Leitura de notícia
O Globo Online (RJ) ( Economia ) - RJ - Brasil - 15-03-2015 - 12:12 -   Notícia original Link para notícia
Em tempos de cólera, etiqueta ao reclamar

Produtos com defeito. Atendimento ruim. Especialistas ensinam a exigir direitos sem perder a razão


Rachel Jordan Especialista em Imagem e Comportamento "O consumidor tem sempre a razão. Mas não pode perdê-la ao ficar agressivo" "O consumidor não começa o contato sendo mal educado. Perde a paciência frente à inabilidade"
Rita Martins
Mestre em Psicologia


Chega o Natal, mas não chega o presente do filho (comprado com antecedência pela web!). O banco cobra por serviços nunca solicitados. O 3G não funciona, e o pacote de TV a cabo contratado não vem com todos os canais ofertados. Mas, na hora de o consumidor procurar o SAC da empresa para exigir o que é de direito, a espera pelo atendimento pode chegar a quase uma hora. Ainda há o risco de ser transferido algumas vezes até resolver o problema - se é que será solucionado. Resultado: irritado e desgastado, não é raro que o consumidor perca a paciência, se exalte com o atendente e xingue muito a empresa no Twitter. O comportamento, porém, pode trazer danos tanto à imagem do consumidor quanto da empresa, alertam especialistas em etiqueta. Além de dificultar a solução do problema.


MARCELO


- O consumidor tem sempre a razão. Mas não pode perdê-la ao ficar agressivo e descontar no vendedor. Mesmo na condição de representante da loja, ele é um ser humano. É fato que não são tempos fáceis para manter a etiqueta. O call center é um calvário, e o consumidor está calejado por produtos defeituosos e mau atendimento. Mas, com bom senso, relatando educadamente o problema, conquistará a empatia do atendente, que facilitará a solução - avalia Rachel Jordan, especialista em imagem e comportamento.


O ideal, recomenda, é manter a calma, medir as palavras e, diante de uma resposta absurda, usar a velha técnica de contar até dez antes de replicar.


- Demoramos muito para construir uma imagem positiva e cinco minutos para destruí-la - alerta Rachel.


Recentemente, a própria consultora teve a paciência testada e a honestidade posta à prova. Ao voltar à loja para trocar um batom, após perceber que já tinha aquela cor da marca, ouviu do atendente: "Você já usou esse batom".


- Aqui no Brasil as empresas, infelizmente, sempre partem da premissa que o consumidor age de má-fé.


QUEIXA FEITA NA LOJA PEDE DISCRIÇÃO


Claudia Matarazzo, consultora de etiqueta e comportamento e autora de livros sobre o tema, aconselha discrição - sem alteração de voz e, de preferência, num local reservado - quando a queixa é feita pessoalmente, para não expor o atendente ou o gerente.


- Muitas vezes, ele não é o responsável pelo problema, só o interlocutor. Quando a reclamação é legítima e feita com delicadeza, o atendente tem mais empenho em solucioná- la. Do contrário, acha que é pessoal, e o estrago está feito - avalia.


Para Rita Martins, mestre em psicologia e especialista em comportamento do consumidor, o que mais desgasta a relação é a forma com a qual a empresa lida com a demanda pós-venda. O ideal, diz, é que primeiro resolva o problema e depois justifique o ocorrido. Mas as empresas fazem o contrário, diz:


- O consumidor não começa o contato sendo mal educado. Ele perde a paciência frente à inabilidade em se resolver a questão e, quando estamos irritados, sofremos do que chamo de surdez psicológica. A empresa precisa primeiro resolver. Para isso foi procurada. Justificativas levam o consumidor a achar que está sendo "enrolado".


O abuso na conduta de vendedores e atendentes fica evidente ao se observar que o constrangimento apareceu em terceiro lugar entre os problemas mais reclamados à Defesa do Consumidor em 2014. Trata-se da primeira vez que esse tipo de queixa aparece entre os dez temas mais registrados desde que o sistema de intermediação on-line foi implementado, em 2003.


A melhor maneira de lidar de forma equilibrada com uma situação desgastante de consumo, aconselha Rita, é estar seguro do que diz o Código de Defesa do Consumido (CDC). O cliente deve demonstrar conhecimento dos direitos assegurados pelo documento.


- A empresa aposta na ignorância dos clientes e na crença de que reclamar dá trabalho. Dificulta a queixa para que desistam. Quando temos conhecimento sobre algo, não precisamos discutir. O CDC é um livro pequeno, pode ser levado na bolsa para ser lido no ônibus, no engarrafamento. Se a lei garante, a empresa não tem o que discutir - diz a mestre em psicologia.


Ela alerta ser comum empresas rebaterem citações ao código dizendo que existem normas próprias. Porém, por ser lei federal, o CDC é soberano, lembra.


ABUSO PODE LEVAR A PROCESSO JUDICIAL


Advogada especialista em defesa do consumidor, Melissa Areal Pires reforça que o cliente tem todo o direito de fazer queixa, mas não pode abusar, assim como a outra parte não pode fazê-lo:


- A liberdade de expressão está garantida na Constituição, assim como a proteção à honra e à imagem da pessoa física e jurídica. Ao reclamar, principalmente na internet, onde as pessoas se sentem mais livres, evite expressões caluniosas.


Um exemplo de abuso na reclamação punido pela Justiça ocorreu em setembro 2013. A 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal negou apelação a um consumidor condenado a indenizar em R$ 9 mil uma escola profissionalizante. De acordo com a decisão, o consumidor, que queria receber de volta o dinheiro pago por um curso, por considerar falha a prestação do serviço, adotou comportamento desrespeitoso com os funcionários da gerência da escola, constrangendo-os com agressões verbais.


Melissa orienta que, apesar de as próprias empresas incentivarem reclamações em canais on-line, se privilegie o registro no SAC e nos órgãos de proteção ao consumidor. A formalização pode contar a favor do consumidor inclusive se for acionado na Justiça pela empresa, pois é prova de que a procurou para resolver o problema amigavelmente.


- Na internet, estamos ainda mais expostos. Ao usá- la para reclamar, o ideal é descrever em detalhes o problema, e não desqualificar o serviço ou produto com palavras pejorativas, chamando de porcaria, por exemplo. Não xingue, explique - aconselha Claudia.


FALTA DE CREDIBILIDADE INCITA QUEIXAS


Mestrando em ciência da informação, perito especialista em crimes digitais e vice-presidente da Comissão Estadual de Informática da OAB-SP, o advogado José Milagre diz que, juridicamente, é tênue a linha entre a reclamação legítima e a difamação. É uma avaliação subjetiva que ficará a cargo do juiz:


- As empresas monitoram as redes sociais e encontram reclamações que difamam a empresa injustamente, gerando um dano cujos estragos têm mais peso que um processo judicial ou uma reclamação ao Procon. E, quando o caso é resolvido, o consumidor não volta à rede social para contar.


O advogado, que representa empresas nesse tipo de caso, reconhece, no entanto, que alguns abusos no direito de reclamar ocorrem porque empresas têm perdido a credibilidade, levando os consumidores a atitudes extremas.


O consultor de etiqueta Fabio Arruda vai além. Para ele, a forma como o consumidor reclama é resultado direto de todo o processo de consumo, que começa na oferta. Se a empresa falhou em alguma etapa, o consumidor, ao ter de resolver um problema de pós-venda, já está com uma impressão ruim e pode se exacerbar. Para ele, a receita para reclamar sem ofender é simples: foco.


- Não discuta, não bata boca. Demonstre o que está errado e peça educadamente o reparo.


Procurada para informar como os lojistas têm trabalhado a questão do atendimento e a crescente insatisfação do consumidor, a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (), que representa varejistas de todo o Brasil, não tinha porta-voz disponível. NA WEB glo.bo/1Ax60PF Reclamações que viraram piada


Palavras Chave Encontradas: CDL
O conteúdo acima foi reproduzido conforme o original, com informações e opiniões de responsabilidade da fonte (veículo especificado acima).
© Copyright. Interclip - Monitoramento de Notícias. Todos os direitos reservados, 2013.