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Estadão ( Economia ) - SP - Brasil - 08-03-2015 - 12:13 -   Notícia original Link para notícia
Levy vai precisar fazer o ajuste fiscal mais duro desde a criação do Plano Real

Alexa Salomão - O Estado de S. Paulo


08 Março 2015 | 03h 00


Déficit criado nas contas do governo federal no primeiro mandato de Dilma Rousseff é o triplo do visto no final dos anos 90, quando as finanças públicas foram saneadas; pressões políticas e sociais contra medidas de ajuste também são bem maiores agora


Ninguém duvida que o ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é um grande desafio. O que muita gente ainda não se deu conta é que ele será o mais duro já feito desde a implantação do Plano Real. O déficit criado ao longo do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff é praticamente o triplo do déficit registrado no fim dos anos 90, quando o governo de Fernando Henrique Cardoso lançou o Programa de Estabilidade Fiscal e saneou as contas públicas.


"No que se refere ao fiscal, o Brasil andou para trás - voltamos aos anos 90", diz o economista Gabriel Leal de Barros, especialista em Finanças Públicas do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). 



Cortes. Levy precisa lidar com cenário fiscal mais complexo


Os dados que mostram essa degringolada constam de boletim do Ibre/FGV e levam em consideração o chamado superávit primário recorrente. Esse tipo de superávit mede a capacidade de o governo poupar recursos para o pagamento da dívida com um esforço legítimo.


Nesse caso, ele faz o dever de casa, cortando gastos e realizando ajustes que deixem a máquina pública mais eficiente e econômica. No cálculo desse tipo de primário, não se admitem receitas eventuais, que dificilmente se repetem, como um programa de perdão de dívidas tributárias que, vez por outra, dá descontos para quem não pagou impostos e engorda a arrecadação.


Antes do lançamento do Programa de Ajuste Fiscal do Plano Real, em outubro de 1998, o governo federal amargou anos no vermelho. Em 1997 e 1998, os déficits recorrentes estavam na casa de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB). Respectivamente, 0,42% e 0,44% (veja quadro acima). Em 1999, o ajuste começou a dar resultado e as contas do governo federal entraram no azul. Foram 15 anos seguidos de superávits recorrentes. 


No vermelho. Em 2009, porém, o recorrente perdeu fôlego. "A queda do superávit recorrente refletiu a nova política do governo, que incentivava União, Estados e municípios a serem mais atuantes na economia: a investir mais, dar subsídios, ampliar o crédito", diz o economista Leal de Barros. Em 2014, por fim, as contas da União voltaram ao negativo. Registrou-se um déficit recorrente de 1,3% do PIB, muito pior do que o visto no fim dos anos 90. 


"O déficit de hoje é praticamente o triplo do último déficit, de 1998", diz Leal de Barros. "Por causa disso, a atual equipe econômica tem o desafio de fazer o ajuste mais duro desde a implantação do Plano Real - o esforço terá de ser muito maior, ao mesmo tempo, as condições políticas e sociais também são outras."


Tributos. Historicamente, boa parte dos ajustes fiscais são feitos por meio de aumento da carga tributária. Não foi diferente na gestão de Fernando Henrique Cardoso. Para relembrar: foram feitos corte de gastos de custeio e de investimento (como Levy também já anunciou agora). Mas a conta ainda pesou no bolso do contribuinte.


O governo prorrogou a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), elevou as alíquotas e a ampliação da base de arrecadação da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e criou a contribuição previdenciária dos servidores públicos inativos. 


Na época, lembra o economista, o Plano Real domava a inflação e havia boa vontade da população e do Congresso em relação a medidas mais duras. A carga tributária também era outra. Equivalia a 27,5% do PIB. Hoje, a carga tributária está em cerca de 39% e o Congresso, as empresas e a sociedade são bem mais resistentes a aceitarem sacrifícios.



'Carga tributária vai acima de 40%', diz economista


O Estado de S. Paulo


08 Março 2015 | 03h 00


Entre os economistas que acompanham as contas públicas, existe quase um consenso de que a equipe do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, já conseguiu algo como 0,7% ou 0,8% da meta de 1,2% do Produto Interno Bruto para o superávit primário (a economia para o pagamento de juros da dívida). Mas cresce também o consenso de que, como ocorreu em outras ocasiões em que o Estado gastou mais do que podia, que haverá aumento de carga tributária.


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Alguns já têm até uma projeção de quanto será a conta para o contribuinte. "Aposto com qualquer um que teremos entre 2015 e 2016 um aumento de pelo menos 2 pontos porcentuais: a carga tributária vai superar 40% do PIB", diz o economista Mansueto Almeida. "Acho terrível e isso vai comprometer o crescimento do País, mas não haverá outra alternativa porque este é um ajuste muito complicado de ser feito." 


Segundo Mansueto, a reestruturação das contas públicas pode não se restringir a 2015. "Vai se estender por 2016 e não ficaria surpreso se perdurasse por todo o governo Dilma", diz Mansueto. 


Em sua projeção, ele leva em consideração que as receitas estão em queda, por causa do baixo crescimento, mas estão previstos aumentos de despesas e há muitas contas pendentes criadas na gestão anterior. 


Em março do ano passado, por exemplo, o governo foi generoso com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Abdicou de pagamentos de juros que cobriam repasses feitos pelo Tesouro Nacional. A carência foi estendida. "O principal de uma dívida do BNDES de R$ 194 bilhões foi renegociada e só começa a ser pago em 2040", diz. 


Levy já fez algumas mudanças na estrutura dos gastos que ajudam. Se enquadram, neste caso, alterar as regras de concessão de abono salarial e seguro-desemprego. Mas também adiou investimentos e gastos. Muitos deles não poderão ficar represados por muito tempo. É o caso dos recursos para a educação. Entre janeiro e fevereiro deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado, as instituições federais de ensino sofreram uma redução de quase 34% na verba dirigida ao seu funcionamento. "Não há como segurar coisas assim por muito tempo", diz o economista. "Em algum momento será preciso elevar a tributação."


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