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Valor Online ( Empresa ) - SP - Brasil - 23-02-2015 - 12:10 -   Notícia original Link para notícia
O alcance do aumento salarial do Walmart

Por David Crow em Nova York e Sam Fleming em Washington | Financial Times


"Toda vez que você usar um balcão de auto pagamento ou um sistema de pedidos em telas sensíveis ao toque, está realizando uma tarefa que costumava ser parte da função de alguém".


Essa era a dura mensagem de um comercial de 30 segundos exibido nas redes de TV americanas no ano passado. A narração vinha acompanhada por imagens de garçonetes e atendentes em caixas registradoras que iam sumindo e sendo substituídas por máquinas.


O anúncio fez parte de uma campanha financiada pelos setores de fast-food e varejistas em oposição aos apelos do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pela elevação do salário mínimo federal para US$ 10,10, em comparação com o nível de US$ 7,25 fixado há mais de cinco anos.


Como maior empregador do setor privado dos EUA, o Walmart pode moldar tendências econômicas, afirma central sindical


Na quinta-feira, o Walmart rompeu fileiras com muitos outros empregadores e anunciou que vai passar a pagar a todos os seus funcionários uma remuneração inicial de US$ 9 por hora, que em fevereiro de 2016 subirá para US$ 10 por hora para funcionários já empregados. Muitos observadores acreditam que as atenções estarão agora voltadas para ver se outros empregadores com funcionários de baixa remuneração, particularmente no setor de fast-food, copiarão o exemplo, seja porque competem pelos mesmos trabalhadores ou porque será impossível se oporem à pressão pública e à imposição de salários mínimos estaduais.


Tara Sinclair, economista do site de empregos Indeed e professora da Universidade George Washington, disse que a medida "repercutirá bem além do setor varejista".


As empresas em todo o setor da "economia de baixos salários" agora sentirá uma pressão extra para aumentar a remuneração, disse Damon Silvers, diretor de políticas da AFL-CIO, central sindical americana. "Como maior empregador no setor privado do país, o Walmart tem um tremendo poder de moldar tendências econômicas."


A decisão acontece num momento em que as empresas encontram-se em um debate acirrado sobre o salário mínimo nos EUA - cujo reajuste mais recente ocorreu em 2009 -, e uma estagnação generalizada da renda. Os trabalhadores que recebem salário mínimo ganham, atualmente, 20% menos, em termos reais, do que no fim da década de 60, o que deflagrou reivindicações, por sindicatos e políticos do partido Democrata, por aumentos maiores.


Obama renovou sua exortação por um salário mínimo federal mais elevado em um relatório enviado ao Congresso na quinta-feira, mas o vice-secretário de imprensa da Casa Branca, Eric Schultz, recebeu positivamente sinais de que diversas empresas, como o Walmart, já estão tomando unilateralmente medidas em relação à remuneração. "Continuamos exortando o Congresso a conceder a todos os trabalhadores nos EUA um aumento salarial. Entretanto, em virtude de estarem recalcitrantes, continuaremos a fazer progressos de outras formas", disse.


Em grande parte dos EUA, as empresas já têm de pagar mais do que o mínimo federal, após 29 Estados aprovarem um aumento do salário mínimo a partir de janeiro, inclusive os Estados de Washington, Oregon e Connecticut. Todos esses pisos, porém, permanecem abaixo de US$ 10 por hora.


Mesmo a US$ 10, um funcionário do Walmart com uma família de quatro pessoas precisa contar com o apoio do governo para ser posicionado acima da linha de pobreza federal, disse David Cooper, economista do Economic Policy Institute (EPI), um instituto de esquerda. O EPI defende a fixação, em 2020, de um mínimo federal de US$ 12,50 [a hora], dizendo que isso produziria aumentos salariais para perto de 40 milhões de trabalhadores, direta ou indiretamente, devido a um "efeito cascata".


O Walmart afirmou que US$ 10 por hora é só seu salário inicial, e que pretende rapidamente levar as pessoas para acima desse nível, praticando uma média de US$ 13 por hora para todo o seu pessoal.


O custo da decisão do Walmart representa um notável montante de US$ 1 bilhão, mas constitue uma fração de sua receita anual de US$ 486 bilhões. Investidores reagiram negativamente, produzindo uma queda de 3% na cotação de suas ações, após a notícia. Analistas mostraram-se divididos sobre as consequências. O Goldman Sachs advertiu: "o custo de operação dos negócios do Walmart está claramente em alta, num reflexo da autoimposta pressão salarial."


Robert Drbul, do Nomura, porém, aplaudiu a decisão. "Acreditamos que isso é bastante lógico e já deveria ter ocorrido há bastante tempo. Estamos otimistas e acreditamos que esse investimento acabará por se traduzir em uma melhor experiência para o cliente, devido à maior satisfação dos colaboradores e maior retenção em mais longo prazo".


Ao elevar a remuneração, o Walmart age segundo seu próprio interesse empresarial, argumenta Justin Wolfers, membro do Instituto Peterson de Economia Internacional. Ele citou evidências de que aumentos salariais podem melhorar a produtividade dos funcionários de uma empresa, bem como melhorar a retenção de pessoal.


O Walmart vem sinalizado há algum tempo estar pronto para enfrentar a questão do salário mínimo em suas unidades, uma questão que provocou uma onda de greves organizadas por sindicatos e grupos representantes de funcionários. A varejista não é a primeira a oferecer salários mais elevados - Ikea, Costco, Whole Foods e Gap estão entre as empresas que remuneram acima do piso federal.


No entanto, o setor de fast-food, dominado pelo McDonald's e pela Yum Brands, proprietária da Pizza Hut, tem resistido mais vigorosamente ao pagamento de salários mais altos.


O McDonald's argumenta que seus franqueados, e não a companhia, são responsáveis pelas condições de trabalho. Mas seu mais recente relatório trimestral financeiro na Securities and Exchange Commission (SEC) contém várias advertências de que um aumento nos salários mínimos podem prejudicar seus negócios.


"O impacto de campanhas de organizações e ativistas sindicais no sentido de promover percepções adversas de nossa marca", poderão comprometer a capacidade sustentada da empresa de elevar seus lucros e faturamento, afirmou o McDonald's à SEC.


O relatório anual da Yum Brands homologado na SEC contém uma advertência similar: "A competição por funcionários capacitados também poderá nos obrigar a pagarmos salários mais altos para atrair um número suficiente de trabalhadores, o que poderá impactar negativamente nossas margens de lucro."


A Yum também é alvo de processos judiciais relacionados com suas condições de trabalho. Sua unidade Taco Bell é acusada, em várias ações judiciais coletivas, de remunerar trabalhadores abaixo do piso e de não lhes fornecer refeições nem conceder pausas para descanso. A empresa nega as acusações.


A companhia negociou um acordo com os motoristas que trabalham na Pizza Hut, que entraram com um processo em separado alegando não terem sido reembolsados por gastos na aquisição de seus veículos ou uniformes.


A Yum, que já opera a baixos custos, pode enfrentar mais dificuldades que o Walmart para absorver os aumentos salariais. Os custos de mão de obra já representam 38% do faturamento em suas lanchonetes Taco Bell. No ano passado, as lanchonetes reportaram uma margem de lucro de 18,9%, ou uma queda de 60 pontos base, que atribuíram à "inflação de commodities e custos mais elevados de alimentos e de mão de obra".


Procurados pela reportagem, o McDonald's e a Yum não se pronunciaram.


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