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Valor Online ( Finanças ) - SP - Brasil - 06-02-2015 - 05:00 -   Notícia original Link para notícia
'Não há uma tendência positiva para o mercado brasileiro'

Por Antonio Perez | De São Paulo


Rüttimann, do Julius Baer: "A recessão está se aprofundando e seria muito ruim para o Brasil perder o grau de investimento"


Com rombo nas contas públicas e déficit em transações correntes, o Brasil tem que "começar a agir agora" para recuperar a capacidade de crescimento e evitar a perda do grau de investimento, avalia Heinz Rüttimann, estrategista de mercados emergentes do private bank suíço Julius Baer, que fechou 2014 com 291 bilhões em francos suíços (cerca de US$ 314 bilhões) sob gestão.


"Se os políticos não agirem, o quadro pode piorar. A recessão está se aprofundando e seria muito ruim para o Brasil, que precisa de recursos externos, perder o grau de investimento", afirmou Rüttimann ao Valor, durante passagem por São Paulo. O grupo Julius Baer controla com 80% do capital a GPS, maior gestora de fortunas independentes do Brasil.


A "boa notícia", segundo Rüttimann, é que o governo brasileiro parece consciente dos problemas e sabe que precisa ajustar a economia, porque perder o grau de investimento "seria um suicídio político".


Para voltar a ser atraente aos investidores estrangeiros, diz o estrategista, o Brasil tem que voltar a crescer de acordo com seu potencial, por volta de 3% ao ano. Somando o primeiro governo de Dilma Rousseff com as estimativas para 2015 e 2016, serão seis anos "de crescimento abaixo do potencial", o que diminui a atratividade do Brasil. À espera do desfecho das investigações na Petrobras e de "gatilhos" positivos, como reformas que levem à volta do crescimento, Rüttimann não pretende, no momento, aumentar a exposição a ações brasileiras.


Leia abaixo os principais trechos da entrevista.


Valor: Quais são as perspectivas para os mercados emergentes em 2015 com a queda dos preços das commodities e a provável alta de juros nos Estados Unidos?


Heinz Rüttimann: Quando o assunto é mercados emergentes globais, o principal ponto é a queda atual do petróleo. É improvável que o preço do barril petróleo volte a atingir US$ 100 ou até mesmo US$ 80 sem um evento político. Com essa queda, os mercados emergentes da Ásia, que são importadores líquidos de petróleo, vão ser os vencedores em 2015 e, muito provavelmente, em 2016. Os perdedores são países emergentes da Europa, Oriente Médio e África, como Rússia, África do Sul, Turquia, Polônia, Hungria, e os latino-americanos. Além do petróleo, os mercados emergentes asiáticos são menos vulneráveis a uma alta de juros nos Estado Unidos. Por quê? Nós acompanhamos oito economias da Ásia. Sete delas têm superávit em transações correntes. E quanto menos um país depende de recursos externos, menos vulnerável é à política monetária americana.


Valor: O Brasil, então, está mais vulnerável ao aumento dos juros nos Estados Unidos?


Rüttimann: O Brasil tem um déficit grande em transações correntes. O Investimento Estrangeiro Direto ainda está 'ok', mas o país precisa atrair recursos externos. O país tem grandes reservas internacionais e é muito solvente, mas tem que começar a agir agora. Se os políticos não agirem, o quadro pode piorar. A recessão está se aprofundando e seria muito ruim para o Brasil, que precisa de recursos externos, perder seu grau de investimento. O bom é que o governo brasileiro parece consciente dos problemas que precisa enfrentar. O ajuste fiscal não é fácil. Não acredito em grandes passos, mas vamos ver melhoras graduais. O Brasil vai perder o grau de investimento? Não creio. Isso seria um suicídio político. O governo sabe que precisam ajustar a economia e vai fazer isso em 2015. Precisamos ver ainda quão forte vai ser esse ajuste.


Valor: O Brasil é hoje um país atraente para os investidores estrangeiros?


Rüttimann: Para o Brasil voltar a ser novamente atrativo é preciso que o Produto Interno Bruto (PIB) volte a crescer de acordo com seu potencial, que, segundo a Moody's, é de 3% ao ano. Eu lido com investidores de 'hard currencies', como dólar, euro e franco suíço. Para esses investidores, o risco de depreciação do real é um grande problema. Não vai ajudar muito se o mercado acionário subir 10% e o real depreciar 15%. Se o Brasil voltar a crescer, forma-se um ciclo positivo, a moeda brasileira se torna mais atraente e os fluxos voltam. Nos últimos quatro anos o Brasil cresceu abaixo do seu potencial. E neste ano e no próximo isso vai se repetir. Quer dizer, são seis anos de crescimento baixo. No momento, estamos em meio a um processo de mudança, o que o ministro da Fazenda [Joaquim Levy] e o presidente do Banco Central [Alexandre Tombini] tem dito é positivo, mas o espaço deles é limitado, já que o déficit fiscal e em transações correntes é grande. Isso torna tudo mais difícil. O que poderia estimular a economia seria uma contínua e ordenada depreciação do real, porque a taxa real efetiva de câmbio ainda não está desvalorizada. Ainda há mais espaço para depreciação do real. O que não pode haver é uma queda muito forte e rápida do real. Isso seria um choque para a economia.


Valor: Como a investigação dos casos de corrupção na Petrobras afeta a percepção dos investidores estrangeiros em relação ao Brasil?


Rüttimann: Estamos vendo muitas coisas ruins e é óbvio que pode piorar. A Petrobras é uma economia muito importante, cujos investimentos respondem por 10% do total dos investimentos no Brasil. Se a empresa reduz seus investimentos, o impacto para o país é muito negativo. Nós certamente veremos um resultado dessas investigações no fim deste ano. Por enquanto, as perdas da Petrobras ainda são uma questão em aberto. E o mercado está esperando respostas. Quanto mais cedo essa resposta vier, melhor. Então, será possível o mercado se concentrar novamente em outros aspectos para avaliar a companhia. Hoje, é extremamente difícil saber qual é o preço justo, já que há muitas incertezas.


Valor: Qual é a sua expectativa para o mercado acionário brasileiro neste ano?


Rüttimann: Para mim, o índice relevante é o MSCI Brazil, que é guiado por Petrobras, Vale e o setor financeiro. Estou "underweight" [abaixo da média do mercado] porque ainda há muitas questões em aberto. Para mudar para neutro, eu teria que observar alguns sinais positivos. Existem os problemas com a Petrobras e as questões políticas. Eu ainda estou esperando gatilhos positivos. Um deles seria a redução das taxas de juros. Mas ainda não vejo essa possibilidade, porque o panorama para a inflação ainda é ruim. É improvável que as taxas caiam. Eu espero que haja uma resolução da questão da Petrobras e que o governo apresente um programa de reformas, com os passos que vai tomar ao longo de 2015 para levar a economia de volta ao crescimento. Por enquanto, não há uma tendência positiva para o mercado acionário do Brasil. Deve ser um ano de altos e baixos.


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