávit primário de R$ 18,8 bilhões realizado no primeiro bimestre de 2015, embora sua arrecadação tenha caído até mais rapidamente do que a do governo federal. Para chegar nesse resultado, os governos regionais cortaram investimentos e conseguiram segurar as despesas de custeio, de acordo com estudo dos economistas José Roberto Afonso e Vilma Pinto, pesquisadores do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).


Na avaliação de secretários de Fazenda ouvidos pelo Valor, porém, o resultado do primeiro bimestre é um retrato otimista das contas dos Estados e municípios, já que há sinais de piora mais forte da arrecadação em março. A maioria avalia que não deve manter o superávit primário do primeiro bimestre no restante do ano, mesmo com contenção de despesas.


O estudo se baseou nos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária do primeiro bimestre do governo federal e de Estados e municípios selecionados, para permitir a comparação entre a evolução da receita e despesa. A metodologia difere da usada pelo Banco Central, que calcula o resultado primário a partir da variação da dívida líquida total (interna e externa) no período. Os Estados selecionados para análise foram Rio, São Paulo, Minas Gerais, Pará, Goiás, Ceará e Rio Grande do Sul, além das prefeituras do Rio e São Paulo.


Segundo Vilma, o esforço fiscal dos governos regionais é tradicionalmente mais forte no início de cada ano, período em que se concentra a arrecadação de tributos estaduais, como IPVA e ICMS. Em 2015, porém, a participação dos Estados e municípios no superávit primário do período foi bem maior do que na média dos últimos quatro anos, embora a receita total tenha caído 5,8% em termos reais, mais do que o recuo da arrecadação da União (4,4%).


Por outro lado, ainda de acordo com os relatórios, o corte nas despesas foi maior nos governos regionais - com queda de 0,4% - do que no governo federal (-0,2%). Enquanto a União conseguiu controlar mais os gastos com pessoal e investimentos, Estados e municípios realizaram ajuste mais forte na despesa de custeio, que teve queda de 4,9%. No caso da União, esse gasto desacelerou, mas ainda assim o bimestre terminou com crescimento de 4,7%. "Sem alternativa para se financiarem, já que não podem emitir títulos, os governos estaduais e municipais foram obrigados a fazer um ajuste fiscal maior do que o do governo federal", afirmam os pesquisadores.


No Ceará, que teve resultado primário de R$ 1,2 bilhão no primeiro bimestre, a arrecadação caiu 6,2% em termos reais em relação aos primeiros dois meses de 2014. O secretário de Fazenda do Estado, Mauro Benevides Filho, diz que a arrecadação própria teve comportamento mais positivo, com alta de 4,5% em termos nominais, com mais rigor na fiscalização e aumento da eficiência.


O problema, diz o secretário, é que as transferências da União tiveram queda nominal de 0,6% no período, o que acaba afetando a receita do Estado como um todo. "Mas temos baixo endividamento, conseguimos captar receita de operação de crédito e, com ajuste fiscal muito grande, mantivemos investimentos."


No bimestre, a despesa com custeio caiu 26,2% em relação a 2014, descontada a inflação do período. Para Benevides Filho, essa redução decorreu do contingenciamento imposto pela Fazenda estadual. "Se vai cortar no [funcionário] terceirizado, no combustível, na energia, isso eu não decido. Mas a gente dá um limite para cada órgão e cada um decide no que reduzir a despesa." Saúde, educação e segurança tiveram contingenciamento de 20%, enquanto nas demais pastas o corte foi de 25%.


O Ceará ainda reduziu em 25% os cargos comissionados do Estado, o que levou a folha de pagamentos a ter crescimento modesto, de 0,9%, no primeiro bimestre, sempre em termos reais. "É um ajuste duro, mas se não faz agora, no primeiro ano, não consegue mais fazer depois".



preservou investimentos, que triplicaram no período. No ano, porém, a expectativa é de obras no valor de R$ 2,5 bilhões, cerca de R$ 500 milhões a menos do que em 2014. Ainda assim, diz o secretário, dificilmente o Estado manterá o resultado fiscal do primeiro bimestre. "Mas vamos dar contribuição positiva para o ajuste. " No ano, o resultado esperado é de R$ 1 bilhão.


Em Goiás, também não há expectativa de manutenção do superávit primário de R$ 481 milhões do primeiro bimestre. "Mesmo que a gente faça um forte ajuste fiscal nas contas do Estado, o resultado será menor do que o programado no fim do ano passado", afirma a secretária de Fazenda, Ana Carla Abrão. A forte frustração com a arrecadação, da ordem de R$ 3 bilhões em relação ao programado no ano passado, deve levar Goiás a registrar déficit de R$ 440 milhões em 2015, bem abaixo do superávit de R$ 500 milhões projetado em meados de 2014. Para a secretária, o primeiro bimestre mostrou um resultado mais positivo do que deverá acontecer no ano.


Goiás foi o único Estado a registrar crescimento da arrecadação no bimestre, com alta de 0,6% em termos reais. Mas a fotografia do bimestre é melhor do que a do trimestre, diz Ana Carla. "A arrecadação em março foi muito ruim, as transferências do governo federal também estão em queda".


Do lado da despesa, a expansão foi de 4,1% no bimestre, em termos reais. Para a secretária, é provável que o resultado dos ajustes propostos pela Fazenda estadual fique mais visível nos próximos meses, com desaceleração do custeio. "O decreto mais forte foi publicado no fim de fevereiro, então o contingenciamento deve aparecer com mais ênfase nos dados de março", diz. Entre as medidas adotadas, houve redução de 16 para 10 secretarias, o que permitiu cortes em todas as linhas de custeio, desde liberação de prédios alugados até redução da conta de luz, conta.


Renato Villela, secretário de Fazenda de São Paulo, também avalia que o ajuste fiscal no Estado só vai aparecer nos números a partir dos próximos meses. Por enquanto, diz, as medidas anunciadas, como contingenciamento de R$ 6,6 bilhões e corte de 10% nas despesas de custeio, serviram para impedir o crescimento maior da despesa corrente. No primeiro bimestre, o gasto primário total do Estado aumentou 2,1%, com alta de 5,5% da despesa com pessoal e de 0,4% no custeio. Os investimentos caíram 21,2%, sempre em relação a janeiro e fevereiro de 2014.


Para Villela, o desempenho do resultado primário paulista vai depender da evolução da economia nos próximos meses. A preocupação é o impacto de uma demanda fraca na arrecadação do ICMS. Até março, a receita com o imposto caiu 4,4% em termos reais contra iguais meses do ano passado. A expectativa do secretário é que o reajuste de tarifas de energia tenha repercussão mais positiva para as contas a partir do segundo trimestre. Para o ano, a recomposição da tarifa deve trazer arrecadação adicional de R$ 400 milhões em 2015.


Marco Aurélio Cardoso, secretário de Fazenda do município do Rio de Janeiro, também não espera encerrar o ano com superávit primário próximo do registrado no primeiro bimestre. No período, a prefeitura teve resultado positivo de R$ 1,4 bilhão, mas Cardoso considera improvável que o Rio encerre o ano com resultado positivo, já que há investimentos previstos por causa da Olimpíada e a receita deve encerrar o ano com alta em torno de 1% em termos reais.


Para o secretário, o resultado do começo de ano tende a ser mais favorável, porque há a arrecadação da cota única do IPTU. A tendência, porém, é que a receita acompanhe a inflação e tenha alguma recuperação no segundo semestre. Por enquanto, a principal frustração vem das transferências estaduais e federais e na arrecadação do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), que reflete o desaquecimento mais acentuado do mercado imobiliário.


Do lado da despesa, o município passou longe do ajuste realizado por alguns outros Estados, com forte crescimento do gasto com pessoal, custeio e investimentos. Para o secretário, é difícil avaliar o resultado apenas com base no primeiro bimestre e diz que a despesa deve desacelerar ao longo do ano. Já os investimentos vão manter o ritmo elevado do início do ano, diz. "Já temos empréstimos contratados com o BNDES e com a Caixa para as obras de legado, e os investimentos já estão em curso", afirma. Com posição de caixa mais confortável, o município não fez cortes mais duros na despesa. (colaborou Marta Watanabe)



Ana Carla Abrão, da Fazenda de Goiás: "A arrecadação de março foi muito ruim"



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